Marido da ministra das Finanças arguido por ameaçar e insultar jornalista
António Albuquerque não gostou de artigo de opinião de antigo colega e enviou-lhe sms: "Tira a minha mulher da equação ou vou-te aos cornos"
O mais recente desenvolvimento do caso foi revelado esta quinta-feira pela revista Sábado, e confirmado pelo PÚBLICO. A António Albuquerque, que na altura dos acontecimentos já tinha saído do Económico, onde desempenhara funções de director executivo, não agradou um artigo de opinião escrito por um antigo colega da mesma publicação em Setembro passado, intitulado “O que acontece se o Novo Banco for vendido com prejuízo?", onde o seu autor expressava dúvidas sobre a forma escolhida pelo Governo e pelo Banco de Portugal para resgatar o Banco Espírito Santo.
"Tira a minha mulher da equação ou vou-te aos cornos", dizia um dos sms enviados pelo marido de Maria Luís Albuquerque ao antigo colega. "Tu não sabes quem eu sou. Metes a minha mulher ao barulho e podes ter a certeza que vais parar ao hospital", podia ler-se noutro.
Mas não ficou por aqui. "Vai para o caralho cabrão" e “Vai para o caralho seu merdas" são outras das injúrias que deram origem ao processo aberto pelo Departamento de Investigação e Acção Penal, depois de o jornalista Filipe Alves ter apresentado queixa. “Reafirmo, tu e o teu director são uns cabrões fdp", escreveu também António Albuquerque, que neste momento não presta declarações sobre o assunto. O mesmo sucede com a sua advogada, Carla Alves Ferreira.
O marido da ministra nunca negou a autoria das mensagens. Mas Filipe Alves só aceitava desistir da queixa se o ex-colega lhe pedisse desculpas publicamente, enquanto António Albuquerque apenas se disponibilizou para o fazer por sms. Como a representante legal do marido da ministra não pediu abertura de instrução do processo, o caso deverá agora seguir directamente para julgamento.
Entre as testemunhas do jornalista queixoso está outro profissional da comunicação social, Filipe Garcia, que irá contar como também foi agraciado com um email do marido da ministra depois de escrever que Maria Luís Albuquerque não mentira quando dissera, no Parlamento, não possuir poupanças. Parafraseando o antigo secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, António Albuquerque mandou-o "levar respeitosamente no cu".
"Lamento que a situação tenha chegado a este ponto, mas não tive alternativa" senão apresentar queixa, diz Filipe Alves, que pede em tribunal uma indemnização nunca inferior a três mil euros. "Até este incidente nunca tinha havido problemas pessoais entre nós os dois". No Facebook, o jornalista acrescenta não admitir ameaças nem outras tentativas que visem impedi-lo de fazer o seu trabalho. "Muito menos vindas de alguém que se diz jornalista e tinha obrigação de respeitar o direito à liberdade de expressão".
Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa da ministra das Finanças não fez, até agora, qualquer comentário sobre o assunto. Apesar de a moldura penal dos crimes em causa apontar para o julgamento ser feito por um colectivo de magistrados, o facto de o marido da ministra não ter antecedentes criminais e se encontrar socialmente integrado fez o Ministério Público requerer que a resolução do processo fique a cargo de um único juiz, uma vez que dificilmente será aplicada ao arguido, caso seja condenado, uma pena superior a cinco anos de prisão.
Um caso com alguns contornos idênticos a este, embora sem ameaças nem grosserias, envolveu, em Abril passado, o candidato a primeiro-ministro António Costa, a quem desagradou um artigo de opinião em que o director-adjunto do Expresso João Vieira Pereira falava da "ausência de pensamento político consistente" dos socialistas. O jornalista divulgou publicamente a mensagem de telemóvel que o ex-ministro da Justiça lhe enviou, onde o acusava de ter recorrido ao "insulto reles e cobarde" e de pertencer a uma profissão "degradada por desqualificados".
"Quem se julga para se arrogar a legitimidade de julgar o carácter de quem nem conhece?", escreveu António Costa. "Envio-lhe este sms para que não tenha a ilusão que lhe admito julgamentos de carácter, nem tenha dúvidas sobre o que penso a seu respeito".
Três antes, em 2012, o então ministro Miguel Relvas tinha ameaçado divulgar supostos factos da vida privada de uma jornalista do PÚBLICO que então investigava o chamado caso das "secretas". Perante um protesto formal da direcção do jornal, o governante acabou por pedir desculpa pelo seu comportamento.