Em defesa da PaF
O PSD dividiu-se de acordo com a sua cada vez mais escassa consciência social-democrata e o CDS revelou-se como o verdadeiro partido da direita.
Começa agora a revelar-se, aos poucos, o método de falsidades usado pela coligação PaF que a levou ao lisonjeiro resultado de 38%. O aproveitamento e provável manipulação fiscal, atrasando os reembolsos de IVA, ampliaram até ao fim da campanha eleitoral os acumulados da colecta que alimentavam a expectativa de redução da sobretaxa, com devolução já no início de 2016. Exemplo sofisticado de vigarice rasteira. Praticada com a má-fé de calculismo de calendário. É indispensável que antes de haver novo governo os responsáveis sejam chamados ao capítulo parlamentar.
Sabe-se que uma agência do Estado está em vias de fechar as formalidades de contratação de uma centena de agentes. Tanta pressa para quê? Adivinhem como terão sido os critérios e não estranham a pressa. Facto consumado. É assim.
Soube-se agora que o Governo resolveu celebrar contratos plurianuais para cirurgias electivas a realizar pelo privado, sem concurso conhecido. Estaremos a respeitar o princípio da anualidade do orçamento?
Anunciam-se mais subsídios ao ensino privado em cobertura redundante com o ensino público. Até já vimos propaganda política dos beneficiados, contra a possibilidade de governo de Costa. Defendem a bolsa, nem sequer a pele, muito menos a dignidade.
A informação estatística regular dá conta de que estamos, nesta altura do ano, nove mil milhões acima da meta proposta para a dívida pública, sem perspectivas de ela ser alcançada. Bem sabemos que a dívida é menos escrutinada que o défice. Mas para quem se arrogou, durante quatro anos, o zelo dos cumpridores, regista-se a cambalhota. A menos que exista uma boa surpresa, uma arma secreta, para acertar o prometido com o devido. Venha ela. Temos ainda um mês.
Ficámos a saber que o segundo concorrente à TAP havia desistido. Gostaríamos de saber pormenores. Estamos fartos de nada saber sobre o negócio e afinal a privatização foi a fingir, sem risco para o comprador e com risco evidente para o Estado. Para manter o recato não é necessário sonegar informação. A transparência só melhora o negócio.
Continuamos a saber muito pouco sobre o caso BES e suas sequelas. Bem sei que a oposição não deve dar sinais de descrédito do sistema bancário. Já basta o descrédito que ele próprio promoveu por erros seus, ganância e quejandos que não se qualificam por pudor. Mas um pouco mais de informação só beneficiava regulado, regulador e governo. Tanto mais que já lá vão as eleições e a pressa que o governo impunha para uma venda a todo o custo. Por exemplo, seria interessante que se conhecesse a lista das movimentações bancárias de última hora, ou para ser mais claro, quem teria eventualmente aproveitado de informação privilegiada para, na 25ª hora do BES, pôr a salvo o recheio das suas contas. Não há segredo bancário que deva prevalecer sobre o eventual aproveitamento ilícito de informação privilegiada. Sem lisura, como pretendemos que o povo volte a confiar na banca?
Já depois da queda, tudo fizeram para gritar “há lobo” aos ouvidos das agências de rating. Se puderam enganar a parte da classe média que neles votou sobre os seus pretensos méritos na reputação financeira do País, quando afinal tudo se deve ao Banco Central Europeu, vem agora a prova dos nove: não só o rating não desceu, como o crédito para a dívida soberana passou a juros negativos. Realmente frustrante para a PaF.
Muitos outros esqueletos devem existir nos armários do governo anterior. A lista será infindável se o governo cambaleante continuar, mesmo que em vez dele surja um governo dito “técnico”, a cargo de um inocente útil, disposto a ser trucidado semanalmente no Parlamento. As oposições deliciar-se-ão a descobrir os podres não revelados em período eleitoral. Teriam tempo para o fazer. Seriam implacáveis em deslindar o que foi encoberto. Semana atrás de semana, a verdade seria exposta em prestações. Cairiam por terra as mentiras; e o argumento de que tanto abusam sobre o contrato de confiança entre eleitores e eleitos virar-se-á contra eles que afinal, pela segunda vez, enganaram pesadamente quem neles votou. Este pavor explica o desespero com que a tropa de choque se agarra ao poder. Passos tem outras ideias. Sabe que a agonia de um governo de gestão corrói a sua reputação, mesmo que um futuro presidente lhe fosse simpático, o que é duvidoso. E se esperasse que o novo Presidente convocasse eleições antecipadas, caso elas surgissem, o seu resultado seria bem pior que o anterior. A coligação esvair-se-ia em recriminações mútuas e em divisões até agora omitidas. Basta ver o que aconteceu na votação para reposição da lei anterior sobre a luta contra o aborto clandestino. O PSD dividiu-se de acordo com a sua cada vez mais escassa consciência social-democrata e o CDS revelou-se como o verdadeiro partido da direita.
O governo de Costa simplesmente não terá tempo para desperdiçar nestas guerrilhas. Afinal, a sua posse iminente pode ainda ser a única forma de prolongar a vida à coligação, deixando a direita viver com um resto de dignidade o caminho que escolheu.