Ferreira Leite: “Teria imenso prazer em que Sócrates tivesse enfrentado a troika”
Antiga líder social-democrata insiste que o ritmo imposto pelo programa de ajuda externa está desajustado.
Manuela Ferreira Leite discursava na segunda-feira à noite numa sessão subordinada ao tema “O estado da Nação. Perspectivas?”, no âmbito das comemorações do 873.º aniversário da freguesia da Estela, Póvoa de Varzim, onde reiterou que a receita aplicada pela troika a Portugal “está errada” e os seus “resultados são desastrosos”.
“Eu se pudesse satisfazer um desejo, teria tido imenso prazer em que o Sócrates tivesse enfrentado a troika e ficar ele a tomar as medidas terríveis. Não mais falavam de camarote tanto quanto agora falam”, respondeu a antiga governante, quando lhe perguntaram se achava que o PSD se tinha precipitado aquando do chumbo do PEC 4.
Na opinião da ex-ministra das Finanças, “o Fundo Monetário Internacional (FMI) não tinha a mínima experiência de intervenções nos países” da natureza de Portugal, uma vez que em países com moeda única “nunca tinham feito nada”. “Eu penso que neste momento ninguém tem dúvidas, até aqueles próprios que ditaram a receita, de que a receita está errada porque os resultados são desastrosos”, defendeu.
Considerando que “o ritmo” imposto para as medidas é desajustado, Manuela Ferreira Leite defendeu que “em recessão, não é possível fazer-se consolidação orçamental” e, portanto, “querer ajustar contas públicas em recessão é uma impossibilidade”. Para a ex-deputada social-democrata, “o quadro de correcção, ou bem que é amenizado o seu ritmo, ou então não tem correcção possível”. “Vamo-nos afundando cada vez mais, pensando que estamos a corrigir”, alertou, acrescentando que “se não houver crescimento, isto não é corrigível”.
Ainda assim, Ferreira Leite disse ver “com bons olhos” o facto da palavra “crescimento” ter entrado “no léxico político”, salientando a importância de “estar na boca das próprias instituições” que impuseram o modelo que Portugal está a cumprir. Sobre uma questão relativa ao aumento do IVA na restauração, a ex-líder do PSD disse considerar este tema “um mistério”. “É um mistério, porque penso que o objectivo básico de qualquer instituição ou qualquer decisor, quando aumenta os impostos, é para obter mais receita. Quando se lançam impostos cuja receita cai, como é claramente este imposto e como foi claramente anunciado que seguramente ia acontecer, eu só posso dizer que é um mistério”, justificou.
Para Ferreira Leite, esta é uma “medida absolutamente negativa do ponto de vista de resultados” e “qualquer tomada de decisão que não tenha adesão à realidade, é sempre errada e deve ser considerada como tal e alterada”. “Considero quase impossível que ela não venha a ser alterada. Se não for, então nessa altura temos que a qualificar de outra forma, que eu neste momento me dispenso de fazer”, observou.