Os alunos indisciplinados não gostam de teorias

É obrigação de todos nós contribuir para o combate à indisciplina com medidas concretas, pois isso será prenúncio de maior sucesso para os nossos jovens.

Infelizmente, para alguns, a escola serve para tudo, até para imputar culpas que não são dela. Principalmente quando se trata de algo pretensamente negativo, referente à escola pública… está o circo montado!

Não tenho dúvidas de que o fenómeno da indisciplina em meio escolar é antigo; acontece não só na sala de aula mas nos restantes espaços e até no exterior (por exemplo, em visitas de estudo…). Esta ocorre no ensino não superior e superior, na escola pública e na escola privada, etc.. Acredito também que se em algumas instituições de ensino este fenómeno é menos expressivo, noutras é um problema bem presente e que urge combater.

Não querendo culpabilizar seja quem for, mas também não pretendendo desculpabilizar, julgo que todos devemos, nos respetivos patamares de responsabilidade, encontrar soluções que, em muitos casos, são mais coletivas e menos individuais.

Em primeiro lugar, as famílias devem envolver-se mais na Educação dos seus filhos, assistindo-se a um fraco comprometimento de quem é, em primeira instância, responsável pelo futuro das crianças. Os pais e encarregados de educação nem sempre assumem disponibilidade para o acompanhamento e, em algumas situações, são coniventes com atitudes dos mesmos, pondo em causa relatos que lhes chegam dos professores, quantas vezes promovendo até uma acareação entre as partes! “Estes filhos são bem melhores que os pais!”, “Os alunos não têm valores em casa…” e “Os pais não reconhecem que os filhos praticam atos de indisciplina” são frases escutadas um pouco por todo o lado e, embora não possamos generalizar (há muitos pais e encarregados de educação que não compactuam com atos de indisciplina dos seus filhos e fazem parte da solução e nunca do problema), teremos de estar vigilantes e criar soluções para resolver a questão. O próprio movimento associativo de pais queixa-se da não comparência destes às reuniões ou assembleias. Reconheço que a crise que atravessamos ou estamos a atravessar agudiza a situação, mas não pode ser o bode expiatório.

Alguns alunos não sabem estar numa escola. A falta de perspetivas de futuro contribui bastante para aquele espaço ser para “matar o tempo”, esquecendo-se de que prejudicam os outros quando, em contexto de sala de aula, estão permanentemente a desestabilizar. Dir-se-ia que gostam da escola, mas nem tanto da sala de aula. As relações interpessoais dos alunos são complexas e, em muitas situações, resolvem-se à pancada! A transição do 1.º para o 2.º ciclo (4.º para 5.º ano de escolaridade) é dramática, e é no 5.º ano de escolaridade (a exemplo de anos de início de ciclo) que se registam mais ocorrências disciplinares).

Também julgo que a sociedade pode ser potenciadora da indisciplina em meio escolar e até da violência que existe no dia-a-dia. Quando se escutam pessoas, de muita responsabilidade, que acham quase normal a atuação de adeptos de um clube a retirarem de um armazém da equipa da casa pertences que não são deles, é querer legitimar o indefensável, caindo em descrédito. Existindo muitos outros, este é um mero exemplo, recente, de imagens que todos visionaram; mas foram ainda mais chocantes as declarações provenientes de uma defesa improvável. A sociedade não pode defender atos de vandalismo ou crimes e as pessoas responsáveis devem referi-lo, sob pena de os nossos jovens estarem legitimados para o fazerem também. Que exemplo cívico dão os governantes e deputados eleitos, em algumas discussões muito acaloradas na Casa da Democracia?

As retenções escolares aliadas a uma deficiente preparação dos alunos são dois fatores potenciadores de indisciplina. Estou convicto de que a efetiva promoção do sucesso pode ser a chave principal no combate ao problema. Não entendo por que razão o 1.º Ciclo não tem ainda um ensino mais personalizado, com turmas pequenas (22 alunos no máximo). A coadjuvação e os apoios educativos em contexto de sala de aula neste nível de ensino pode ser outra solução.

Não fará sentido investir, por exemplo, parte dos 600.000.000 de euros que anualmente o Estado desperdiça com as 150.000 reprovações, em apoio efetivo ao 1.º Ciclo? Sabemos que é um ciclo essencial, pois é ali que se adquirem as bases do conhecimento, mas temos medo de dar um passo decisivo e muito importante para parte da solução. Porquê? Na verdade, alunos que vão aprovando com dificuldades nas aprendizagens são alunos que mais tarde ou mais cedo contribuirão para aumentar o insucesso que, como sabemos, é auto-estrada para a indisciplina.

Outros focos de indisciplina são os provenientes da constituição dos mega agrupamentos, da desvalorização da profissão docente, da extensão do currículo e elevado número de disciplinas, da carga letiva imensa, do uso de métodos de ensino e modelos de aprendizagem ultrapassados, da resistência ao uso das novas tecnologias nas salas de aula (é essencial a tutela apostar na formação contínua dos seus profissionais), das matérias desinteressantes, da falta de recursos (por exemplo. equipas multidisciplinares, assistentes operacionais de carreira), da fraca envolvência dos alunos na discussão e criação de documentos estruturantes da escola (Projeto Educativo, Regulamento Interno…), etc..

Mais do que teorias que vão entretendo quem, muitas vezes, só sabe dizer mal, é obrigação de todos nós contribuir para o combate à indisciplina com medidas concretas, pois isso será prenúncio de maior sucesso para os nossos jovens.

Filinto Lima

Professor/director

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