Ucrânia vota nas eleições locais, mas o Governo treme
Se os partidos da coligação governamental tiveram resultados tão maus como se admite, às eleições municipais deve seguir-se uma remodelação governamental.
Os ucranianos elegem neste domingo os seus presidentes de câmara e vereadores numas eleições locais que são um teste ao presidente pró-Ocidente Petro Poroshenko, que está em queda devido à sua gestão do conflito armado com o Leste separatista pró-russo e com ausência das prometidas reformas.
As eleições não vão decorrer nos territórios controlados pelos rebeldes, na zona de conflito onde mais de 8000 pessoas foram mortas nos últimos 18 meses. Desde Setembro, já quase não há combates, mas o processo de paz permanece num estado embrionário.
Se uns criticam o Presidente ucraniano por não cumprir a promessa de pôr fim à guerra “três meses após” a sua eleição, em Maio de 2014, outros consideram que fez concessões humilhantes aos separatistas, apoiados pelo Kremlin.
Os representantes do antigo regime do Presidente pró-russo Viktor Ianukovitch, deposto em Fevereiro de 2014, após três meses de contestação na rua dos partidários de uma aproximação à União Europeia, reprimida de forma sangrenta, podem obter bons resultados em regiões de maioria russófona, como Karkhiv e Dnipropetrovsk, próximas da zona de conflito, bem como em Odessa, nas margens do mar Negro, dizem os analistas.
“Temos necessidade de uma coligação internacional para apoiar a Ucrânia, mas ainda mais de uma coligação interna que torne impossível o plano de Putin de destruir a Ucrânia a partir do interior”, afirmou Poroshenko. O objectivo destas eleições locais é criar “uma coligação pró-ucraniana em cada cidade, em cada aldeia”.
Sinal de que os desafios vão para além da recolha de lixos e outros problemas municipais, a maior parte dos 132 partidos que concorrem prometem alterações que têm a ver com competências do Governo e do Parlamento, como aumento das reformas, baixa do preço do gás e da electricidade e até mesmo adesão à NATO.
A oposição pró-russa mas também o partido Batkivshchina da ex-primeira-ministra Iulia Timoshenko, que faz parte da coligação governamental, apostam na desilusão dos ucranianos atingidos em cheio pela crise económica. E as suas palavras de ordem parecem cair em terreno fértil.
A coligação governamental que obteve 70% dos votos nas últimas legislativas, há um ano, tem hoje 45 das intenções de voto, e o seu núcleo – o Bloco Petro Poroshenko e a Frente Popular, do primeiro Arseni Iatseniuk –21%. Segundo uma sondagem recente, 71% dos eleitores não aprovam o desempenho do Presidente, eleito com 54,7% dos votos há menos de dois anos. O partido de Iatseniuk tem agora menos de 2% das intenções de voto e não participa nas eleições locais.
Para Anatoli Oktissiuk, analista do Centro Internacional de Estudos Políticos em Kiev, às eleições municipais vai seguir-se “uma remodelação governamental.”
Se os membros do Batkivshchina, de Timoshenko, ou do Samopomitch, do presidente da câmara de Lviv, Andrii Sadovi, obtiverem “resultados espectaculares”, isso poderá levar “à erosão da coligação e a mudanças nos ministérios”, e até “provocar eleições antecipadas”, afirma um outro analista ucraniano, Vadim Karassev.
Os especialistas alertam também para a possibilidade de bons resultados do Bloco da Oposição – o herdeiro do Partido das Regiões de Ianukovitch – no Sudeste, onde o poder “não apresenta nem candidatos fortes nem uma política eficaz”, diz Oktissiouk. “Depois destas eleições, alguns municípios podem escapar ao controlo do Governo.”
Em Karkhiv, uma grande cidade industrial de cerca de 1,5 milhões de habitantes, que faz fronteira com o Leste rebelde, o presidente de câmara cessante, o controverso Guennadi Kernes, um ex-aliado de Ianukovitch, processado por prender e torturar manifestantes, tem todas as hipóteses de ser reeleito.
Em Odessa, a disputa é entre o presidente da câmara, Guennadi Troukhanov, que apoiou os protestos pró-russos, e Sacha Borovik, um alemão de origem ucraniana formado em Harvad e ex-jurista da Microsoft que obteve recentemente a nacionalidade ucraniana. Apoiado por Poroshenko e pelo governador da região, o ex-Presidente reformador da Geórgia Mikheil Saakachvili, Troukhanov foi ministro da Economia durante um breve período. Mas deixou o Governo, denunciando a sua incompetência.