Cartas à Directora
O número
“As pessoas crescidas gostam de números…”
Não sei porquê, veio-me à ideia esta frase do narrador, em O Principezinho, de Antoine Saint-Exupéry, quando, há dias, li que Portugal é um dos países mais desiguais da Europa, que essa situação se agravou com a intervenção da troika e que se vai agravar mais com o OE de 2014.
Já estou em “decrescimento”. Talvez por isso, sou excepção à regra do narrador de O Principezinho. Gosto pouco de números. O que é uma fragilidade, já que tudo está a ser “ajustado” como meros números: saúde, educação, justiça, emprego, cultura, condições de trabalho e de vida, dignidade até. Somos (des)governados não por “principezinhos” vindos do asteróide B612 mas por “baronetes” e “baronesas” (um ou outro “barão” mais “irrevogável”…) que, talvez por serem oriundos(as) de certos “asteróides” ideológicos, adoram números e desprezam as pessoas.
Mas, entretanto, em muito do que “vejo, ouço e leio”, sinto “que não posso ignorar” um certo número. É certo que é um número rejeitado por muita gente. Com ele, há quem não coma em certas mesas, não faça uma declaração (ou acto) de amor em certas noites (ou dias), não se case em certos sábados (e ainda menos em certas sextas).
Mas, apesar disso, um número que é excepção à minha aversão aos números, pela importância humana, social e democrática do que significa. “Só” isto: “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social”.
Isto é o que reza o artigo da Constituição da República Portuguesa com a epígrafe “Princípio da Igualdade”. Ao qual foi atribuído esse número.
É esse número que, cada vez mais, sinto que não pode ser ignorado. É o 13. Sim, o treze. É esse o número.
J. Fraga de Oliveira, Sta. Cruz da Trapa
Ainda uma palavra sobre as praxes
As praxes não são mais nem menos do que uma consequência de situações de um país menor, incivilizado, de um país que se entretém com práticas que podiam revestir-se de um carácter cultural, mas são actos de pura sobranceria e ditadura onde os caloiros e, sobretudo, as caloiras são tratados abaixo de cão, como escravos. De nível superior não têm nada, antes pelo contrário, são práticas aberrantes, algumas nojentas e indecorosas, que não têm nada a ver com a chamada integração.
Nas fotos mostradas pela televisão, e há muito pior, pudemos ver cenas vergonhosas e humilhantes, impróprias de seres humanos. Trata-se de uma prática nada democrática que não respeita o direito que os caloiros têm a serem bem recebidos numa universidade.
Sobre a tragédia do Meco, direi que, como em todos os processos, seja de corrupção ou outros, não se vai chegar a lado nenhum. Porque o sobrevivente, sendo dux (latim: condutor, chefe), vai sacudir a água do capote e esconder tudo o que possa ser esclarecedor para apuramento da verdade, porque, como o nome indica, só conduziu os colegas para a tragédia e não se confessará culpado de nada.
Artur Gonçalves, Sintra