PSD e CDS “não devem aprovar” nada do PS
A posição é assumida por Diogo Feio, vice-presidente centrista, na sequência do que afirmaram Passos Coelho e Paulo Portas no debate sobre o programa do seu governo sobre a "oposição férrea" que prometeram a um governo de esquerda.
Nem uma vontade política o PSD e o CDS deveriam satisfazer ao PS. É assim que as duas bancadas deveriam actuar na Assembleia da República perante a aliança de esquerda, defende Diogo Feio, vice-presidente do CDS. A coligação ainda está a acordar da demissão do Governo, mas já está na estrada com o seu programa.
Com os olhos postos em Belém e sobre o que vai fazer o Presidente da República, a coligação parece, para já, manter o passo acertado na frente parlamentar. Depois de Passos Coelho e Paulo Portas terem afirmado que não servirão o PS, caso venha a suportar o próximo Governo, Diogo Feio é mais claro e defende mesmo que “todas as medidas politicamente essenciais” para os socialistas devem ter “oposição firme por parte das forças políticas de centro-direita”.
“Não devemos caucionar nada”, reiterou ao PÚBLICO, no dia em que publicou essa posição num artigo de opinião no Diário de Notícias. O dirigente centrista recupera a “intransigência” declarada pelo então líder da AD Sá Carneiro contra o “radicalismo” da esquerda.
Um dia depois da queda do Governo no Parlamento provocada pela aliança de PS, BE, PCP e PEV, a coligação ainda está a digerir a demissão de um Executivo que considera legítimo. Caso um novo Governo venha a ser formado, o acordo PSD/CDS para o actual executivo desfaz-se. Mas sobra a frente parlamentar e até a concertação partidária. Essa estratégia dependerá da percepção que a coligação tem sobre a duração de um governo PS. Seis meses, um ano ou mais? Essa é a pergunta que anda na cabeça da coligação e cuja resposta pode ditar uma maior ou menor autonomia de cada um dos partidos.
Essa decisão também terá em conta a capacidade de sobrevivência das lideranças na futura oposição, sobretudo a do PSD. Na coligação, o argumento oficial é o de que Passos Coelho consegue aguentar, por ser um líder que ganhou eleições. No CDS acresce que Paulo Portas quase não tem oposição interna. Para já e até que haja um novo Governo, os dois partidos querem mostrar que no Executivo “morrem” juntos.
Sinal da aliança pós-eleitoral são as jornadas conjuntas que acontecem esta quarta e quinta-feira, com dezenas de dirigentes dos dois partidos em sessões por todo o país. É uma espécie de pré-campanha eleitoral em que dirigentes do PSD e do CDS explicam o seu programa, ainda que já chumbado no Parlamento. A coligação quer, distrito a distrito, fazer eco das suas propostas e definir com clareza a fronteira com as do PS e as das restantes bancadas à esquerda. Diogo Feio vê como natural que, no futuro, este tipo de iniciativas possam voltar a acontecer. “Não me espantaria que se repetisse”, afirmou.
Esta quinta-feira, as jornadas são encerradas por Passos Coelho, em Lisboa. O líder do PSD marcou ainda uma comissão política nacional para a próxima segunda-feira para analisar a situação política, depois do derrube do Governo PSD/CDS.
Crispação parlamentar
No Parlamento, o clima dá sinais de muita crispação. A coligação PSD/CDS decidiu assumir como suas as propostas de lei do Governo que prolongam a sobretaxa e os cortes na função pública para o próximo ano, depois o Presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, sustentar que as propostas de lei caducaram com a demissão do Governo. Uma posição partilhada pela maioria de esquerda.
A discussão em torno do que pode fazer um Governo em gestão está instalada. “Para evitar uma querela institucional e constitucional entre a Assembleia da República e o Governo, resolvemos dirimir essa matéria apresentando projectos com a mesma temática através dos grupos parlamentares”, justificou o líder da bancada social-democrata, Luís Montenegro.
À esquerda, João Oliveira, líder da bancada do PCP, contestou a intenção de o Governo prosseguir com a venda da TAP e alegou que o Executivo iria insistir em apresentar as mesmas propostas de lei, que seriam novamente aprovadas no Conselho de Ministros desta quinta-feira. Para o dirigente comunista, o Governo PSD/CDS está assim “exorbitar as suas possibilidades constitucionais” e entra em “confronto” com a Assembleia da República. Ao que o PÚBLICO apurou junto de várias fontes, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Costa Neves, terá levantado essa possibilidade de o Governo insistir nas propostas, mas não deu qualquer garantia nesse sentido.
Para Pedro Filipe Soares, líder da bancada bloquista, o Executivo não pode ser o autor das propostas de lei em causa. “O Governo extravasou o poder de um Governo demitido e em gestão”, afirmou.
À tarde, o curto plenário marcado para eleger as comissões parlamentares – que foram votadas - acabou por gerar uma acesa troca de palavras entre a deputada social-democrata Paula Teixeira da Cruz e Ferro Rodrigues. A antiga ministra pediu que os textos dos votos de pesar – do antigo chanceler alemão Helmut Schmidt e do vereador Paulo Cunha e Silva – estivessem disponíveis atempadamente para os deputados.
Ferro Rodrigues começou por concordar, mas remeteu essa competência para a direcção dos grupos parlamentares, o que foi vigorosamente contestado pela deputada. Depois de várias interpelações de Teixeira da Cruz e de João Oliveira (PCP), Hugo Soares (PSD) e de Ascenso Simões (PS), Ferro Rodrigues quis acabar com o ping-pong e recusou dar a palavra à deputada do PSD. Teixeira da Cruz exclamou “democracia, democracia”, ao que Ferro Rodrigues respondeu: “Democracia é também o respeito pelas maiorias”. A frase causou forte incómodo nas bancadas do PSD e do CDS.