Ex-director da Judiciária demitido por este Governo diz ter dado prioridade à investigação do caso Freeport

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"Não faço a mínima ideia do que aconteceu com o processo [Freeport] depois da minha saída", diz Santos Cabral Carlos Lopes (arquivo)

O juiz Mouraz Lopes, então coordenador nacional do combate ao crime económico e financeiro da PJ, confirma. E nota que, a mando daquela direcção, foram realizadas buscas em Fevereiro de 2005 e expedida uma carta rogatória para Inglaterra, meio ano depois. O magistrado manifesta ainda a total disponibilidade para esclarecer "todos os pormenores sobre o assunto em sede própria" (Parlamento) se para isso for solicitado.

Uma semana antes das eleições legislativas de 2005, a PJ de Setúbal realizou uma operação para apreensão de documentos relacionados com a aprovação do Freeport. Em declarações à Visão, Mouraz Lopes justificou essa diligência pela necessidade de evitar a destruição de provas. "As investigações criminais avançam quando têm de avançar, independentemente do timing político", sublinhou. "E a investigação irá até ao fim." A 11 de Fevereiro do mesmo ano, um comunicado da PJ salientava que, "dos elementos carreados no processo não ressaltam, por ora, indícios que apontem como arguido qualquer líder partidário". José Sócrates era à data líder do Partido Socialista.

Três anos perdidos

A responsabilidade pelo facto de o processo ter estado parado desde que a carta rogatória foi expedida em 2005, até que o actual procurador-geral da República avocou o processo, em Setembro de 2008, é agora "empurrada" de polícias para magistrados do Ministério Público e de magistrados para polícias.


"Não faço a mínima ideia do que aconteceu com o processo depois da minha saída", diz Santos Cabral, que foi demitido em Abril de 2006 na sequência de um conflito institucional com o ministro da Justiça. Na altura alguns observadores relacionaram essa demissão com o empenho posto na investigação do processo Freeport. Foi substituído na direcção da PJ por Alípio Ribeiro e era então procurador-geral da República Souto Moura.

Informações recolhidas pelo PÚBLICO indicam que, no início, ainda em 2004, o processo foi enviado do tribunal do Montijo para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), encarregado do combate, a nível nacional, à criminalidade complexa e violenta, já liderado por Cândida Almeida, para que fosse decidido se era ali que deveria ser desenvolvida a investigação. Logo então as opiniões dividiram-se entre os magistrados, com os que consideravam que aquele era o organismo certo para dirigir a investigação e os que defendiam não existir matéria que justificasse que o caso ali continuasse. O processo acabou, no entanto, por ser devolvido ao Ministério Público do Montijo e o magistrado titular delegou as investigações na PJ de Setúbal chefiada pela inspectora coordenadora Maria Alice Fernandes.

Após a carta rogatória - que, até hoje, está por cumprir - e da saída de Santos Cabral da PJ, o processo parou, segundo afirmou ao PÚBLICO o procurador-geral da República, até este ter decidido avocar o processo em Setembro do ano passado. Esta versão é, contudo, contrariada pelo presidente da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal (ASFIC), Carlos Anjos, garantindo que o inquérito "nunca esteve parado".

Segundo informações prestadas ao PÚBLICO com pedido de anonimato, a decisão do PGR foi tomada depois de este ter sido informado das diligências em curso por parte da polícia inglesa e da preparação de uma reunião entre os investigadores portugueses e britânicos, em Haia, na Holanda, em Novembro de 2008.

O encontro de Haia

Este encontro, promovido pela Eurojust, organismo europeu responsável pela cooperação no âmbito da investigação criminal, reuniu altos representantes das polícias e das instâncias judiciais dos dois países que trocaram informações e combinaram as melhores formas de cooperação no âmbito das duas investigações a decorrer paralelamente em Portugal e em Inglaterra.


As buscas aos escritórios do advogado Vasco Vieira de Almeida e do tio de José Sócrates devolveram o assunto às primeiras páginas dos jornais. Três dias antes, chegara uma carta rogatória das autoridades britânicas à Procuradoria-Geral da República requerendo novas diligências.

O assunto continua a não ser pacífico. Magistrados ouvidos pelo PÚBLICO concentram as "culpas" do atraso das investigações na inércia da PJ de Setúbal - a quem terão faltado meios para continuar a investigação - e na falta de vontade política da direcção daquela polícia liderada por Alípio Ribeiro, que até ao fecho desta edição, não foi possível contactar. Ex-dirigentes da PJ asseguram, por seu lado, que o processo parou no Ministério Público, que não promoveu mais diligências para prosseguir a investigação.

No DCIAP as opiniões mantêm-se divididas entre os que acham que as provas do envolvimento do primeiro-ministro no caso Freeport existem e que consideram que o caso se tornou num processo político e os que consideram que não há matéria suficiente para constituir ninguém arguido.

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