Ninguém morreu na arena dos dez debates
Terminado o ciclo dos debates, fica a sensação de que estes não foram decisivos e que haverá incerteza até se contarem todos os votos e se eleger o último deputado
Os dez debates entre os líderes dos cinco maiores partidos foram seguidos por milhões de portugueses. As medições das audiências colocaram-nos, por regra, entre os mais vistos dos dias em que foram exibidos. O que indica que os eleitores queriam ser esclarecidos, que viram com atenção mesmo os debates entre os dirigentes dos partidos mais pequenos.Este é um bom indicador: mostra que os eleitores quiseram ser esclarecidos.
O pior indicador foi a qualidade geral dos debates. Não que alguns não tenham sido vivos e com uma animada troca de argumentos. O principal problema é que se falou demasiado do passado - mesmo quando José Sócrates não estava presente - e demasiado pouco do que cada partido faria, se ganhasse as eleições. Talvez a maior excepção a esta regra tenha sido o último debate, se bem que mesmo aí o primeiro-ministro tivesse mantido o registo de enumerar medidas que tomou e não tivesse dito quase nada sobre o que era importante que dissesse: o que vai mudar nas suas políticas, pois algumas destas, pelos resultados à vista, são insuficientes, porque não conseguiram evitar que Portugal, como a OCDE acaba de comprovar, vá sair da crise mais devagar de que a maior parte dos outros países desenvolvidos.
De uma forma geral estes debates não terão sido decisivos, mesmo para que os eleitores indecisos. Ninguém cometeu um erro fatal, e só um erro fatal poderia mudar de forma radical o sentido de voto dos eleitores. Mesmo assim nem todos os líderes saíram deles como haviam entrado.
O primeiro-ministro, José Sócrates, era o que mais tinha a perder, mas também quem, ao entrar como favorito e ao estar num terreno que conhece bem, mais poderia ganhar. Politicamente tinha dois objectivos: por um lado, colar o PSD à direita; por outro, empurrar o Bloco para a extrema-esquerda. Falhou completamente no primeiro desses objectivos, de tal forma que nem entrou por esse caminho - tão repisado na sua primeira prestação frente a Paulo Portas - no frente-a-frente final com Manuela Ferreira Leite. Em contrapartida, marcou alguns pontos no seu debate com Francisco Louçã, quer pelos erros que este cometeu, quer por ter explorado bem algumas passagens do programa dos bloquistas. Não perdeu as eleições, sobretudo porque conseguiu manter praticamente até ao fim o seu novo registo de político que amansou o "animal feroz" que vive dentro dele, mas também não terá garantido a vitória num sufrágio em que, para já, segue à frente nas sondagens.Manuela Ferreira Leite parecia destinada a ser o patinho-feio dos debates, pois é a mais inexperiente e não tem a mesma facilidade com as palavras que alguns dos outros líderes. Mas conseguiu ir melhorando de debate em debate e nunca saiu do que muitos analistas e especialistas em marketing dizem ser um posicionamento impossível de sustentar: não concretizar as suas propostas. Ao fim de quatro combates não deixou que a encostassem à direita antipolíticas sociais (para o que contribuiu a separação de águas no debate com Paulo Portas) e insistiu sempre que não a ouviriam prometer o que não sabia se seria capaz de cumprir. Esta estratégia só colaria nalguém como ela. Resta saber se os portugueses preferem quem promete mais ou quem apenas diz que, dentro dos parâmetros do seu programa, fará o melhor que puder. As sondagens sobre o que os eleitores valorizam nos líderes ainda não permitem perceber para que lado cairá a vantagem quando se escolhe um primeiro-ministro.
Jerónimo de Sousa não surpreendeu verdadeiramente, mesmo que tenha mostrado menos agressividade do que nos comícios do PCP. Falou sempre para o seu eleitorado, o mais seguro e fiel, e ao manter sempre a serenidade ajudou a consolidar a ideia de que é um líder mais parecido com os cidadãos comuns do que os outros. Foi genuíno e não carregou nas tintas, não tendo nunca jogado ao ataque para ganhar, mas sabe que essa genuinidade lhe rendeu votos no passado e pode voltar a render a 27 de Setembro.
Paulo Portas sabia que nestes debates estava em jogo, mais uma vez, a sua sobrevivência política. Por isso foi combativo e mostrou continuar na posse de todas as suas faculdades num terreno que lhe é favorável, mesmo que não se possa dizer que tenha saboreado várias vitórias, pelo contrário. Logrou, contudo, fazer regressar a farda do "Paulinho das feiras", a sua versão mais populista, mas sem entrar demasiado em choque com a pose de antigo ministro da Defesa. Para quem quer fugir à última posição entre os cinco maiores partidos, aguentou bem a posição de onde partia.
Finalmente, Francisco Louçã deveria ter sido a estrela dos debates. Pelo menos era o que anteviam os mais habituados às suas prestações parlamentares. Não foi o que sucedeu. Teve claras dificuldades em vários duelos e deixou-se encostar à esquerda radical por mais de uma vez. Falando para um eleitorado descontente com os partidos do "centrão", não passou a mensagem de que poderá ajudar, de forma construtiva, a encontrar uma fórmula estável de governo. Talvez tenha sido o que mais perdeu ao fim dos seus quatro confrontos.
Ogora vem a campanha a sério. E a sensação de que haverá incerteza até que se contem os votos e se apure o último deputado. Ficou a democracia a ganhar com este formato de debates, apesar das suas inevitáveis limitações.