400 polícias aguentaram protesto de colegas e oposição exige soluções
Oposição critica o Governo considerando que deve dar melhores condições aos polícias. Cavaco Silva lembra que “nunca se pode ignorar as vozes que se fazem ouvir na rua, quaisquer que elas sejam”.
Nas duas horas de tensão vividas em frente à Assembleia da República (AR) enfrentaram-se dois grupos: de um lado 400 homens de serviço, do outro quase 20 mil colegas polícias manifestantes. “Registaram-se dez feridos e duas pessoas foram identificadas”, disse o subintendente Paulo Flor, da Direcção Nacional da PSP. Seis feridos eram polícias de serviço e quatro eram manifestantes. Dois dos polícias tiveram de receber tratamento no hospital.
Segundo fonte do CI, entre os empurrões verificaram-se agressões, algumas delas com armas brancas. Dois agentes foram ao hospital com cortes nos braços. E há relatos de que alguns manifestantes usaram gás pimenta na direcção dos polícias de serviço.
Os dois manifestantes identificados são guardas prisionais e passaram o cordão policial, tendo subido alguns degraus da escadaria da AR. Nenhum foi detido e deverão agora ser arguidos num inquérito ao caso. Um deles, noticiou o Diário de Notícias, está com pulseira electrónica por violência doméstica.
A liderança do dispositivo no local chegou a dar ordem para que fossem usados os cães de manutenção da ordem pública no momento de maior tensão. Quando os manifestantes derrubaram as barreiras e forçaram de sobremaneira o cordão policial, foi dada ordem às equipas de binómios cinotécnicos — 20 agentes tratadores e 20 cães — para saírem de imediato das viaturas e estarem a postos para avançar sobre os manifestantes, esclareceu fonte do CI.
Segundo a mesma fonte, a sua acção serviria para “limpar” a praça em frente à AR impedindo o avanço sobre a escadaria. Mas neste jogo de empurra entre polícias manifestantes e polícias de serviço, a ordem poderia ter sido trágica. É que os cães atacariam violentamente, tal como estão treinados, qualquer manifestante que empurrasse o tratador. A ordem foi abortada em segundos.
Também não chegou a ser lançado o gás lacrimogéneo para o qual havia ordem de uso em último recurso. Aliás, tal como o PÚBLICO havia noticiado, a PSP comprou há uma semana novos lotes daquele gás para substituir inúmeros lotes que estavam fora do prazo há cerca de três anos.
O secretário-nacional da Comissão Coordenadora Permanente, Paulo Rodrigues, que representa os principais sindicatos do sector, foi recebido pela presidente da AR, Assunção Esteves, e adiantou que esta se mostrou muito receptiva a discutir os problemas dos polícias. Rodrigues não deixou, porém, de sublinhar que a manifestação foi “uma bofetada de luva branca” para os que achavam que iria terminar em confrontos.
Passos não comenta
O protesto não mereceu qualquer reacção do primeiro-ministro. Nesta sexta-feira, Passos Coelho recusou comentar a situação após o congresso do PPE em Dublin. “Agora não”, disse aos jornalistas. Também o Ministério da Administração Interna, que tutela as polícias, rejeitou fazer qualquer comentário ao PÚBLICO.
A única voz do Governo a comentar o protesto foi o ministro da Defesa, Aguiar-Branco, considerando que “nem os próprios gostariam de ter uma situação que fosse considerada de privilégio quando há uma necessidade [de todos os portugueses] de fazer sacrifícios”.
Outra opinião tem a oposição. “Desta vez, o Governo não tem nenhuma desculpa para não encontrar soluções para os problemas que afectam os agentes que integram as forças de segurança”, disse o secretário-nacional do PS, António Galamba. O socialista lembrou que muitos agentes estão “numa situação pessoal insustentável”.
Também o PCP, através do deputado António Filipe, defendeu que o Governo “não pode permanecer indiferente” perante a manifestação e as justas reivindicações” dos polícias. E o BE apontou igualmente críticas ao Governo. A deputada Cecília Honório considerou ontem que o MAI deve criar condições necessárias para que as forças de segurança cumpram a sua missão.
Já o PSD, através do deputado Fernando Negrão, assumiu que a manifestação teve “obviamente” eco no Governo e que é importante “acentuar o diálogo com os sindicatos de policia. Telmo Correia, do CDS-PP, condenou as tentativas de subir a escadaria do Parlamento considerando-as inaceitáveis, apesar de reconhecer a relevância do protesto.
Já o Presidente da República disse que “nunca se pode ignorar as vozes que se fazem ouvir na rua, quaisquer que elas sejam desde que se apresentem como razoáveis”. E acrescentou que, de acordo com as informações de que dispõe, “houve bom senso e a contenção acabou por prevalecer” durante a manifestação das forças de segurança, pelas quais afirmou que tem “grande consideração”.
“Tenho imensa consideração pelas nossas forças policiais e das Forças Armadas. As forças policiais têm uma responsabilidade muito grande porque elas têm de ser o exemplo no cumprimento das leis da República”, sublinhou Cavaco Silva.