Letta pede aos políticos para aproveitarem "a última oportunidade"

Se as reformas do Estado não avançarem nos próximos 18 meses, o novo primeiro-ministro deixará o Governo.

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Letta e Angelino Alfano, do Povo da Liberdade, de Berlusconi, número dois do novo governo Andreas Solaro/AFP

Letta precisava de 303 votos, obteve 453 (houve 153 votos contra), ou seja, o apoio de todos os partidos que aceitaram integrar o seu executivo. Para além do seu Partido Democrático, a direita do Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi, e a Escolha Cívica, o conjunto de grupos de centro formado em redor do até agora primeiro-ministro, Mario Monti.

A Liga Norte (direita secessionista e xenófoba) absteve-se. Contra votou o Movimento 5 Estrelas, de Beppe Grillo, o único grande grupo parlamentar que fica na oposição. Terça-feira de manhã será altura do voto no Senado, mas também aí o apoio está garantido.

O desemprego é a “grande tragédia dos nossos tempos” e o “trabalho” a “primeira prioridade” do novo Governo italiano, afirmou Letta no seu discurso à Câmara dos Deputados. “Só com o trabalho se pode sair deste pesadelo do empobrecimento”, afirmou Letta, antes de propor algumas medidas de incentivo à contratação. “A Itália morre só com austeridade. As políticas de crescimento não podem esperar mais”, disse o político do PD.

A segunda prioridade são os jovens, em simultâneo um dos dois grandes recursos com que o país conta. “Não partimos do zero. Partimos de dois grandes recursos. Os jovens e a própria Itália, a beleza do território”, um país “admirado por todos”. "Não podem existir gerações perdidas. Só os jovens podem reconstruir este país."

Num longo discurso, o primeiro-ministro escolhido pelo Presidente, Giorgio Napolitano, depois de Pier Luigi Bersani, líder do PD, não ter conseguido reunir apoios para governar, admitiu que o seu executivo de coligação é “uma situação excepcional”, justificada com “o resultado excepcional das legislativas”, onde nenhum partido conseguiu a maioria no Senado, com “a excepcionalidade” da crise e com a excepcionalidade de um momento “em que é preciso reescrever algumas normas constitucionais”.

O apelo é que os partidos aproveitem a excepcionalidade para "inaugurar uma nova fase da República" e evitar "o canto do cisne". "A verdade é que a política cometeu muitos erros", disse, evocando "a obsessão do consenso que bloqueou o país". "Temos uma última oportunidade."

A Itália está bloqueada e para relançar o futuro são precisas muitas reformas. É preciso reformular o Parlamento, para que “uma só câmara dê a confiança ao governo e uma segunda, o Senado, tenha competências diferenciadas”. E é preciso “que nunca mais os italianos sejam chamados a votar com a actual lei eleitoral”. Letta defendeu ainda uma “revolução” no financiamento público dos partidos.

“O único desfecho possível é o sucesso”, sublinhou. Por isso, quer que a convenção constitucional, grupo que terá a cargo a reformulação do funcionamento do Estado, comece já a trabalhar, e não vai ficar muito tempo à espera dos resultados. “Daqui a 18 meses, verificarei se as reformas chegam a bom porto. Se, pelo contrário, vir que são travadas, tirarei as consequências”, assegurou.

Também é preciso restituir a credibilidade à política e para o fazer “é preciso recuperar a decência, a sobriedade, os escrúpulos, e a banalidade de uma gestão de bom pai de família”, declarou Letta.

“Europeu e europeísta”, assim será o seu Governo, disse ainda, anunciando que daqui a dias partirá para um périplo com paragens em Bruxelas, Berlim e Paris. Mas ser europeu é saber que a União Europeia atravessa “uma crise de legitimidade e no momento em que os seus cidadãos mais precisam dela”. A Europa deve fazer um esforço “para ser um motor de desenvolvimento durável”, mas também “avançar para uma maior integração que conduza a uma Europa federal”.

Como já se esperava, Letta anunciou a suspensão de um polémico imposto sobre a primeira propriedade, cuja devolução Silvio Berlusconi prometeu durante a campanha – para já, o pagamento será suspenso em Junho, enquanto o imposto é reformulado.

Letta quis fazer um arranque simbólico, antecipando que “o primeiro acto do Governo será a supressão dos salários dos ministros que são igualmente parlamentares”, e que até agora eram acumulados pelos políticos.
 
 
 
 

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