Estudo mostra que portugueses sabem usar voto preferencial

É o primeiro trabalho de campo sobre este método de ordenação de listas pelos eleitores. Foi feito a 4 de Outubro em Lisboa, Braga e Beja. Os resultados surpreendem, pela manutenção da tendência do voto partidário.

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Nuno Ferreira Santos

São positivos os resultados do primeiro trabalho de campo sobre voto preferencial feito através de uma sondagem à boca das urnas eleitorais realizado no dia 4 de Outubro, por Marina Costa Lobo, José Santana Pereira e João Tiago Gaspar. O resultado mostra que os eleitores portugueses não se confundem nem se perdem nos vastos boletins de voto (consequência da necessidade de se dar a conhecer os nomes de todos os candidatos das listas) e que sabem fazer as suas escolhas de acordo com a tendência das opções partidárias.

Intitulado “A introdução do voto preferencial nas eleições legislativas em Portugal – Uma experiência eleitoral realizada a 4 de Outubro de 2015”, o trabalho será divulgado no site do Instituto de Políticas Públicas do ISEG e mostra como a reacção positiva dos inquiridos ao uso de voto preferencial, ou seja, à possibilidade de, além do partido, os eleitores poderem escolher o nome do candidato que gostavam de ver eleito.

“Os debates sobre voto preferencial têm sido feitos sem teste”, lembra Marina Costa Lobo, em declarações ao PÚBLICO, acrescentando que até agora essas discussões “são feitas na base da troca de argumentos para lá e para cá, sobre se as pessoas têm capacidade de preencher o estudo, mas sem testar”.

Neste estudo foram comparados três tipos de votos: o tradicional (A), o preferencial com possibilidade de votar no partido ou no candidato (B) e o preferencial com a possibilidade de votar apenas em candidatos (C).

Marina Costa Lobo é peremptória a afirmar que os resultados mais interessantes são os apresentados pelo sistema de voto preferencial em que os eleitores tinham de escolher apenas os candidatos (boletim C). “Em Lisboa no boletim C houve apenas 7,5% de votos brancos e nulos, o que é de salientar”.

A investigadora explica que o boletim de voto C em Lisboa, onde há 47 candidatos, “era constituído por duas folhas A3”. O que a leva a concluir que “é muito bom e é contra o que é expectável”. Marina Costa Lobo adverte, porém, que em Lisboa “influi o facto de as listas terem nomes conhecidos que são os mais relevantes dos partidos”, por exemplo, os líderes “que foram escolhidos”.

Outra conclusão que Marina Costa Lobo salienta é a de que os eleitores que participaram neste estudo sabem o que estão a fazer, mesmo quando confrontados pela primeira vez com o sistema de voto preferencial. “Se as pessoas não votassem de acordo com as preferências do voto partidário e tivessem votado ao calhas teria sido mais dividido. As pessoas sabem que partido e olharam para a lista do seu partido”, defende a investigadora, concluindo que “não é uma escolha tão difícil como podia parecer, as pessoas já conhecem os partidos”.

No estudo, é explicado que “considerando o Boletim C, em que se pediu aos eleitores para votarem num candidato apenas, verificamos que vários candidatos que não são cabeças de lista são escolhidos. No entanto, a ordenação do partido continua a ser em parte validada, estabelecendo um equilíbrio entre o que são as escolhas dos eleitores e as preferências dos partidos”.

Equilíbrio eleitores-partidos
Pelo que os três autores concluem: “Em suma, se tivermos em atenção o risco de aumento de votos nulos e brancos, a par da capacidade de votar preferencialmente, inclinamo-nos em sugerir a implementação do Boletim C.” E argumentam que “ o boletim C é aquele que permite uma maior escolha de candidatos de forma preferencial, sem no entanto deixar de exprimir a escolha dos partidos, devido à ordenação inicial dos partidos e ao facto de se estabelecer um limiar onde só aqueles candidatos que obtém esse número de votos são eleitos”.

Daí que a investigadora conclua, em declarações ao PÚBLICO que a importância deste estudo é mostrar que “o voto preferencial não se sobrepõe aos partidos é um novo canal que se estabelece entre eleitores e eleitos”, pois “as pessoas continuam a votar no partido”.

Por outro lado, este sistema “”obriga a uma responsabilização maior dos deputados em relação ao seu círculo e têm de fazer mais campanha e serem mais activos para serem conhecidos” e logo escolhidos pelos eleitores.

Como se pode ler no próprio estudo, ele é “pioneiro” e “permite ter mais segurança no momento de propor implementação deste sistema de voto eleitoral”. O método é o de listas fechadas não bloqueadas, possibilitando que os eleitores escolham um nome da lista indicada e hierarquizada pelos partidos. Com este voto, os candidatos mais escolhidos entram preferencialmente.

A sondagem resultou numa amostra global de 936 eleitores e foi feita em três círculos indicativos, um grande, um médio e um pequeno: Lisboa que tem 47 deputados, Braga com 19 e Beja com 3. Foram mantidos os círculos actuais, nomeadamente o de Lisboa, que é o maior.

Este estudo com trabalho de campo é a segunda parte do trabalho “Afirmar o futuro”, feito no âmbito do Instituto de Políticas Públicas do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) e é patrocinado pelo projecto IASPP – Infraestrutura das Atitudes Sociais e Políticas dos Portugueses do Instituto de Ciências Sociais (ICS), que junta pesquisas como a que Marina Costa Lobo e Pedro Magalhães dirigiram sobre comportamentos eleitorais com os estudos sobre confiança dirigidos por Jorge Vala. O IASPP é financiado pela Fundação Ciência e Tecnologia e centraliza recursos partilhados por vários projectos. Estes dados poderão ser usados por outros equipas e outras investigações.

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