Camarate: José Esteves confessa ter fabricado engenho explosivo

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Francisco Sá Carneiro Lusa (arquivo)

A edição de amanhã da revista Focus, que entrevistou José Esteves, refere, segundo a Lusa, que o antigo segurança do CDS assume agora que foi o autor da bomba incendiária que provocou a queda do avião, mas que o seu plano era apenas pregar um "susto" ao general Soares Carneiro - candidato presidencial pela Aliança Democrática (AD) - e que o engenho foi alterado por forma a provocar a morte dos passageiros do Cessna.

A explosão da aeronave Cessna, no bairro de Camarate, a 4 de Dezembro de 1980, provocou a morte do então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro, da sua mulher, Snu Abecassis, do ministro da Defesa Adelino Amaro da Costa, do chefe de gabinete do primeiro-ministro António Patrício Gouveia, assim como dos dois pilotos do aparelho.

Para uns foi um acidente, para outros um atentado. Depois de muitos anos em investigações, o caso nunca chegou à barra dos tribunais.

Questionado pela revista Focus sobre o alvo do atentado, José Esteves explica que "era um engodo destinado a Soares Carneiro" e que "o circo mediático estava todo montado".

Segundo conta José Esteves, a bomba era para "fazer incendiar o avião no fim da pista, sem levantar, e pregar um susto".

Adelino Amaro da Costa tinha o avião disponível para viajar para o Porto, onde ia assistir ao encerramento da campanha de Soares Carneiro, mas este foi para Setúbal nessa noite, acompanhado de Freitas do Amaral.

O primeiro-ministro Sá Carneiro, que também ia para o Porto, acabou por desmarcar os dois bilhetes que tinha reservado na TAP e, juntamente com o ministro da Defesa, embarcou no Cessna.

O antigo segurança afirmou também à Focus que foi ele quem "fabricou a faca, mas não deu a facada". "Eu fabrico a faca, mas não dou a facada. As armas não matam. Quem mata são os homens. Em Camarate, tudo o que eu fiz foi dizer 'sim, senhor patrão'", pode ler-se na mesma entrevista.

"Montei um engenho incendiário para pregar um susto. Foi entregue na Rua Augusta, numa loja, debaixo de um 'puff'. Já sabia que era para um indivíduo de tez escura...", disse José Esteves à revista.

José Esteves explicou que o engenho era uma mistura: "Se juntarmos clorato de potássio com açúcar e ácido sulfúrico temos uma bomba incendiária. Basta depois ter um tubo - e um cabo de reboque ser levantado - para o engenho ser accionado".

José Esteves assumiu a autoria do engenho para "pregar um susto", mas recusou ser considerado o assassino dos dois políticos portugueses e confessa que, ainda hoje, o caso Camarate lhe provoca sofrimento.

"Não é medo. É sofrer. É a filha não me convidar para o casamento por o pai ser o assassino de Camarate. É o meu pai morrer e dizer: 'Eu vou morrer filho, e tu és o assassino de sete pessoas'", confessou igualmente José Esteves à revista Focus.

"O avião era para incendiar no fim da pista. Depois, todos os que foram avisados, ao engano, aparecem na porta com o cinto de amianto desapertado. E o amianto não queima. E os corpos estão todos à saída do avião, verdade? Ora, em 30 e tal segundos não dá tempo para desapertar os cintos quando se apercebem que alguma coisa vai correr mal depois do avião bater nos cabos de alta tensão e antes de se despenhar no bairro de Camarate", pormenorizou ainda José Esteves, acrescentando que "no fim da pista o avião ia efectivamente a arder".

O Cessna, já a arder e deixando um rasto de detritos, acaba por embater em cabos de alta tensão, junto ao bairro das Fontainhas, e, perdendo velocidade, acaba por se despenhar numa bola de fogo, sobre Camarate, perto de Lisboa.

Em termos judiciais, o caso prescreveu em Setembro deste ano e, apesar da confissão, o antigo segurança nunca poderá ser julgado.

"Como alguém conhecido uma vez me disse, não tem solução: Peca por excesso de provas", concluiu José Esteves.