Presidente faz defesa dos partidos tradicionais contra populismo
Cavaco Silva apelou aos partidos para prepararem já compromissos para o período pós-legislativas.
Na última mensagem de Ano Novo com plenos poderes – no próximo ano já haverá campanha eleitoral presidencial –, Cavaco Silva advertiu contra os perigos do populismo. “Rejeito em absoluto uma ideia demagógica e populista, que alguns pretendem incutir na opinião pública, segundo a qual os partidos e os seus dirigentes se alheiam dos interesses do país e das aspirações”, disse o Presidente. É um recado claro para os novos movimentos políticos que tentam explorar a onda de descontentamento que recai sobre a classe política.
Cavaco Silva defende que é preciso fazer um “esforço de pedagogia democrática”, tendo em conta que “os partidos políticos são essenciais para a qualidade da democracia e para a expressão do pluralismo de opiniões”. Esse esforço, prosseguiu, faz-se através do exemplo: “os partidos e os agentes políticos têm de demonstrar, pela sua conduta, que são um exemplo de transparência, de responsabilidade e de civismo para os portugueses”.
O Presidente faz assim a defesa dos partidos, apesar de já os ter criticado publicamente. Ainda no passado mês de Outubro, no dia da Implantação da República, o Chefe de Estado responsabilizou os partidos pela crescente “insatisfação dos cidadãos” e a “falta de confiança nas instituições”, fruto de “promessas irrealistas”. Essa tónica foi, mais uma vez, acentuada nesta Mensagem de Ano Novo. “Há que evitar promessas demagógicas e sem realismo. Devo ser claro: é errado pensar que os problemas que o país enfrenta podem ser resolvidos num clima de facilidades”, afirmou, referindo-se depois aos compromissos assumidos por Portugal como membro da zona euro. Esta advertência contra os facilitismos tem sido uma das ideias-chave do discurso do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho.
Cavaco partilha da ideia que tem sido um dos motes do discurso da coligação: Portugal “não pode” regressar a princípios de 2011 quando o Governo liderado por José Sócrates teve de pedir ajuda externa. O Presidente defende que “só o rigor e a transparência na condução da política nacional permitirão a melhoria continuada das condições de vida das pessoas”. E logo de seguida desafiou: “O combate à corrupção é uma obrigação de todos”. Foi a única referência a este tema no discurso, um mês depois de o ex-primeiro-ministro José Sócrates ter sido detido por suspeitas de crimes de corrupção, branqueamento de capitais e de fraude fiscal.
Noutras ocasiões, o Presidente tem falado no combate à corrupção, mas é preciso recuar à mensagem de Ano Novo de 2007 para ver o assunto desenvolvido. Nessa altura, PS e PSD tinham assinado o pacto da Justiça e o Presidente pedia legislação de combate à corrupção.
O Presidente prossegue a intervenção de 2015 com a referência ao fim do programa de ajuda externa com uma saída limpa e traça um quadro da economia sem um único dado estatístico ao contrário de Mensagens de Ano anteriores pontuadas com indicadores económicos ou com mais detalhes. Mesmo sem números, o retrato é animador e contrasta com os discursos de 2012 e de 2013: “A economia está a crescer, a competitividade melhorou, o investimento iniciou uma trajectória de recuperação e o desemprego diminuiu”. Uma tendência que Cavaco quer ver reforçada neste ano de 2015 com a ajuda dos fundos comunitários que não se pode “desperdiçar”.
O carimbo à política económica do Governo também foi concedido pelo Chefe de Estado quando defendeu ser “consensual que só através de uma estratégia orientada para a competitividade das exportações, para a atracção do investimento e para a criação de emprego será possível” vencer os desafios do futuro. É a visão partilhada pelo Governo, acrescida do controlo das contas públicas e do endividamento externo, dois aspectos que também constam do discurso presidencial.
Tal como na mensagem de Ano Novo de 2013 – e em momentos posteriores -, o Presidente volta a apelar ao diálogo, desta vez tendo no horizonte o dia seguinte às legislativas, e independentemente de um dos partidos vencer com maioria absoluta. “Seja qual for o resultado eleitoral, o tempo subsequente à realização de eleições será marcado por exigências de compromisso e de diálogo. Este espírito de abertura não poderá ser prejudicado por excessos cometidos na luta política que antecede o sufrágio”, afirmou, lembrando que “em devido tempo” chamou a atenção para o pós-troika. Como as tentativas de aproximar a coligação governativa do PS falharam, Cavaco Silva alerta agora os partidos para prepararem o período “pós-eleitoral” de Outubro de 2015 quando já está em marcha a campanha para as presidenciais.
O Presidente mostra preocupação em torno da estabilidade de um futuro Governo que saia das próximas legislativas. “Não é só no dia a seguir às eleições que se constroem soluções governativas estáveis, sólidas e consistentes, capazes de assegurar o crescimento económico e dar esperança aos portugueses”, alertou. Mesmo em vésperas de eleições, com um terreno pouco propício entre maioria e o PS, Cavaco Silva lembra que não é só a gestão interna que está em causa: “O período de pós-eleições deve corresponder à consolidação de um tempo de confiança no nosso país, quer no plano interno, quer no plano internacional”.