Grécia, alerta máximo
No meio de uma vergonhosa indiferença europeia, a Grécia aproxima-se perigosamente de uma explosão social e racial.
Nas ruas de Atenas, refugiados e imigrantes andam assustados. Baniram-nos, de facto, de bairros inteiros onde as milícias locais do partido neonazi Aurora Dourada organizam regularmente batidas racistas.
As declarações racistas, anti-semitas e negacionistas multiplicam-se, especialmente por parte de altos responsáveis políticos. O presidente do Comité de Direitos Humanos do parlamento comparou recentemente os imigrantes a baratas, perante a indiferença geral. O porta-voz da Aurora Dourada pôde citar a célebre frase anti-semita "Os Protocolos do Sábios de Sião" em pleno parlamento, sem que isso tivesse provocado quaisquer reacções condenatórias.
O primeiro-ministro Samaras persiste em proteger a presença no Conselho da Europa de Eleni Zaroulia, a neonazi que declarou recentemente que os imigrantes são "sub-humanos".
Os jornalistas que denunciam esta situação são alvo de constantes intimidações.
Face à ascensão do racismo, do anti-semitismo e do neonazismo, as instituições democráticas culposamente falham.
Primeiro a polícia, que apresenta um nível de corrupção recorde e uma ligação extremamente forte com o neonazismo: entre 30 a 50 por cento dos agentes votaram na Aurora Dourada, e são numerosos os que fazem parte deste partido. São incontáveis as vítimas de ataques racistas que, chegando ensanguentadas às esquadras, são forçadas a não prestar declarações. São ameaçadas, não socorridas.
Em seguida, a justiça: enquanto o número de declarações e actos racistas aumenta, nenhum procurador avança com processos nem se verificam quaisquer condenações, com a agravante de o racismo não ter sido uma só vez alvo de acusações judiciais desde 2008.
Esta ascensão do racismo explica-se igualmente pelo facto de, desde Maio, os neonazis não terem sofrido uma só derrota nos limites que lhes impõe a democracia, agindo com total impunidade.
Como mostra a recente criação de uma ramificação da Aurora Dourada em Itália, eles representam um exemplo para os movimentos e partidos neonazis na Europa, da Hungria à Letónia e da Dinamarca à Áustria. De facto, eles nunca deram sinais de abandonar o anti-semitismo como ideologia estruturante nem o racismo como discurso dominante, contrariamente aos que tentaram seguir uma estratégia de "desdiabolização". Eles combinam acção legal - a participação nas eleições - e acção ilegal - agressões físicas nas ruas - com eficiência. Graças à demissão dos democratas - com os partidos democratas gregos na primeira linha -, eles ganharam permissividade para as suas acções. Mantêm-se activos há meses, investidos de uma funesta sensação de poder absoluto.
A União Europeia, em especial a Alemanha, tem uma grande responsabilidade na ascensão do neonazismo na Grécia. E dois dogmas europeus contribuíram decisivamente para isso.
Primeiro, sob forte pressão alemã, o dogma da austeridade tem conduzido a uma situação social insustentável, onde não é oferecida à população, em particular à juventude, nenhuma outra saída para lá do empobrecedor horizonte do pagamento da dívida. Isto cria um contexto de decadência da sociedade e das suas estruturas sociais tradicionais, no qual os discursos que procuram bodes expiatórios e a pertença a um colectivo, mesmo racista, apresentam forte atracção, em particular entre os jovens.
Os cortes substanciais impostos pela troika nos orçamentos da segurança têm por resultado a falta de polícias para cobrirem todo o território, deixando bairros inteiros sob a alçada dos gangs da Aurora Dourada, que garantem a "segurança" aos que consideram "racialmente gregos". Este abandono do monopólio da força pelo Estado, condição fundamental para a existência do Estado de Direito, permitiu aos neonazis assegurarem grande parte do seu sucesso eleitoral.
Em segundo lugar, o dogma da "Europa fortaleza" estabeleceu a deslocalização de entradas e saídas do território europeu na fronteira entre a Turquia e a Grécia, impondo a esta última a incumbência de ser a principal porta de entrada dos refugiados e imigrantes na Europa. Este dogma resultou de uma vitória da extrema-direita, que conseguiu impor a rejeição de toda a imigração como paradigma ideológico, apesar de a Europa continuar, hoje, a precisar dessa mesma imigração. Isto criou uma situação insustentável para a Grécia, pois se o número de imigrantes e refugiados em trânsito é desejável pela Europa, ele torna-se impossível de gerir pela Grécia, sozinha e isolada do resto da Europa. Esta situação oferece à extrema-direita oportunidades para toda a espécie de instrumentalizações.
A posição da Alemanha é questionável. Ao mesmo tempo que o superego nacional, composto pelos sobreviventes da Shoah, vai desaparecendo aos poucos com os que restam, a Alemanha defende posições que empurram a Grécia, pai fundador da democracia europeia, para o colapso e a expulsão da zona euro, senão mesmo da Europa. Esta tentação ou tentativa de assassinato do pai à escala das nações europeias é alimentada por uma energia que, se viesse a ser usada para a expulsão ou colapso da Grécia, geraria incomensuráveis violências, das quais o ascenso do neonazismo é apenas um prenúncio.
Face a esta perspectiva, é urgente que os democratas se mobilizem por toda a Europa, já que a Grécia é hoje a linha da frente do grande e belo combate pela democracia. O projecto político recentemente coroado com o Nobel da Paz não recuperará de uma derrota dos democratas face aos seus irredutíveis inimigos, e cabe aos dirigentes políticos e às sociedades empenharem-se em fazer viver o sonho europeu de um continente verdadeiramente democrático porque liberto do racismo, do anti-semitismo e do neonazismo.
NOTA: No sábado, dia 15, às 15h, realiza-se em Atenas uma manifestação com este propósito, entre o parlamento e a Acrópole.