Candidato presidencial do PCP é o ex-padre Edgar Silva
Jerónimo de Sousa garantiu que a candidatura é para levar até ao fim. Depois de o PS e a coligação terem afastado o apoio a qualquer nome, os comunistas podem dar melhores condições a um candidato próprio.
Edgar Silva, 53 anos, é licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa. Em 1997 comunicou ao Bispo do Funchal a sua desvinculação em relação ao exercício do ministério sacerdotal.
A apresentação oficial da declaração de candidatura será feita no próximo dia 15, em Lisboa, dois dias depois da data marcada pela socialista Maria de Belém. Na comunicação pública do nome, o líder comunista garantiu que esta é uma candidatura para "usar todos os direitos e prerrogativas", e para "ir a votos". "Não está no nosso horizonte desistir, levaremos até ao fim", vincou. "Se houver segunda volta logo veremos."
A decisão do PCP já foi comunicada aos Verdes e à Intervenção Democrática (ID), que com o PCP compõem a CDU - Coligação Democrática Unitária, mas estas forças ainda não se pronunciaram.
“É uma candidatura a valer”, fez questão de afirmar Jerónimo de Sousa, destacando depois as qualidades “humanistas” do nomeado. Edgar Silva “é um homem que no seu trajecto de vida esteve sempre, mas sempre, do lado dos mais frágeis, do lado dos excluídos, particularmente do lado das crianças”, descreveu o líder comunista. “Sendo uma pessoa que assume os valores de Abril, aquilo que exigimos do camarada é que seja ele próprio. Tem uma dimensão humanista muito grande. É um homem que se identifica com os valores que a Constituição contém", em especial os "valores de Abril, de solidariedade e responsabilidade".
Com um longo e sólido percurso de intervenção social na Madeira, em especial ao nível das crianças, e dada a sua formação, Edgar Silva poderá ser visto como uma estratégia do PCP para entrar no eleitorado católico do PS – onde pontuará também Maria de Belém – com uma linha de discurso mais suavizado, por contraponto, por exemplo, ao discurso de Francisco Lopes, candidato em 2011. Essa não é, porém, a visão do histórico Octávio Teixeira, que nega a intenção vincada de caça ao voto junto dos católicos e lembra que, por exemplo, na Madeira o partido “sempre foi católico”.
Deolinda Machado, activista independente que tem concorrido nas listas da CDU e que integra a Liga Operária Católica, recusa qualquer segunda intenção na escolha de Edgar Silva. Com quem, aliás, a também dirigente da CGTP tem organizado debates sobre o relacionamento entre o PCP, os católicos e a igreja. A activista afirma que no partido, “ao contrário do que a direita gosta de fazer crer”, há grande abertura para todas as convicções religiosas. E lembra o apelo recente do Papa para os direitos dos trabalhadores, realçando que a tendência católica no PCP está em linha com os valores da defesa da dignidade humana, da dignidade no trabalho, do respeito pelo outro, defendidos pelo partido.
Edgar Silva foi professor na Universidade Católica do Funchal entre 1987 e 1992. Foi membro fundador do Movimento de Apoio à Criança e da Escola Aberta, movimentos de apoio às crianças de rua, entre 1987 e 1992, e Assistente Nacional do Movimento Católico de Estudantes, entre 1992 e 1995. É deputado à Assembleia Legislativa Regional da Madeira. É responsável da Direcção da Organização da Região Autónoma da Madeira do PCP.
Em 1996 regressou à Madeira como objector de consciência para o cumprimento do serviço cívico no trabalho com crianças de rua e foi candidato independente nas listas da CDU à Assembleia Legislativa Regional da Madeira. Nesse mesmo ano foi eleito deputado regional como independente, conseguindo o melhor resultado de sempre da Coligação Democrática Unitária nas legislativas madeirenses. Só se filiou no PCP dois anos depois.
Candidatura com melhores condições
Apesar das sucessivas candidaturas que foram sendo anunciadas no espectro político à esquerda, o PCP sempre afirmou que só trataria do assunto das presidenciais depois das legislativas. E fá-lo numa altura em que tanto PS como PSD/CDS já afirmaram que não darão, em princípio, apoio a nenhum candidato numa primeira volta das presidenciais.
Perante essa ausência de apoio dos outros adversários, um candidato apoiado pela CDU terá melhores condições financeiras e logísticas do que os restantes.
Questionado pelos jornalistas sobre se não tem receio de beneficiar a direita ao anunciar mais um candidato à esquerda, Jerónimo de Sousa optou por desvalorizar esse cenário. "Há anúncios e anúncios. Geralmente têm acontecido muitos anúncios e depois menos candidatos." E quanto a apoios numa possível segunda volta, isso depois se verá, mas o PCP "tudo fará para que na Presidência da República esteja alguém que assuma o compromisso de cumprir e fazer cumprir a Constituição".
Este anúncio surge menos de 24 horas depois de se ter reunido com o líder do PS, António Costa, em que Jerónimo de Sousa deixou claro o apoio do PCP a um governo de esquerda. O secretário-geral do PCP afirma que o tema presidenciais não foi abordado no encontro com os socialistas.
A decisão da candidatura presidencial comunista foi uma das conclusões do Comité Central que se na terça-feira, órgão decisório do PCP. Uma candidatura, realçou Jerónimo de Sousa, que "dará expressão às suas próprias ideias [do PCP] e modelo das funções e papel do Presidente da República e do exercício da sua magistratura". Os comunistas consideram fundamental que o próximo Chefe de Estado, "ao contrário do que tem sido feito pelo actual, assuma e cumpra a declaração de cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa".
Nas presidenciais de 2011, o candidato da CDU foi Francisco Lopes, que obteve 7% dos votos. Nestas legislativas, o militante de 60 anos, electricista de profissão e natural de Arganil, foi cabeça de lista por Setúbal, onde a coligação alcançou os mesmos quatro deputados de há quatro anos.
Em 2011, os objectivos da CDU nas presidenciais eram forçar uma segunda volta e impedir a reeleição de Cavaco Silva, mas nenhum deles foi alcançado. Na altura chegou a considerar-se que esta candidatura foi uma espécie de teste para uma futura nomeação de Francisco Lopes como secretário-geral do PCP.
Em 2006, o candidato comunista fora Jerónimo de Sousa, que chegou aos 8,64%, e conseguiu ser o único candidato a vencer um distrito a Cavaco Silva - o de Beja, por uma margem de duas décimas. Mas o actual secretário-geral do PCP já tinha uma experiência em presidenciais: concorreu em 1996, mas desistiu ainda na primeira volta, a favor de Jorge Sampaio que derrotou Cavaco Silva.