Almunia não ordenou devolução das ajudas estatais concedidas aos Estaleiros de Viana
A garantia foi dada pelo comissário europeu para a Concorrência, Joaquín Almunia, em resposta a uma pergunta do Bloco Esquerda.
A devolução pelos ENVC ao Estado português dos 181 milhões de euros concedidos à empresa pública, como ajudas estatais, entre 2006 e 2011 foi a razão invocada pelo ministro da Defesa para cancelar a reprivatização dos ENVC, em Abril de 2013, e para justificar a subconcessão, apontada como única solução possível para o único construtor naval do país.
Na resposta, datada de 15 de Janeiro e à qual o PÚBLICO teve acesso, Joaquín Almunia esclarece que “a Comissão ainda não adoptou uma decisão final” relativamente ao processo das ajudas concedidas pelo Estado aos ENVC.
“Por conseguinte, a Comissão não ordenou a Portugal a recuperação de qualquer auxílio estatal concedido aos ENVC”, refere Almunia na resposta à pergunta da eurodeputada eleita pelo Bloco de Esquerda Marisa Matias.
Almunia adianta que, desde a abertura da investigação aos apoios financeiros do Estado aos Estaleiros, têm existido “diversas trocas de correspondência com as autoridades portuguesas”.
“A Comissão continuará a sua avaliação do processo e a supervisionar atentamente a evolução da situação dos ENVC”, remata o comissário.
Perante a resposta do comissário europeu, a eurodeputada bloquista pediu esta quarta-feira a demissão do ministro da Defesa por “ficar comprovado que este negócio, que foi construído através de uma gestão danosa, foi legitimado por uma mentira”.
A pergunta da eurodeputada foi enviada ao comissário europeu no final de 2013 na sequência de afirmações de Aguiar-Branco, que justificou o despedimento dos 609 trabalhadores e a entrega da empresa pública a privados com a necessidade de devolução dos 181 milhões de euros reclamados pela União Europeia.
A 19 de Abril de 2013, no Porto, Aguiar-Branco afirmou que os ENVC teriam de devolver as ajudas ou não poderiam “prosseguir na sua actividade”.
"A mentira tem perna curta, e é lamentável que pelo seu caminho tenham sido postas em causa as vidas de 609 trabalhadores”, sustentou Marisa Matias.
A 3 de Dezembro último, em conferência de imprensa, o ministro da Defesa afirmou que, "quando o governo se preparava para tomar uma decisão quanto à proposta vencedora do processo de reprivatização, em Outubro de 2012, a Direcção Geral da Concorrência da Comissão Europeia suscitou dúvidas sobre auxílios de Estado concedidos aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, entre os anos 2006 e 2011".
"Mais de 181 Milhões de Euros teriam de ser devolvidos pela empresa e foram objecto, em Janeiro de 2013, da abertura formal de um procedimento contra o Estado Português", acrescentou Aguiar-Branco. E acrescentou que se tratava de "um processo com o potencial de se arrastar durante vários anos nas instâncias europeias, como habitualmente acontece em situações semelhantes. Nem os Estaleiros nem os contribuintes dispunham, ou dispõem, de tempo e dinheiro para mais este encargo".
Já em Dezembro passado, quando apresentou uma queixa-crime na Procuradoria-Geral da República e um pedido à Comissão Europeia para suspensão do processo de subconcessão dos ENVC, a eurodeputada do PS Ana Gomes tinha acusado o Governo de “se desculpar com Bruxelas”.
A eurodeputada deu conta de uma reunião com o responsável europeu, a 11 de Dezembro, em Estrasburgo, onde este se mostrou “surpreendido” por o “Governo nunca ter invocado junto da Comissão Europeia o facto de os ENVC construírem navios para a Marinha Portuguesa” – facto relevante, acrescentou, uma vez que tal “poderia justificar transferências financeiras do Estado para os ENVC”.
Para Ana Gomes, este é um indício de que os interesses portugueses não estavam a ser devidamente defendidos pelo Governo. Lembrou que fora esse o argumento que “permitira a continuação da laboração dos Estaleiros Navantia, na Galiza, Espanha, também alvo de investigação [europeia] por ajudas do Estado”.
A ex-diplomata acrescentou que a Comissão “não queria abrir um processo a Portugal”. Apresentou mesmo “avenidas de saída” para Portugal justificar as ajudas estatais nos documentos que produziu sobre o assunto. Essas pistas eram declarar a empresa em dificuldades ou então avançar com um processo de reestruturação.