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Juíza quer destruir escutas do Apito Dourado

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Há 81 casos que vão originar novos processos PUBLICO.PT

Em declarações ao PÚBLICO, um dos advogados de defesa afirmou: "Não prescindimos de avaliar as escutas que a juíza considerava que não tinham interesse, mas que para nós podem servir para demonstrar a inocência das pessoas e enquadrar os factos praticados". O causídico garantiu ainda que nos próximos dias irá recorrer do despacho para o Tribunal da Relação do Porto.

A decisão de Ana Cláudia Nogueira foi tomada depois de ter sido deduzida a acusação, mas antes dos advogados consultarem o processo. E confirma que as intercepções telefónicas do Apito Dourado poderão gerar um novo terramoto judicial e político. Tanto mais que Ana Cláudia Nogueira já tinha assumido num despacho, há quase dois anos, que não tinha ouvido as gravações, por falta de tempo, prorrogando mesmo assim as intercepções por períodos de 60 dias.

Além deste "pecado original", que pode levar à nulidade de várias escutas, as transcrições constantes nos autos indiciam que, tal como noutros casos mediáticos, foram escutadas importantes figuras do meio político e judicial, que não estavam sob qualquer suspeita. A vida íntima de terceiros poderá ter sido assim devassada, sem que houvesse qualquer relação com a investigação em causa. E também não foram expurgadas oportunamente, por quem tinha competência para o fazer: a juíza Ana Cláudia Nogueira.

94 jogos examinados e sem sombra de suspeita

O Ministério Público de Gondomar arquivou 127 situações, das quais 94 são relativas a jogos de futebol. No despacho final do inquérito Apito Dourado foram ainda extraídas 81 certidões que darão origem a novos inquéritos a instaurar nas comarcas onde os crimes terão sido cometidos. O balanço final foi ontem feito pela Procuradoria-Geral da República, num comunicado enviado para as redacções ao princípio da noite, no termo de uma reunião de trabalho entre José Souto Moura, procurador-geral da República, e Alípio Ribeiro, procurador-geral distrital do Porto.

O número de acusados é, como ontem noticiámos, de 29 arguidos, entre os quais Valentim Loureiro, presidente da Câmara de Gondomar e da Liga de Clubes; José Luís Oliveira, ex-vice-presidente da comissão distrital do PSD do Porto e actual vereador daquela autarquia; e Pinto de Sousa, ex-presidente do Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). Do rol constam ainda outros ex-vereadores, bem como dirigentes da FPF, da arbitragem e árbitros dos escalões nacionais inferiores.

A acusação centra-se assim nos factos praticados na área da comarca de Gondomar e a esmagadora maioria dos casos em que foram imputados crimes está relacionada com a ascensão, na época de 2003-2004, do Sport Clube de Gondomar à Liga de Honra. O número de acusados, 29, é, no entanto, manifestamente inferior às 199 pessoas colocadas sob suspeita e interrogadas na qualidade de arguidos até Abril de 2005. A excepção é Leonel Viana, ex-autarca de Gondomar e presidente do PSD local, que só foi constituído arguido na véspera da dedução da acusação.

Fica assim por explicar os motivos de, nos três meses anteriores à conclusão das investigações da Polícia Judiciária, o processo ter conhecido um empolamento de arguidos, ao ter multiplicado quase por cinco o número de suspeitos. Naquela altura, os investigadores da PJ deslocaram-se a Lisboa, Setúbal, Porto Santo, Funchal, Aveiro, Leiria, Braga e a outras cidades para interrogar alegados suspeitos, fossem eles conhecidos autarcas como a social-democrata Isabel Damasceno ou árbitros internacionais como Lucílio Baptista e Paulo Paraty.

Entretanto, agora que a consulta do processo poderá estar por horas ou por dias, a preocupação no Ministério Público adensa-se. Isto porque as expectativas criadas ao longo do inquérito, com a detenção de duas das mais proeminentes figuras do futebol (Pinto da Costa e Valentim Loureiro), foram muito altas, o que implicará que a acusação pública seja avaliada com muito mais pormenor do que noutros processos.

A parada está alta, também porque o Apito Dourado teve consequências políticas visíveis em Gondomar, com Valentim Loureiro a perder a qualidade de militante do PSD, depois de ter concorrido como independente numa lista contra o candidato apresentado pelo partido. E o seu braço-direito, José Luís Oliveira, demitiu-se do cargo que ocupava a nível da organização distrital do Porto do PSD.

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