Médicos identificam mais casos de maus tratos a bebés e crianças

Os maus tratos podem não estar a aumentar; os profissionais de saúde é que sabem identificar melhor, diz responsável da Medicina Legal

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"Voltámos a ver maus tratos hediondos", denuncia Deolinda Barata, da Sociedade Portuguesa de Pediatria Rui Gaudêncio

 

Os serviços de saúde estão a notificar mais casos de maus tratos em crianças, sobretudo bebés, ao Instituto de Medicina Legal, revelando “um olhar mais atento e preocupado” dos médicos para estas situações, sublinha a dirigente.

“A nível das perícias [médico-legais], notamos que há uma maior procura [desses sinais] por parte dos serviços dos hospitais, que estão, cada vez mais, a detectar situações que outrora não detectavam”, diz a directora.

Teresa Magalhães explicou que isso não quer dizer que os casos não existissem; os profissionais é que não estavam “tão alertas” e tão orientados para o seu diagnóstico.
Agora, “os médicos, a nível dos hospitais e centros de saúde, estão mais alertados, mais atentos, mais preocupados, mais formados relativamente a esta problemática e estão mais capazes de identificar os casos e não os deixar passar como meros acidentes”, realçou, comentando que “é um bom sinal”.

O INML tem estado a monitorizar estas situações e “não há nenhum aumento significativo de violência. Estão é a detectar-se casos diferentes que não eram detectados e que nos deixavam muito preocupados porque sabíamos que existiam”, frisou.

Sobre os casos que chegam ao INML, Teresa Magalhães diz que são de crianças de todas as idades, mas sobretudo bebés, cujo diagnóstico é sempre mais difícil de fazer porque não falam.

“Os hospitais têm alertado para casos que até aqui não eram visíveis”, como crianças com fracturas ósseas e bebés vítimas da Síndroma do Bebé Sacudido, que provoca uma lesão cerebral grave resultante da força com que o bebé foi abanado e pode provocar danos graves ou permanentes e até a morte.

A responsável do INML sublinha que há “casos bastante graves”, alguns de bebés de meses, que “não apareciam e agora começam a aparecer, o que significa que há um olhar mais atento sobre estes casos”.

Teresa Magalhães adianta que a denúncia destas situações é obrigatória, porque se trata de casos que constituem crime público, e que requerem uma “intervenção que se quer cada vez mais articulada” entre as várias instituições.

Na semana passada, a médica Deolinda Barata, da Sociedade Portuguesa de Pediatria, alertou que os maus tratos físicos e a negligência a crianças estão a aumentar com as dificuldades das famílias, que não conseguem assegurar necessidades básicas como alimentação, vestuário e uma casa digna.

Deolinda Barata é presidente da secção de Pediatria Social daquela sociedade e coordena o núcleo de crianças e jovens em risco do Hospital D. Estefânia (Lisboa), onde tem assistido a situações que não surgiam na prática clínica “há 20 ou 30 anos”. “Estamos a andar para trás na história dos maus tratos. E voltámos a ver maus tratos hediondos”, disse, atribuindo esta situação, em parte, ao desespero das famílias que, quando excluídas, perdem as suas referências e vêem-se “privadas de dar um colo aconchegante” aos filhos.