Em seis meses foram assassinadas 24 mulheres e a grande maioria por violência doméstica

Relatório revela que 84% das mulheres foram mortas em contexto de violência doméstica. UMAR defende que, além de criminalizar os responsáveis e proteger as vítimas, Portugal tem de investir na “educação para a cidadania e igualdade de género”.

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Em 2011 houve menos 87 processos de violência doméstica do que no ano anterior PÚBLICO/Arquivo

A síntese dos dados sobre estes crimes e tentativas ocorridos em Portugal resulta da análise das notícias que saíram na imprensa, entre 1 de Janeiro e 30 de Junho deste ano. O último relatório divulgado pelo Observatório de Mulheres Assassinadas registou 37 mulheres mortas durante o ano de 2013 - nos primeiros seis meses, foram 20. Embora reconhecendo que "parece haver uma constância", o que preocupa Elisabete Brasil, esta responsável ressalva que os dados de 2014 ainda são "preliminares" e que "não se pode dizer que [o número de mortes] aumentou ou não em relação ao ano anterior”.

De acordo com o relatório, o que estes números confirmam é que estes crimes são “o culminar de uma escalada de violência praticada por aqueles com quem as vítimas mantêm relações de intimidade” e que “a permanência em relações violentas aumenta o risco de violência letal”.

A maioria das mulheres mortas (79%) mantinha ou tinha tido uma relação de intimidade com os homicidas – seis eram mulheres dos responsáveis pelo crime; três eram companheiras; seis ex-companheiras; duas eram ex-mulheres; uma era namorada; e uma ex-namorada. Quanto às 27 tentativas, a maioria (81%) também teve como autores aqueles com quem as vítimas mantinham ou tinham tido uma relação de intimidade.

Para Elisabete Brasil, para inverter este cenário, que se repete “ano após ano”, Portugal tem de investir na prevenção primária, isto é, nas causas do fenómeno. “É preciso investir na protecção, na criminalização, mas não só. É preciso ir à génese, às causas e investir na acção primária. Ir às causas estruturais. Estas relações são estruturadas numa desigualdade de género. Há uma naturalidade da violência numa relação de intimidade a que tem de se pôr cobro”, diz a responsável, defendendo que esta prevenção, que passa pela “educação e mudança de mentalidades”, tem falhado em Portugal.

Isto significa “intervir em termos de educação e cultura” para consciencializar “os jovens e menos jovens para estas questões, para os valores da igualdade de género”. “É um trabalho da justiça, da polícia, da legislação mas também de educação para a cidadania, e igualdade de género”, resume. Para a coordenadora, é necessário perceber que estes números “não são mera contabilidade, são para interpretar e transformar a realidade”. São histórias que resultam de relações que “já eram violentas há muito tempo”. É isto que, para Elisabete Brasil, não se pode aceitar.

Armas de fogo
Apesar de o relatório dizer que 59% das mortes aconteceram num contexto de violência doméstica, na realidade esta percentagem chega aos 84%. A diferença explica-se pela forma como foram recolhidos os dados: se nas notícias se escrevia que a morte tinha resultado de violência doméstica, esse caso foi introduzido no relatório como tal; se nas notícias se escrevia que a morte tinha sido por motivos passionais, registou-se dessa forma. Ora, somando as mortes introduzidas no relatório por violência doméstica, por ciúmes, por não aceitar a separação, e por motivos passionais, o número é de 84%. Elisabete Brasil também considera que todos os supostos motivos apontados são violência doméstica.

Da análise das notícias, também resulta que, mesmo nos casos em que os artigos não se referiam directamente a violência doméstica, a história contada, em 62% das situações, já referia a existência de um historial de violência na relação.

De acordo com a UMAR, a casa surge “como o local mais perigoso”, onde a maioria dos crimes foi praticado - 19 dos 24. As armas de fogo foram os meios mais utilizados, em 42% dos casos. Seguem-se as armas brancas (25%), o espancamento (12,5%), a asfixia (12,5%) e o estrangulamento (8%).

O grupo etário que registou mais mortes foi o das mulheres com idades superiores a 65 anos (sete casos) a que corresponde 29% do total das situações. Seguem-se os escalões dos 36 aos 50 anos e 51 aos 64 anos, cada um com 25% (seis casos). Entre os 24 e 35 anos, foram assassinadas quatro mulheres (17%).

Verificou-se uma média de quatro mortes por mês, sendo que oito dos 24 crimes aconteceram nos distritos de Lisboa e Setúbal, com quatro mulheres assassinadas em cada um. Logo de seguida, e com três casos cada, surgem os distritos de Santarém e Viseu.

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