Produção de medicamentos depende da biodiversidade
Se se mantiver o actual ritmo de extinção das espécies, a Humanidade perde um medicamento importante em cada dois anos. Isto sabendo-se que apenas se conhecem as potencialidades farmacêuticas de 1 por cento das 250 mil plantas tropicais existentes na Terra, alerta o Centro de Monitorização da Conservação do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), que lançou, na quinta-feira passada, o primeiro atlas mundial da biodiversidade.Uma das grandes conclusões deste documento é a dependência da humanidade em relação à existência e preservação de ecossistemas saudáveis. Só nos Estados Unidos, por exemplo, 56 por cento dos 150 mais importantes medicamentos, com um valor económico de cerca de 80 mil milhões de euros, são fruto de descobertas feitas na natureza e não no laboratório. Além disso, oitenta por cento dos habitantes do países em vias de desenvolvimento dependem de drogas que retiram das plantas e dos animais.Este atlas é o primeiro levantamento cartográfico da biodiversidade mundial. Fornece uma vastidão de factos e números sobre a importância, entre outros ecossistemas, das florestas, zonas húmidas e ambientes costeiros e marinhos. Reúne informação fornecida, não só pelos investigadores das Nações Unidas, como por vários cientistas de todo o mundo.O levantamento inclui o impacto que a humanidade no mundo natural. Durante os últimos 150 anos, os seres humanos alteraram 47 por cento do solo do planeta, sobrando apenas as zonas inacessíveis das montanhas ou inóspitas, como os desertos. No pior cenário, a biodiversidade de 72 por cento da superfície terrestre estará ameaçada em 2032.O atlas adianta que as perdas de biodiversidade serão mais graves no sudeste asiático, na bacia do Congo e na Amazónia. Qualquer coisa como 48 por cento destas áreas serão transformadas em terras agrícolas e urbanas, contra os actuais 22 por cento."A humanidade desvia actualmente cerca de 40 por cento da produtividade da Terra para benefício próprio, uma utilização feita muitas vezes de forma destrutiva e não sustentada", afirmou o director do PNUA, Klaus Toepfer, que defendeu que a utilização dos recursos naturais da Terra deverá ser um tema central durante a Cimeira para o Desenvolvimento Sustentável, que se inicia a 26 de Agosto na África do Sul.O valor dos recursos naturais para a indústria farmacêutica é suficiente para justificar uma mudança na forma como se exploram estes recursos, defendeu Toepfer. E sobretudo tem de se compensar adequadamente os países que detêm as maiores reservas da biodiversidade planetária - que são sobretudo países em vias de desenvolvimento - pela partilha destes valiosos recursos genéticos. Esta compensação poderia resolver parte dos problemas de pobreza no mundo.Segundo dados recentes das organizações não-governamentais, a biopirataria, isto é, a pilhagem de recursos genéticos de áreas naturais dos países em vias de desenvolvimento, assume, em termos de volume de negócios, uma importância semelhante à do tráfico de drogas e de armas. Só este exemplo dá uma ideia da importância económica que a biodiversidade tem para as empresas farmacêuticas."Existem poucas zonas verdadeiramente selvagens para aguentarem a expansão da população humana", diz Brian Groombridge, um dos autores do atlas. "Na última década, o abastecimento de alimentos aumentou em função do crescimento demográfico através de um aumento da produtividade e da exploração de áreas naturais mas, com a redução destas áreas, de onde virá a capacidade para alimentar uma população sempre crescente?", questiona o autor."A globalização e o ritmo do desenvolvimento tecnológico ultrapassam a nossa capacidade de perceber quais os impactos que estamos a ter sobre os ecossistemas - pondo alguns dos serviços básicos que a natureza presta à humanidade em causa, sobretudo entre os mais pobres", acrescentou Groombridge. "Mas, ao mesmo tempo, temos já demasiadas provas científicas que deveremos usar o princípio da precaução de forma a não interferir com os processos globais que mantêm as nossas pescas, florestas, agriculturas, saúde e clima."A biodiversidade, assim como a água, a energia, a saúde e a agricultura são os temas centrais da cimeira de Joanesburgo.