Milhares enfrentam “agressões, subornos e extorsões” na rota migratória dos Balcãs
Relatório da Amnistia Internacional revela abusos contra migrantes, por parte das autoridades da Hungria, Macedónia e Sérvia. Rejeitados por estes países, milhares ficam num “limbo legal”.
A Amnistia Internacional publicou esta terça-feira um relatório no qual expõe as violações de direitos humanos dos imigrantes que atravessam os Balcãs, em busca da segurança da Europa. O documento acusa as autoridades da Hungria, da Macedónia e da Sérvia de tratamentos humilhantes e agressões aos migrantes e atribui a responsabilidade desta situação à União Europeia (UE) e ao falhanço da sua política migratória.
Embora não seja tão mortífera como as três rotas marítimas do Mediterrâneo (ocidental, central e oriental), a rota ocidental dos Balcãs é já a “passagem irregular mais movimentada rumo à UE” e, seguramente, uma das mais perigosas. Os migrantes e refugiados chegam à Europa oriental por mar, através da Grécia, mas rapidamente fogem por lhes ser barrada a possibilidade de pedir asilo. Por isso, partem para a Macedónia e para a Sérvia. Face às dificuldades de obter asilo também aí, viajam rumo à Hungria.
O novo relatório da Amnistia, intitulado Europe’s Borderlands: Violations against refugees and migrants in Macedonia, Serbia and Hungary (Fronteiras da Europa: Violações contra os refugiados e migrantes na Macedónia, Sérvia e Hungria), realiza um levantamento das condições precárias dos imigrantes que percorrem a referida rota balcânica.
O documento baseou-se em quatro missões de investigação e mais de 100 entrevistas a migrantes, em quatro países: Grécia, Hungria, Macedónia e Sérvia. Também foram recolhidos testemunhos de autoridades governamentais dos países em questão, assim como da Agência das Nações Unidas para os Refugiados.
Segundo as informações recolhidas pela organização, mais de 21 mil seguiram pela rota ocidental dos Balcãs, em 2014.
Violência na Sérvia e na Macedónia
“Agressões, subornos e extorsões”, é o que a polícia fronteiriça destes países tem para oferecer a quem chega, acusa a Amnistia. Grande parte dos migrantes, vindos maioritariamente da Síria, pede asilo na Macedónia e na Sérvia, mas a lentidão dos processos e a falta de vontade em recebê-los, torna-os vulneráveis aos abusos das autoridades, dos gangues e dos traficantes.
Segundo relatou uma testemunha à Amnistia, há elementos da polícia fronteiriça da Sérvia que pedem 100 euros por pessoa, sob ameaça de deportação. Um outro entrevistado fala em “agressões aleatórias”, a homens, crianças e até a “uma mulher grávida”, nos centros de detenção e acolhimento sobrelotados. Há ainda quem seja “atacado por gangues” locais, como forma de os assustar e os fazer fugir do país.
“A Sérvia e a Macedónia têm de fazer muito mais pelos (…) migrantes e refugiados”, refere Gauri van Gulik, vice-directora da Amnistia Internacional para a Europa e a Ásia Central, no relatório, acusando os dois países de “violações graves de direitos humanos”.
O relatório informa que, no ano de 2014, apenas uma pessoa conseguiu obter asilo na Sérvia e somente 10 viram ser-lhes concedidos o estatuto de refugiados na Macedónia.
Rejeição húngara
Muitos são os que, passando pela Sérvia e Macedónia, se dirigem para Hungria e para a UE. Mas também aí as autoridades desconfiam de quem chega, como o demonstram as recentes posições do Primeiro-ministro, Viktor Orbán e a pretensão do Governo de construir um muro que impeça a entrada de imigrantes ilegais na Hungria.
Em 2014, 240 pessoas obtiveram asilo na Hungria, mas a grande maioria, diz a Amnistia, é deportada de volta para a Sérvia e para a Macedónia, onde se inicia um ciclo vicioso, pois as pessoas ficam numa situação de “limbo legal”, passando a ser constantemente transferidas de centro de acolhimento em centro de acolhimento. E voltam as agressões e as humilhações e as tentativas de entrar, de novo, na Hungria. Há quem tenha sido deportado “mais de 10 vezes”. Van Gulik fala em milhares de refugiados “encurralados na ‘terra de ninguém’ dos Balcãs”.
“Os refugiados, fugidos da guerra e da perseguição, fazem esta viagem pelos Balcãs na esperança de encontrar segurança na Europa (…) para ficarem à mercê de sistemas de asilo falhados” diz Van Gulik, no relatório, responsabilizando a política migratória da UE pela situação de terror vivida nos Balcãs.
A Amnistia critica ainda a falta de vontade da UE em “dar prioridade à melhoria do sistema de asilo dos países ao longo da rota balcânica”, uma vez que, diz a organização, preferiu “investir fortemente no controlo fronteiriço”.
Texto editado por Joana Amado