Ianukovitch aceita demissão do primeiro-ministro e do Governo ucranianos
Presidente da Ucrânia aceita revogar leis repressivas contra manifestantes. Sessão parlamentar desta terça-feira é determinante para o futuro próximo do país.
Ianukovitch aceitou a demissão do primeiro-ministro e de todo o executivo ao início da tarde, segundo a agência Interfax-Ucrânia. O Governo de Azarov irá permanecer em funções até ser designado um novo gabinete, acrescenta a agência, que cita o site da presidência.
“Tomei a decisão pessoal de solicitar ao Presidente da Ucrânia que aceite a minha demissão do cargo de primeiro-ministro, com o objectivo de criar condições para um compromisso político para resolver o conflito pacificamente”, afirmou na manhã de terça-feira Azarov, chefe do Governo desde 2010. “Hoje, o mais importante é preservar a unidade e a integridade da Ucrânia. Isto é muito mais importante do que qualquer plano ou ambição pessoal. Por isto, tomei esta decisão.”
A demissão do Governo e a revogação das leis que restringiam as manifestações representam as primeiras cedências concretas face às reivindicações que mobilizam centenas de milhares de pessoas há mais de dois meses em Kiev e que alastraram a outras zonas do país. O Parlamento deverá também discutir a concessão de amnistia para os manifestantes presos durante os protestos.
É improvável, todavia, que a marcação de eleições presidenciais antecipadas – um dos pontos fortes na agenda da oposição a Ianukovitch – seja votada na sessão desta terça-feira, ou até mesmo discutida, havendo a possibilidade de os protestos continuarem.
O cargo de primeiro-ministro tinha sido oferecido no fim-de-semana por Ianukovitch ao dirigente oposicionista Arseni Iatseniuk, que rejeitou a proposta. Iatseniuk, que lidera o partido fundado pela ex-primeira-ministra Iulia Timochenko, recusou-se a comentar a demissão de Azarov enquanto não houver um decreto presidencial.
O vice-primeiro-ministro, Serhi Arbuzov, irá ocupar o cargo de chefe do executivo interino, de acordo com o assessor de imprensa de Azarov, Vitali Lukianenko, em declarações à Interfax.
Para a oposição, o afastamento de Azarov é "um passo para a vitória", dando a entender que não é apenas a demissão do Governo que procuram. "O que se tem passado nas ruas há vários meses é também consequência da política do actual Governo", afirmou o líder do Udar, Vitali Klitschko, citado pela AFP. "Isto não é uma vitória, mas sim um passo para a vitória", acrescentou.
O novo primeiro-ministro deverá ser alguém "com uma visão ampla do mundo", afirmou a deputada do Partido das Regiões Hanna Herman. "Oferecemos a liderança do Governo à oposição, queríamos que fosse um governo de coligação, mas a oposição não estava preparada ou com vontade para isso", acrescentou em declarações ao Kyiv Post.
A demissão foi anunciada horas depois de Ianukovitch e os líderes da oposição parlamentar terem chegado a um acordo que prevê a revogação de leis repressivas contra manifestantes aprovadas há duas semanas e que levaram a uma radicalização violenta dos protestos contra o Governo.
“Foi tomada a decisão política de revogar as leis adoptadas a 16 de Janeiro que geraram numerosas discussões. Mas as leis que não suscitaram críticas serão adoptadas amanhã [terça-feira] de novo pelo Parlamento”, disse a ministra da Justiça, Olena Lukash.
Leis polémicas revogadas
A maioria das leis antiprotesto foram revogadas pelos deputados ucranianos durante a sessão desta terça-feira. A agência Interfax cita o líder do partido Svoboda (Liberdade), Oleg Tiahnibok, que afirma que "nove das 12 leis" foram anuladas. A decisão teve os votos favoráveis de 361 deputados e apenas dois contra, num total de 412 presentes, e foi recebida com aplausos, segundo a AFP.
Um comunicado divulgado na segunda-feira à noite pela presidência após negociações que Viktor Ianukovitch manteve com os líderes dos três maiores partidos da oposição dá também conta de um acordo sobre uma amnistia para manifestantes presos. Mas o Presidente fez depender a amnista da desocupação de edifícios públicos e ruas. Também essa proposta deverá ser discutida pelos deputados.
As decisões foram saudadas pelas diplomacias europeias, que as encaram como uma oportunidade para se continuar a resolver a crise no campo político.
O ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Frank-Walter Steinmeier, espera que "com a demissão do primeiro-ministro os dirigentes da Ucrânia dêem um sinal à oposição de que vão organizar novas discussões" e que se encontre um "compromisso político".
O chefe da diplomacia francesa, Laurent Fabius, afirmou que "a França saúda a revogação, pelo Parlamento ucraniano, das leis que restringiam de forma inaceitável as liberdades públicas". "Essa decisão, bem como o anúncio do primeiro-ministro da sua demissão, deve reabrir a via do diálogo", acrescentou, citado pela AFP.
Na véspera, o vice-presidente norte-americano, Joe Biden, tinha apelado a Ianukovitch que anulasse as leis de restrição às manifestações.
Presidente e oposição concordaram ainda, segundo o enviado do jornal El País, sobre a necessidade de uma reforma da Constituição que limite os poderes do chefe do Estado, a favor do Parlamento.
Manifestantes continuam a ocupar a praça central de Kiev e edifícios públicos em diversas cidades e têm anunciado a intenção de só os abandonar quando Inaukovitch se demitir. A hipótese de ser instaurado o estado de emergência, que chegou a ser admitida pela ministra da Justiça, após a ocupação do ministério que dirige, na madrugada de segunda-feira, não se confirmou.
A crise política na Ucrânia começou após o anúncio pelo Governo de que não assinaria um acordo que previa o reforço de laços com a União Europeia. A opção foi uma maior aproximação à Rússia.
A chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton, deverá chegar esta terça-feira à noite a Kiev, 48 horas antes do previsto. Ashton partirá para a Ucrânia após um encontro com o Presidente russo, Vladimir Putin, em Bruxelas, e passará o dia de quarta-feira na capital ucraniana, em encontros com Ianukovitch e com os principais líderes da oposição.
Notícia actualizada às 14:55 – Informação sobre demissão do Governo e reacções da Alemanha e da França.