Os olhos azuis da nora judia

“Ele” é o Conselheiro José Menéres Pimentel que acaba de nos deixar. Nunca o conheci pessoalmente ao longo da sua extensa e intensa carreira política. Mas tive esse gosto e privilégio durante os anos em que presidiu à Comissão de Liberdade Religiosa. Foi o seu primeiro presidente a partir de 2004 e aí deixou a sua marca que se prolongou para lá da sua saída em 2007.

Durante a sua presidência aprendi a conhecer, a admirar e a estimar um homem para quem a liberdade, a democracia e a abertura de espírito não eram meras palavras. Aprendi o que significa na prática ser “social-democrata”, espécie hoje em vias de extinção. Aprendi que a modéstia é apanágio dos homens grandes, a afabilidade um convite ao diálogo. Menéres Pimentel ouvia primeiro, depois tirava as suas conclusões.

O sectarismo, os “ismos” eram-lhe desconhecidos. “Os extremos são sempre negativos”, dizia. Uma sabedoria, também em perigo de vida… Mesmo depois de deixar a Comissão, nunca esqueceu as pessoas: quando vinha à Baixa com a sua mulher, não deixava de ir à Rua Augusta cumprimentar as funcionárias com a mesma delicadeza de sempre.

No Natal de 2010, veio à Comissão de Liberdade Religiosa fazer-nos uma visita, já Mário Soares era presidente da comissão. A sua companheira de sempre tinha falecido, mas brindámos à vida. A dor da perda deixara marcas mas afiançou-nos que a família, muito especialmente os netos nunca o deixavam só.

O seu humor era acutilante, por vezes corrosivo mas nunca maldoso. “Então já voltou da guerra”? dizia-me por vezes quando eu regressava de Israel. “Desta vez, vocês superaram-se!” E o seu sorriso era sempre caloroso.

Foi-se o homem, fica a saudade.

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