Cavaco Silva fecha a porta de Belém com a chave de Cascais
Chefe de Estado fez a sua última intervenção pública em Cascais e foi elogiado por Carlos Carreiras. Cavaco diz que agiu sempre de acordo com a Constituição e com o superior interesse nacional.
Durante os dez anos em que foi Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva diz ter procurado agir “sempre, em consciência, de acordo com o superior interesse nacional, no cumprimento da Constituição da República e sem olhar a outro critério que não o da procura de um futuro melhor para as novas gerações de portugueses”. E acredita que em Portugal “há um país que não desiste”.
Numa cerimónia na Câmara de Cascais, onde recebeu a chave da vila e o grau de cidadão honorário naquela que foi a sua última visita e intervenção pública enquanto Presidente da República, Cavaco Silva afirmou que “muito para além dos ciclos políticos e da conjuntura”, é “testemunha de que há um país que não desiste e de que há um povo que honra as vitórias, as conquistas e as Descobertas que ilustram a nossa História”.
Dos cinco minutos e meio de discurso, o Presidente gastou apenas dois para se despedir. Justificou a sua forma de agir, salientou que foi “um enorme privilégio servir Portugal” em dez anos “tão cheios de desafios”. Afirmou-se “profundamente grato” e “honrado pela confiança” que os portugueses nele depositaram quando o escolheram para Presidente. Disse que termina as funções com “redobrada certeza da garra e da mestria dos portugueses, com a mesma fé num futuro de maior coesão e justiça social para o nosso país, com a mesma esperança no cumprimento do desígnio que sempre me norteou: o de conseguirmos todos, em conjunto, assegurar a construção de um Portugal maior”.
Antes, salientara que durante os seus mandatos procurou “mostrar muito do melhor que temos no país, ir ao encontro dos casos de sucesso empresarial, dos bons exemplos de intervenção social e cultural, das realizações que traduzem o espírito lutador que verdadeiramente nos define como povo”.
O presidente da Câmara de Cascais, Carlos Carreiras, disse que nestes últimos dez anos Cavaco Silva foi o “garante absoluto e transparente” para a “normalidade do funcionamento das instituições” ao nível político, económico, financeiro e social. “Com o Presidente Aníbal Cavaco Silva não houve forças de bloqueio no Palácio de Belém. Não houve demissões de governos. Nem bombas atómicas constitucionais. Houve estabilidade, previsibilidade e normalidade – as manifestações públicas e concretas desse conceito abstracto de interesse de Estado”, defendeu o autarca durante uma elogiosa intervenção.
Perante uma sala cheia de autarcas e representantes das forças de segurança do município - e onde também marcaram presença o centrista Pedro Mota Soares e o antigo deputado, ministro e dirigente do PSD António Capucho -, Carreiras salientou que “o futuro encarregar-se-á de escrever a história e encontrar um lugar para todos nós. Sem fervores políticos nem ressabiamento ideológico”. “Num país que se habituou a tudo, a batalha pela normalização e pela estabilidade promovidas pelo Presidente Aníbal Cavaco Silva, num tempo muito particular e anormal, terá grande amplitude presente e futura”, disse Carreiras referindo-se aos “veredictos” sobre os mandatos do ainda Chefe de Estado e criticando o “mundo marcado pela contaminação dos poderes mediadores pela ditadura opinativa das redes sociais.”.
Carlos Carreiras disse que Cavaco é um “homem com sentido de Estado inabalável, de um patriotismo total e convicções inegociáveis”. Recordou que “sinalizou a importância crucial da normalidade como pré-condição para a prosperidade do país” e que “previu antecipada e acertadamente” que a normalidade económica, financeira e social estavam “postas em causa pelas ‘ilusões’ que se venderam aos portugueses em vários momentos da nossa história”. E ainda que apelou aos “entendimentos partidários de médio prazo” e que foi um “defensor intransponível” da pertença europeia.
O autarca referiu as contribuições de Cavaco Silva para a reabilitação da Cidadela de Cascais, que passará a integrar o bairro dos museus, mas também exemplos do “poderoso impacto social e económico” das suas políticas enquanto primeiro-ministro que beneficiaram Cascais, como a A5, a criação da escola de hotelaria, o plano de realojamento para acabar com os bairros de barracas.
Dez anos depois de chegar ao palácio de Belém, Cavaco Silva terminou as visitas que fez pelo país numa das três câmaras sociais-democratas do distrito de Lisboa (que ao todo tem 16 municípios). Por coincidência, a apenas 300 metros da casa de Marcelo Rebelo de Sousa.
Depois da curta cerimónia, Cavaco Silva visitou o museu municipal no piso térreo da Câmara de Cascais e saiu do edifício, sob o sol do meio-dia. Aos jornalistas, que o questionaram se nem no último dia falava, o Presidente da República, a caminho do carro, desculpou-se “Tenho muita coisa para arrumar, muitos papéis… nem imaginam!”