Continuar a estudar compensa
Por isso, não podemos deixar de olhar com grande preocupação para a notícia do PÚBLICO de 9 de junho: “há menos 3100 alunos a manifestar vontade de prosseguir estudos”.
1. O número de alunos candidatos ao ensino superior tem vindo a diminuir nos últimos três anos. É um sinal dos tempos com que não nos podemos conformar. As razões dessa diminuição estão em parte relacionadas com a crise e as dificuldades económicas das famílias, sem compensação numa eficaz política de ação social. Mas há razões também que radicam numa certa desvalorização da educação. Afirmações do senso comum como “nem todos podem ser doutores”, “temos em Portugal doutores a mais”, “estudar para o desemprego”, “o melhor é emigrar”, “estudar não compensa”, “vale mais é ir trabalhar” embora factualmente erradas induzem nos jovens a ideia de que existem alternativas melhores do que estudar.
Olhando apenas para o dia de amanhã, até pode parecer que a melhor opção para muitos jovens passa por trocar a escola por uma ocupação que lhes dê dinheiro de bolso. Porém, a prazo, um jovem sem o ensino secundário terá uma muito mais elevada probabilidade de vir a enfrentar situações difíceis de desemprego ou de emprego desqualificado e mal remunerado. Sobretudo, sabemos hoje que um jovem sem o 12.º ano não está preparado para enfrentar o futuro e as exigências de uma economia baseada em conhecimento.
2. Os compromissos com a troika e as políticas orçamentais têm concentrado as atenções dos governantes, fazendo-nos esquecer que Portugal tem outras obrigações que não podem ser descuradas. Não temos compromissos apenas com a União Europeia, mas também com as futuras gerações, que serão deixadas para trás se não atribuirmos prioridade política às matérias de educação e formação. As políticas de educação, de ensino superior e de ciência deviam ter a mesma prioridade que tem tido a política orçamental, porque elas são a base de qualquer programa de crescimento económico e de desenvolvimento do país.
No âmbito da estratégia europeia Europe 2020 Strategy for Growth and Employment in Europe, assumimos o compromisso de conseguir que 40% dos jovens adultos entre os 30 e os 34 anos completem o ensino superior. O progresso conseguido neste domínio durante a última década foi muito importante: passamos de 17%, em 2005, para 29%, em 2013. Chegar aos 40% em 2020 exige que se prossigam políticas públicas de valorização e de apoio ao prosseguimento de estudos pelos jovens que terminam o secundário.
Assumimos ainda o compromisso de conseguir que a percentagem de jovens que abandonam a escola, depois dos 18 anos, sem completar o ensino secundário, se reduza dos atuais 19% para 10%. Também neste indicador fizemos progressos notáveis nos últimos dez anos: passámos de 39%, em 2005, para 19%, em 2013. Garantir que, em 2020, 90% dos nossos jovens saem da escola com, pelo menos, o ensino secundário exige um esforço enorme por parte dos alunos, das escolas, dos professores e das famílias, mas também das políticas públicas.
3. A diminuição do número de jovens que prosseguem estudos no ensino superior é o contrário do que devia estar a acontecer e coloca-nos mais longe dos nossos compromissos europeus em matéria de educação. Por isso, não sei se me espantou mais a notícia ou a ausência de resposta à notícia, o silêncio do Governo sobre o problema, silêncio surpreendentemente partilhado pelo líder da oposição.
Não podemos aceitar como “natural” a diminuição do número de jovens que entram no ensino superior. Este é um problema político que exige intervenção pública.