Cartas à Directora
O Lenine tuga
De acordo com as notícias, estaremos nas vésperas da celebração de um acordo histórico entre PS, BE e PCP que viabilizará, no Parlamento, um Governo liderado por António Costa. O que há pouco tempo atrás parecia uma impossibilidade, pela História e pela diferença abismal entre os projectos de sociedade dos três partidos, está cada vez mais próximo de acontecer.
Como é natural em qualquer processo de negociação de uma plataforma comum, têm certamente as partes valorizado e enfatizado o que os une e dado menos atenção aos remoques do passado e ao que os divide.
Relativamente aos que, do exterior, acusam o provável acordo de ilegitimidade política, têm os partidos de esquerda argumentado, e bem, a meu ver, colocando a questão no cumprimento estrito da Constituição da República e do respeito pelos legítimos representantes do povo no Parlamento, no âmbito da nossa democracia representativa.
Neste contexto de grande bonança à esquerda, fiquei estupefacto ao ouvir Arménio Carlos, líder da central sindical controlada pelo PCP, [dizer que vai] convocar uma manifestação frente à Assembleia da República para o dia em que se prevê a rejeição do programa do Governo PSD/CDS. Não existindo nenhuma magna questão em cima da mesa, e estando nessa altura o acordo já assinado, para quê a berraria e a confusão à porta do Parlamento?
Mas depois percebi! Comemora-se (?) nesse dia o 98.º aniversário do assalto ao Palácio de Inverno pelos revolucionários russos comandados por Lenine! Não conhecerá Arménio Carlos o velho ditado que diz: “em casa de enforcado, não se fala em cordas”? É que, na sequência da vitória bolchevique, instalou-se a mais longa, sangrenta e tenebrosa ditadura europeia do século passado.
Não havia nexexidade…
Hélder Pancadas, Sobreda
Cheira mal
O senhor José Sócrates cheira mal. Vamos esquecer, por agora, o enquadramento jurídico estrito, dado que ainda não foi julgado e, até lá, beneficia da presunção da inocência.
No entanto, para um ex-político, e supostamente até de esquerda, é obsceno o nível de vida por ele praticado, ainda por cima às custas de um amigo que, se empresta dinheiro assim, deveria a família solicitar a sua inabilitação imediata.
Foi o senhor testar os seus dotes oratórios e galvanizadores de audiência a Vila Velha do Ródão, fazendo-se prazenteiramente acompanhar pelo diretor de um dos principais jornais nacionais, concretamente Afonso Camões, do JN, e queixou-se da existência de um “poder oculto”, envolvendo alguns jornalistas. Certamente Afonso Camões, o tal que, quando ainda estava na Lusa, teve o cuidado de o avisar de que estava a ser investigado, não faz parte desse grupo.
A sua defesa conseguiu rapidamente proibir o Grupo Cofina de publicar notícias (explosivas) recorrendo a elementos do processo. Formalmente, está certo, mas há aqui um detalhe a evidenciar. De acordo com o discurso anterior do “não há nada”, seria mais previsível uma acusação de difamação.
Tudo isto cheira tão mal, que nem dá vontade de chegar perto. Não tenho nenhuma simpatia pelo Correio da Manhã, mas o país tem o direito de conhecer os detalhes do modo de vida de um seu ex-primeiro-ministro, sobretudo quando eles parecem tão desproporcionados face aos rendimentos previsíveis.
Seria bom, e muito higiénico, que todos os socialistas sérios tivessem a dignidade de fugir à abordagem clubística desta vergonha e privilegiassem a primazia dos princípios.
Carlos J. F. Sampaio, Esposende