Uma viagem oficial
É muito compreensível que a China apeteça a quem gosta de viajar: há a “cidade proibida” para ver e uma espetada de baratas para comer. Melhor ainda, numa “visita oficial” não se espera no aeroporto e um exército de senhores mesureiros abre as portas em toda a parte e sabe onde são os melhores restaurantes. O dr. Cavaco andou sempre muito bem-disposto, com os privilégios que o seu cargo lhe oferece. Mas, para consumo interno, inventou uma teoria para vender ao Presidente lá da terra e, suponho, para impressionar o indígena de cá. Nem os jornais, nem a televisão disseram que espécie de efeito tinha tido este esforço intelectual.
A teoria é de facto impressionante e com certeza ficará na história com o nome de “o ponto e o triângulo”. Convém explicar. Segundo o dr. Cavaco, a China deve fazer de Portugal o seu “ponto de entrada” na Europa e poderemos por isso esperar daqui a pouco tempo dezenas de milhões de chineses a desembarcar por essa costa com biliões de coisas para vender à Finlândia ou à Dinamarca, a pretexto de que Sines fica mais perto dos mercados do que, por exemplo, Dover ou Southampton. E Cavaco não pára nesse pequenino “ponto”, quer também que Portugal sirva de intermediário entre Pequim e os PALOPS, que andam ansiosos por arranjar quem tome conta deles, para os defender da roubalheira geral do Ocidente. Esta parte “triângulo” da teoria mostra bem a profundidade de espírito do nosso inspirado Presidente.
Só que o sr. Xi, apresentado ao ilustre representante dos nossos navegadores, e pretendendo ser amável, puxou pela cabeça e, depois de muito puxar, saiu com um único nome: Ronaldo. Não se julgue que um homem tão sério como ele planeava trocar Ronaldo pela importação imediata de 300.000 pastéis de Belém, com o intuito perverso de pôr Ronaldo a ensinar futebol a um bilião de chineses e transformar a China em campeã do Mundo e da Europa. De maneira nenhuma. Na bruma, que certamente é o resto da terra para um mandarim, o sr. Xi não se lembrou de mais nada sobre Portugal. Na sua sereníssima cabeça, Portugal é Ronaldo e foi mesmo uma trabalheira para o convencer que o próprio Cavaco, apesar da sua idade avançada, não era Ronaldo. De qualquer maneira, esta viagem serviu para afastar as nuvens que existiam entre os dois grandes países, para nos revelar o fundo do pensamento do nosso querido presidente e para ele descansar durante a campanha eleitoral.