Director do JN ouvido numa audiência na PGR sobre contactos com Sócrates
Afonso Camões recusou dizer na PGR como soube que Sócrates estava a ser investigado. Em editorial publicado esta segunda-feira, o director do JN, apanhado nas escutas a avisar Sócrates, assume que soube através de um jornalista.
O encontro, a 15 de Janeiro, ocorreu na Procuradoria-Geral da República (PGR) que o confirmou esta segunda-feira em comunicado. “Afonso Camões solicitou a audiência a 8 de Janeiro e fundamentou o pedido no conhecimento de determinados factos relativos à denominada Operação Marquês, os quais gostaria que a procuradora-geral avaliasse”, disse a PGR.
Em Maio do ano passado, Afonso Camões terá contactado por telefone Sócrates dando lhe conta de ter sabido que este estava a ser investigado. O contacto terá sido apanhado em escutas telefónicas ao ex-primeiro-ministro, adiantou fonte judicial ao PÚBLICO. Sócrates foi detido em Novembro.
Em Maio, Camões era presidente do Conselho de Administração da Agência Lusa e não tinha carteira profissional de jornalista, confirmou ao PÚBLICO o próprio. A notícia de que iria deixar a Lusa e passar a ser director do JN foi conhecida apenas em Setembro.
Camões quis reunir-se com Marques Vidal por receio de que seriam publicadas notícias “relativas às suas ligações pessoais com José Sócrates, tendo por base escutas realizadas no âmbito da Operação Marquês”.
E assim foi. Durante o fim-de-semana, o Correio da Manhã noticiou que Camões alertou Sócrates sobre a investigação e que este terá conversado com o actual presidente do Conselho de Administração da Controlinveste, o advogado Daniel Proença de Carvalho, sobre a venda do DN e do JN, mostrando-se disponível até para ajudar a arranjar financiamento.
Fonte judicial confirmou que esses contactos constam das escutas telefónicas. O PÚBLICO tentou, sem sucesso, contactar o advogado Daniel Proença de Carvalho, que representa Sócrates em vários processos contra a comunicação social.
Numa entrevista à SIC na noite desta segunda-feira João Araújo advogado de José Sócrates, afirmou supor que Afonso Camões tenha avisado José Sócrates de que estaria ser investigado.
Questionado sobre se falou sobre o assunto com o ex-primeiro-ministro, Araújo disse que sim mas recusou revelar o teor da conversa por “razões profissionais”.
Num editorial publicado esta segunda-feira no JN, Camões critica a publicação dessas notícias e o Estado por deixar que “se violem sistematicamente o segredo da Justiça e o direito de reserva da vida privada”. Diz ainda que esses artigos pretendem atingir o seu nome e o JN.
Porém, Camões recusou dizer na PGR o que disse depois no editorial. “É verdade: disse-me um jornalista do grupo empresarial da Coisa [uma alusão ao grupo onde se insere o Correio da Manhã] que a prisão de Sócrates estava iminente. Esse mensageiro cometeu um erro: quando se tem uma informação relevante, o primeiro dever de cidadão de um jornalista livre, pesados os seus direitos e responsabilidades, é para com os seus leitores”, escreve Camões no artigo.
Em comunicado, a PGR faz questão de informar que na audiência, onde estava também o director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Amadeu Guerra, o director do JN “optou por nada dizer” sobre a forma como soube que Sócrates estava a ser investigado.
A PGR não esclareceu se abriu inquérito a essa fuga de informação num processo que está em segredo de justiça. Reafirmou apenas que “neste, como em todos os outros casos, não deixa de exercer todas as competências que lhe são atribuídas”.
No editorial, Camões diz que falou com Joana Marques Vidal sobre a “necessidade” de, como “guardiã dos direitos dos cidadãos, actuar para impedir esta violência e a continuação destes crimes”, referindo-se à publicação de notícias sobre as escutas em que foi apanhado a conversar com Sócrates.
Mas a PGR tem outra versão. Diz que Camões pretendeu ser aconselhado e que a PGR “não lhe pode dar conselhos nem pessoais nem jurídicos” e sugeriu que procurasse um advogado. A PGR garante ainda “desconhecer totalmente se o nome do director do JN constava das escutas telefónicas”.