PISA 2012 e as narrativas sobre a educação nacional
… mas é errado deitá-los fora como absolutamente imprestáveis e como se, quando lidos os resultados em termos de tendência e contextualizando-os com o tipo de políticas educativas numa perspectiva de médio-longo prazo, nada se pudesse extrair com sentido de toda a sua enorme massa de informação.
Os resultados de 2012, em termos globais, parecem bastante claros quanto ao “sucesso” de um certo modelo de reformas assentes numa liberalização pouco regulada do “mercado da Educação”. Os países apontados como sendo os mais progressistas nesse campo (Suécia, Austrália, Nova Zelândia, Reino Unido, entre outros onde é complicado inserir os EUA pela sua enorme diversidade) são dos que apresentam uma pior evolução na última década (cf. Tabela 1 A e gráfico I.2.15 sobre a mudança média anual). O que em vários casos está em linha com os TIMMS e PIRLS 2011. Não estamos a falar de quedas ocasionais ou pontuais, mas de tendências de uma década.
Já os países ou regiões em alta (a maioria do Extremo Oriente) têm características culturais muito próprias em termos de auto-disciplina e prossecução de objectivos de uma forma rigorosa e, repito-me, altamente disciplinada, não sendo o modelo de gestão da escola o determinante mas sim o da organização das aulas.
Estes testes, nos seus resultados globais, seriam bastante úteis para Portugal repensar alguns aspectos mais recentes das suas políticas educativas que alguma desaceleração nos ganhos aconselharia a quem não seguisse um programa em que se mistura a ideologia e os interesses.
No caso português verifica-se uma melhoria dos resultados desde 2003 em termos relativos (vamos recuperando em relação à média), mas uma certa estagnação ao nível dos resultados absolutos, havendo mesmo uma pequena quebra em Ciências.
Os alunos que fizeram estes testes entraram para o primeiro ano de escolaridade por volta de 2003 e apanharam em cheio, já no 2º e 3º ciclo, com muitas das reformas que se introduziram a galope no nosso sistema educativo, com escasso planeamento e fraca fundamentação empírica, desde 2007. Os que fizeram os testes de 2009 tinham entrado cerca de 2000 e só apanharam com um pouco dessas reformas, mesmo na ponta final da sua escolaridade básica de 9 anos (os PISA são feitos com alunos com 15 anos, no 8º ou 9º ano). Os que fizerem os de 2016 serão os filhos directos da combinação entre as reformas de Maria de Lurdes Rodrigues e de Nuno Crato.
Aí poderemos apurar as consequências do que do que tem sido feito em matéria de redução da rede escolar, gestão escolar, engenharia curricular e demais tropelias, desde que esses alunos entraram para o 1º ciclo.
Será que algum dia um governante assumirá essa paternidade ou limitar-se-ão a atirar as culpas para outros e chamar seu apenas o sucesso de curta duração, como uma certa ex-ministra gosta de fazer, reclamando apenas o que correu bem e renegando tudo o resto?
Existem ainda diversos detalhes que podem ir sendo seleccionados nos vários volumes do relatório final, alguns deles especialmente contrários a certas “narrativas” sobre as características do nosso sistema público de ensino, nomeadamente no que se relaciona com a qualidade do seu desempenho tendo em conta o contexto sócio-económico e a comparação entre os resultados das escolas públicas e privadas que, quando descontados os efeitos daquele contexto, não são consideradas estatisticamente significativas.
Para além de que é feita a demonstração (quadro IV.1.3) de que o desempenho dos alunos portugueses está em linha com o de muitos países onde a equidade sócio-económica é muito maior. Isto não esquecendo que Portugal surge entre os países com um nível acima dos 80% de competição entre escolas (quadro IV.1.18), o que contraria directamente o discurso sobre a falta de liberdade de escolha entre nós.
Diz-se muito que este MEC é adepto da examocracia, da medição, da comparação estatística dos resultados e desempenhos. Atendendo ao que nos dizem os PISA 2012 (como os PIRLS e TIMMS) eu gostaria que assim fosse, pois, nesse caso, muitas medidas erradas que já estão em implementação seriam travadas. Porque muito do que foi ganho desde meados dos anos 90 está em risco de se perder.
Mas não tenho especial esperança que aos nossos actuais governantes interesse mudar a narrativa que entranharam como sua.
Professor, autor do blogue A Educação do meu Umbigo
guinote@gmail.com