PS acusa Rui Machete de declarações irresponsáveis sobre Estado Islâmico

Ministro dos Negócios Estrangeiros revelou que há portugueses que querem desertar das forças jihadistas. Ana Gomes critica falta de estratégia.

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Machete termina esta terça-feira a visita oficial a Angola Miguel Manso

O ministro, em declarações à Rádio Renascença, afirmou que alguns desses portugueses querem regressar ao país, admitindo que isso será um problema.

“Considero essas declarações irresponsáveis”, afirmou ao PÚBLICO o deputado socialista Marcos Perestrello, optando por não fazer declarações face à gravidade da situação. O deputado socialista confirmou ao PÚBLICO ter requerido uma audição, no Parlamento,  ao ministro dos Negócios Estrangeiros com carácter de urgência e à porta fechada. A justificação oficial apresentada foi a “participação de Portugal no esforço internacional de combate ao Estado Islâmico”. No entanto, o mesmo deputado, um dia antes havia classificado como “irresponsáveis” as declarações de Rui Machete sobre o possível regresso de duas jihadistas a Portugal. A audição, a realizar-se deverá centrar-se, provavelmente, sobre esse tema.

“No caso português já há dois ou três, sobretudo raparigas, que se deixaram encantar pelo entusiasmo dos noivos ou por um espírito de aventura, que agora estão a querer voltar. [No total] Há 12 ou 15 [portugueses no Estado Islâmico], não sabemos exactamente bem, mas é um número muito reduzido”, disse Rui Machete, numa entrevista à Rádio Renascença, em Nova Iorque.

Questionado sobre se essas jovens precisam de autorização para reentrar em Portugal, o ministro respondeu: “Tal como não tiveram autorização para sair, também não pedem autorização para voltar.”

E admitiu que isso é um “problema”: “Esse é um dos problemas que temos e é um problema que não podemos ignorar, porque não podemos deixar que as pessoas voltem sem fiscalização. Neste momento, em Portugal, esse problema não se põe com nenhuma acuidade, porque o número é ainda muito restrito."

Em relação à participação no combate ao Estado Islâmico, Rui Machete reafirmou a solidariedade portuguesa, nomeadamente ao nível político e humanitário. “Do ponto de vista militar, nós temos mantido a posição de que não estamos em condições de dar um apoio militar numa área tão longínqua.”

Ana Gomes defende apoio ao regresso
Já a eurodeputada socialista Ana Gomes não critica Rui Machete por falar no problema. Critica, isso sim, por “revelar que não ter uma estratégia para ajudar essas pessoas a voltar”.

A antiga diplomata, que na quarta-feira fez uma intervenção no Parlamento Europeu sobre o assunto, defende que os cidadãos europeus ou outros que aderiram ao Estado Islâmico “têm de ser tratados como terroristas, que se juntaram a um bando de terroristas”, e que, se regressarem aos seus países, têm de ser julgados por eventuais crimes que tenham cometido.

Acrescenta porém que, se desejam voltar, “têm de ser ajudados, o que não impede que sejam julgados”. Até porque “podem ser uma ajuda a combater o problema”, quer ao nível de informações que possuem e que podem ser úteis aos serviços secretos quer ao nível da desconstrução do discurso de recrutamento dos jihadistas.

“Nesta matéria não se pode colocar a cabeça na areia como muitas vezes acontece. Tem de se delinear uma estratégia a nível europeu”, afirma.

E essa estratégia passa, em primeiro lugar, “por atacar as condições que levam as pessoas a aderir ao Estado Islâmico e que passam “pelo desemprego, o desencantamento e a falta de condições dos jovens” nos seus países.

O porta-voz do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), Filipe Pathé Duarte, em declarações à Lusa, desvalorizou as palavras de Machete, sublinhando que “os serviços de segurança tem esses jihadistas monitorizados e que o risco vai-se eliminando progressivamente”.

“As declarações de Rui Machete não põem em risco a segurança nacional”, acrescentou.

O desencantamento com a vida nas sociedades ocidentais e o desemprego foram factores de recrutamento acentuados na entrevista de terça-feira pelo chefe da diplomacia portuguesa. Rui Machete referiu, também, a prática de “altos salários pagos” aos jovens que integram o autoproclamado Estado Islâmico (EI) e a “obliteração da hierarquia de valores” que os leva a tal adesão.

Nas suas declarações, Machete pretendeu ter objectivos pedagógicos em relação a jovens que se colocaram numa situação particularmente difícil. Aliás, a vontade de regresso à origem e de abandonar as filas surge num momento particularmente duro para a organização terrorista, sujeita a mais bombardeamentos nas zonas que ocupa no Iraque e na Síria.

O Governo, através do ministro da Presidência, remeteu nesta quinta-feira para o ministro dos Negócios Estrangeiros, esclarecimentos sobre as suas declarações relativas ao Estado Islâmico.

No final da reunião semanal do Governo, Luís Marques Guedes, afirmou, citado pela Lusa, que, de acordo com as informações de que dispõe, "o senhor ministro dos Negócios Estrangeiros não se referiu a nenhuma matéria classificada", mas sugeriu aos jornalistas que "falem com o próprio".

Luís Marques Guedes alegou não ter ouvido a entrevista de Rui Machete à Renascença nem ter lido a notícia em causa, e considerou não ser "a pessoa mais indicada" para dar "mais pormenores, mais detalhes sobre o assunto".

O PNR reagiu, entretanto, às notícias classificando o possível regresso como “uma ameaça à segurança nacional”. De acordo com aquele partido o “único lugar” a que os jihadistas têm direito, em Portugal, “é em centros de detenção”.

O Partido Nacional Renovador é um partido nacionalista, considerado por muitos como de exterma-direita. Sobre este assunto, o PNR alertou para o facto de recentemente um dos jihadistas com nacionalidade portuguesa ter afirmado numa entrevista pretender “regressar para continuar aqui o seu combate pelo Estado Islâmico”.

 

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