Generais angolanos pedem 300 mil euros a jornalista e à editora de Diamantes de Sangue
O jornalista Rafael Marques foi notificado pelo Departamento de Investigação e Acção Penal.
Rafael Marques pode agora pedir a abertura de instrução do processo – o juiz avaliará se há matéria suficiente, isto é, se há indícios sérios de prática de crime que justifiquem o caso ir a julgamento. De qualquer decisão do juiz de instrução pode haver recurso.
O jornalista foi notificado pelo Departamento de Investigação e Acção Penal, informando-o de que o Ministério Público não acompanhava a acusação particular por crime de difamação feita por oito generais e pelas duas empresas angolanas por entender que a publicação do livro “se enquadra no legítimo exercício de informação e de expressão”.
A dedução da acusação particular é apenas contra Rafael Marques, mas o pedido de indemnização é também contra a editora: cada um dos generais angolanos, entre eles Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, ministro de Estado e chefe da casa militar da Presidência da República, e o general António dos Santos França “Ndalu”, e cada uma das empresas Sociedade Mineira do Cuango e Teleservice – Sociedade de Telecomunicações, Segurança e Serviços, pedem uma indemnização de 150 mil euros ao jornalista e à editora - ou seja, no total são 300 mil euros. Outros generais queixosos são Armando da Cruz Neto e João de Matos, que ocuparam o cargo de chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas.
Em causa está uma investigação feita durante anos por Rafael Marques, e publicada no livro Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola, sobre empresas de extracção mineira nas Lundas angolanas, onde vários generais são acusados de violação de direitos humanos. No livro publicado em 2011, Marques denuncia ainda "a promiscuidade entre poder político-militar e o negócio dos diamantes".
A 11 de Fevereiro foi noticiado que o Ministério Público tinha arquivado a queixa por não ter encontrado indícios de difamação em Diamantes de Sangue. O MP concluiu que “a publicação do livro se enquadra no legítimo exercício de um direito fundamental, a liberdade de informação e de expressão, constitucionalmente protegido, que no caso concreto se sobrepõe a outros direitos”.
A queixa-crime contra Rafael Marques foi apresentada no ano passado - em Novembro, Rafael Marques foi constituído arguido. Seguiu-se a notificação a Bárbara Bulhosa, em Dezembro, que em finais de Janeiro seria constituída também arguida.
Quando foi constituído arguido, Marques disse ao PÚBLICO: “Este caso em Portugal apareceu depois de uma queixa-crime que eu apresentei em Luanda, em Novembro de 2011, denunciando os generais por crimes contra a humanidade” – queixa esta que acabaria por ser arquivada pela justiça angolana. Por seu lado, depois da pronúncia do MP, Bárbara Bulhosa comentava: "Não teria publicado o livro se não me tivesse assegurado da veracidade daquilo que ele relata. Tive acesso a todos os documentos que Rafael Marques foi recolhendo ao longo dos anos para o escrever". E acrescentava: "Um editor não pode ter medo".
Também em Janeiro, o advogado João Medeiros, do escritório PLMJ, de José Miguel Júdice, que representa os generais angolanos e as duas empresas de segurança, confirmou apenas ao PÚBLICO que a queixa-crime tinha sido interposta em Março de 2012, e que, entre os queixosos, estava o general Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, ministro de Estado e chefe da casa militar da Presidência da República.
Nessa altura, o livro tinha vendido cerca de sete mil exemplares em Portugal, e estava a ser preparada uma 5.ª edição.