Juízes chilenos pedem desculpa por "acções e omissões" na ditadura de Pinochet
Associação de magistrados admite que o poder judicial falhou "na sua tarefa essencial", mas o porta-voz do Supremo Tribunal rejeita pedir perdão.
"O poder judicial e, em especial, o Supremo Tribunal da época claudicaram na sua tarefa essencial de tutelar os direitos fundamentais e proteger as vítimas do abuso estatal", lê-se num comunicado da Associação de Magistrados do Poder Judicial, citado pelo jornal La Nación.
É um pedido de desculpas incondicional: "Sem ambiguidades nem equívocos, chegou a hora de pedir perdão às vítimas, aos seus familiares e à sociedade chilena", declaram os magistrados do país.
"O poder judicial podia e devia ter feito muito mais" durante a ditadura militar e "incorreu em acções e omissões impróprias das suas funções, ao ter-se negado, salvo raras mas valiosas excepções, a proteger quem pediu a sua protecção", dizem ainda os magistrados chilenos.
No mesmo comunicado, a associação pede que o Supremo Tribunal reflicta sobre os actos passados e que tome também uma posição: "Temos a esperança de que o actual Supremo Tribunal, cujo papel tutelar dos direitos fundamentais ficou demonstrado no actual exercício das suas funções, dê ouvidos à sentida solicitação dos juízes que aspiram a distanciar-se de um passado obscuro que receberam involuntariamente como herança."
Porta-voz do Supremo afasta pedido de desculpas
O apelo lançado pela Associação de Magistrados do Poder Judicial já teve resposta do porta-voz do Supremo, Hugo Dolmetsch, embora a título pessoal. "O pedido de perdão é algo íntimo, quando se sente algum grau de responsabilidade. Acho que todos têm um grau de responsabilidade, mas não sei se estarei no grupo dos que devem pedir perdão", disse o representante do Supremo Tribunal chileno.
Numa entrevista à CNN do Chile, Hugo Dolmetsch recusou-se a falar em nome do Supremo, mas afirmou que "terá de sair alguma determinação" sobre um eventual pedido de perdão. "Um sim ou um não, mas algo terá de sair", afirmou.
Dolmetsch, que trabalhou no sistema judicial durante os anos da ditadura militar, admitiu que "podia ter feito mais". Mas "a situação era de uma gravidade tremenda. Eu era advogado, mas não creio que estivesse obrigado a assumir uma atitude de liderança nesta matéria. Ninguém é obrigado a cometer suicídio. Não necessariamente um suicídio porque alguém o vai matar, mas pode ser um suicídio do ponto de vista laboral", afirmou.
O responsável justificou mesmo o comportamento do Supremo durante a ditadura militar que colocou no poder Augusto Pinochet, depois do golpe que derrubou Salvador Allende em 1973.
Para o actual porta-voz do Supremo, o poder judicial apoiou o golpe de Estado militar para "manter a independência". "Foi um erro? Perante as circunstâncias foi correcto, de outro modo poderia haver uma ditadura absoluta. Assim, o poder judicial continuou a funcionar de forma independente", defendeu.