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Obrigação de a UE acolher refugiados é unânime entre candidatos

A crise dos refugiados domina a política europeia. O PÚBLICO foi ouvir o que os futuros deputados que acompanham este tema propõem como solução.

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Centro de acolhimento de refugiados da Bobadela foi inaugurado em 1999 Enric Vives-rubio
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Rita Baleia

Quando se realiza mais um Conselho Europeu sobre refugiados esta quarta-feira, em Bruxelas, o PÚBLICO ouviu candidatos em lugares potencialmente elegíveis que são especialistas ou se têm pronunciado sobre esta questão: Feliciano Barreiras Duarte, da coligação Portugal à Frente; Constança Urbano de Sousa, do PS; António Filipe, da CDU; Catarina Martins, do BE, Rui Tavares, do Livre/Tempo de Avançar; e Marinho e Pinto, do PDR.

Feliciano Barreiras Duarte, que foi responsável pelo pelouro da Imigração na qualidade de secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares entre 2011 e 2013, é peremptório em afirmar: “Devíamos deixar entrar os refugiados de guerra, os refugiados ambientais e outros.”

A mesma abertura demonstra a candidata do PS Constança Urbano de Sousa, especialista em justiça e segurança interna, imigração e asilo. “Todas as nações civilizadas da comunidade internacional têm a obrigação de proteger estas pessoas”, frisando que em causa está “o direito mais básico, o direito à vida”, pelo que “devia ser consensual”.

Desabafando que tem “pena que isto esteja a acontecer”, quando alguns responsáveis avisaram o que se desenhava no horizonte, Barreiras Duarte, que prepara um doutoramento precisamente sobre refugiados e asilo, advertia [numa altura em que ainda não eram conhecidas as conclusões da reunião dos ministros europeus da Administração Interna desta terça-feira]: “Era importante que Europa tivesse resposta. Estou farto de cimeiras do croquete, que são muitas vezes controladas pelos países concha do centro da Europa, que se esquecem que este é um fenómeno que veio para ficar. Nestas matérias não há visões de esquerda ou de direita, o que está em causa é a nossa tradição democrática e de defesa dos direitos humanos.”

Da mesma opinião é o vice-presidente da Assembleia da República e deputado do PCP, António Filipe, para quem “não há outra resposta que não seja apoiar estas pessoas do ponto de vista humanitário, com a dignidade que qualquer pessoa merece”. Mas o candidato comunista [também ouvido antes da conclusão do conselho de ministros do Interior de terça-feira] assumia que não tinha expectativas quanto ao que o Conselho Europeu venha hoje a decidir. E previa: “Já percebemos que não vai haver solução comum, não faz sentido ficar à espera da União, é atitude hipócrita que não resolve problema nenhum”. Concluindo que, “perante a falta de vontade política dos países da UE, deve remeter-se a decisão para a vontade política de cada um dos países.”

Em relação à necessidade de Portugal dar uma resposta como Estado, Barreiras Duarte assume o seu “orgulho pelo contributo” que deu, já que Portugal é, “a par dos suecos, um dos dois países que estão melhor em relação à integração”. E sustenta que “o Governo português tem tido abordagem positiva”, considerando que a nível nacional “Teresa Tito de Morais tem a capacidade de liderar a integração em acordo com o Governo”. “O número actual previsto para recebermos são cinco mil”, mas o país pode “integrar mais”, já que que “Portugal precisa de imigrantes”, acrescenta.

O candidato da coligação Portugal à Frente adverte para que “a Europa é um território em perda demográfica”. E insiste em que “os estudos mostram que a Europa precisa de uma política comum de imigração, não só do ponto de vista dos seus valores, como também do ponto de vista económico e demográfico precisava de passar do estado de Europa fortaleza que tem hoje”. E explica que a Alemanha está a “aproveitar-se, porque precisa de refrescamento demográfico”.

Barreiras Duarte lembra que “estas pessoas são as mais qualificadas dos seus países, pelo que os países do Médio Oriente vão ficar sem os melhores quadros”. António Filipe, por seu lado, frisa que “estas pessoas querem regressar a suas terras, pelo que não se trata de migrações económicas”. De acordo com a ACNUR, “90% dos refugiados querem voltar a casa”, garante Rui Tavares, candidato do Livre, que quando no Parlamento Europeu elaborou dois relatórios sobre refugiados.

Repetir 2001
Defendendo a necessidade de “uma política de imigração e asilo”, Barreiras Duarte advoga que “é preciso criar o que não existe, o que nunca se conseguiu ao nível dos tratados, já que Blair tinha uma política conservadora neste domínio”, mas chama a atenção para a existência de  “uma figura jurídica na União Europeia que permite entrada a todos”.

Constança Sousa argumenta que, “no plano imediato, a Europa tem a obrigação de dar protecção a essas pessoas” até porque os refugiados, “quando atravessam as fronteiras, não o fazem ilegalmente, já que todos têm direito de asilo. Está na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que vale tanto como o Tratado Orçamental”.

E concordando com Barreiras Duarte, Constança Sousa concretiza que “a União Europeia podia ter accionado a directiva de protecção temporária de 2001, criada por causa do conflito da ex-Jugoslávia, o que gerou um grande fluxo acolhido pela UE sem estas situações deploráveis”. A mesma solução é apontada por António Filipe, ao dizer que “há legislação sobre asilo por razões humanitárias devido a conflitos armados, usado para a Bósnia e o Kosovo”.

Apontando o dedo aos Estados-membros, Rui Tavares afirma que a actual crise é fruto da falência da política europeia para refugiados. “Era preciso instalar 200 mil por ano, segundo os cálculos de 2010, mas destes só foram reinstalados metade: 80 mil nos EUA, 20 mil no Canadá, Austrália e Brasil”. “Na UE, só dez dos 27 faziam instalação e apenas de 4500 por ano”. Isto faz com que “as pessoas que estão há quatro anos à espera se ponham a caminho”. E acusa: “É o falhanço dos Governos nacionais que não quiseram aprovar uma grelha de distribuição, mas apernas aceitaram apontar para metas voluntárias que falharam.” Para pedir: “Têm de voltar a fazer reinstalação a partir dos campos, para as pessoas não se porem em jangadas e fugirem.”

O ex-eurodeputado lembra ainda que “a UE tem um fundo de 800 milhões de euros para melhorar as condições dos que ficam nos campos e apoiar os países que integrem refugiados”. Explica que “não é necessário reinstalar todos nos países da UE”, mas adverte que “só se em parte o fizerem terão autoridade moral para impor uma solução”. Daí que “os Estados europeus devam aceitar quotas e fazer uma nova grelha que contemple muito mais que 200 mil por ano”.

Obrigação ética
Constança Sousa entende que os acontecimentos presentes são “a negação profunda dos valores europeus” e considera que “a Europa tem obrigação jurídica, moral, ética” de acolher os refugiados já que “durante e a seguir à Segunda Guerra Mundial houve deslocações em massa de judeus, de alemães e de outros para países não europeus”, razão pela qual "as Nações Unidas aprovaram a Convenção de Genebra, em 1951.”

O plano ético é evocado também pelo eurodeputado Marinho e Pinto, agora candidato pelo PDR. Sustenta que “a primeira obrigação ética da Europa é acolher e tratar os refugiados” e que “as questões humanitárias não devem criar dúvidas”. Marinho e Pinto é da opinião que “esta hesitação é uma das manifestações do falhanço do projecto europeu”. O eurodeputado considera que a UE "está invadida pelas pulsões e pelo vírus do nacionalismo e está a transformar-se num bunker para não cumprir os seus deveres humanitários.”

A situação é tanto mais incompreensível para António Filipe quanto a quantidade de refugiados em causa é mínima. O deputado comunista salienta que “os países europeus são os menos afectados”, comparados com a Jordânia e a Turquia. E relativizando a dimensão do fenómeno actual, lembra que “Portugal acolheu meio milhão de refugiados das colónias em 1975”.

Concretizando, Constança Sousa explica: “Estamos a falar de 0,05% da população europeia, isto fica em perspectiva se compararmos com o Líbano que alberga mais de um milhão, quando a sua população é de quatro milhões e meio”. E salienta que “este afluxo era previsível”, já que, “desde 2011, saíram da Síria mais de quatro milhões de pessoas. Estão acumuladas em países como o Líbano, estacionadas em campos sem perspectiva de vida” e apenas “os que têm dinheiro vêm para a Europa”. Relativizando os números, a candidata do PS diz que estes “não são aterradores, são 350 mil, ou seja, 0,5% do total de refugiados sírios, a grande pressão não é na Europa”. O que acontece, acrescenta é que “a forma desordenada e mediática como se está a processar, dá uma imagem de descontrole e invasão”.

A porta-voz do BE, Catarina Martins, clama por “uma actuação imediata” e por “corredores humanitários para distribuir os refugiados pelos vários países”. Sublinha que “100 mil dos refugiados são crianças, das quais dez mil viajam sozinhas, segundo a UNICEF,” a precisarem de cuidados de saúde específicos.

Raiz do problema
Para além da actuação imediata no acolhimento a União Europeia deve de contribuir para a solução do problema, dadas as suas responsabilidades. “A Europa cometeu o erro da intervenção no Médio Oriente”, afirma Barreiras Duarte, precisando: “Os franceses e os britânicos intervieram na Síria, sem os Estados Unidos. Sarkozy fez um grupo de trabalho para ajudar o novo regime democrático da Líbia e o Médio Oriente. Kadafi dizia que os europeus iam desestabilizar o seu regime e que a Líbia ia ser a Somália do Norte de África. Em relação à Síria também houve avisos.”

Também Marinho e Pinto sustenta que “a maioria destes refugiados foge de problemas criados pela Europa no Iraque, na Síria, na Líbia”. António Filipe traz os Estados Unidos à colação. “As guerras na Líbia, no Iraque e, fundamentalmente, na Síria não existiriam se não fosse a actuação dos EUA e da Grã-Bretanha, que com a intervenção no Iraque e na Síria criaram o Estado Islâmico”, afirma o deputado comunista, apontando como solução o fim da intervenção do Ocidente: “As responsabilidades da Europa e dos Estados Unidos resolvem-se deixando de apoiar terroristas.”

E Catarina Martins defende que “a ideia de espalhar a democracia à bomba não colhe”, pelo que “a Europa tem na sua mão secar financeiramente o Estado Islâmico. Há lavagem de dinheiro em off-shores com permissão europeia e há países que vendem armas ao EI”.

Ultrapassando a dimensão geoestratégica, Constança Sousa argumenta que é necessária “uma mudança de política da União Europeia” que conduza à “adopção de políticas de apoio ao desenvolvimento e de novas políticas migratórias”, advertindo que hoje em dia “o negócio do tráfico migratório gera mais lucro do que o da droga”. Isto porque, “havendo procura há organizações que aumentam o seu lucro e só os refugiados com capacidade financeira chegam à Europa”. E Catarina Martins sublinha que “é preciso arranjar maneira para que as pessoas a viverem em situação de guerra possam dirigir-se às embaixadas e pedir asilo”. Isto para evitar que “a União Europeia alimente redes de tráfico". Para isso, "são precisos novos instrumentos políticos, um novo estatuto de refugiado europeu”.

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