Erdogan admite bloquear YouTube e Facebook na Turquia

Medida, que pode ser adoptada depois das municipais de dia 30, seria resposta à divulgação de alegadas escutas comprometedoras para o primeiro-ministro turco.

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Erdogan está há meses no centro de um escândalo de corrupção que ameaça o seu Governo Umit Bektas/Reuters

“Estamos determinados sobre este assunto. Não vamos deixar a nação à mercê do YouTube e do Facebook”, disse Erdogan numa entrevista, na quinta-feira à noite, à televisão turca ATV, acrescentando que o Governo “adoptará as medidas necessárias da forma mais forte possível após 30 de Março”, a data das eleições. Questionado sobre se o bloqueio aos dois serviços faz parte do pacote de medidas, o primeiro-ministro respondeu: “Está incluído”.

A ameaça surge horas depois de ter sido divulgado no YouTube o último de uma série de registos áudio com o que se pensa ser a voz do primeiro-ministro. Neste caso, um homem identificado como sendo Erdogan sugere ao proprietário do jornal Milliyet que despeça dois jornalistas que assinaram uma notícia sobre as conversações secretas entre o Governo e a guerrilha curda do PKK.  

Nenhuma das conversas divulgadas nas últimas duas semanas foram autentificadas e o primeiro-ministro insiste que se trata de “montagens imorais”, que fazem parte de um plano dos seus inimigos políticos para derrubar o Governo e desestabilizar a Turquia.

Mas a sombra da dúvida paira desde que foi posta a circular a primeira gravação, em que uma voz identificada como sendo a de Erdogan instruía o seu filho Bilal a fazer desaparecer dinheiro armazenado em várias casas. As conversas teriam sido gravadas entre os dias 17 e 18 de Dezembro, precisamente quando a polícia efectuava dezenas de buscas no âmbito de uma mega-investigação a suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais que levou à detenção de dezenas de figuras próximas do AKP, o partido pró-islamista há mais de uma década no poder, e à demissão de três ministros.

Erdogan fala em "conspiração"
Tal como agora, Erdogan fala em “conspiração” e diz que tudo não passa de um plano para o derrubar. O responsável por essa maquinação, alega, é Fethullah Gülen, o influente imã que lidera uma rede global de escolas e instituições de caridade, e que foi o seu principal aliado durante anos, tendo colocado muitos seguidores em altos cargos das forças de segurança e do poder judicial.

A ruptura aconteceu no ano passado, tornando-se visível a partir do momento em que o Governo decidiu encerrar as escolas de preparação pré-universitária, que são uma das principais fontes de receita da organização de Gülen, radicado nos Estados Unidos. Desde então, a cúpula da polícia foi decapitada, o Governo aprovou uma nova lei de Internet (que permite à entidade de supervisão das comunicações bloquear, sem mandado judicial, conteúdos online), reforçou o controlo sobre o sistema judicial (dando ao ministro da Justiça o poder de nomear magistrados) e reforçou os poderes dos serviços secretos.

Estas medidas foram repudiadas pela oposição e reacenderam os protestos nas ruas dos que, tal como no Verão passado, rejeitam o crescente autoritarismo do primeiro-ministro. Erdogan insiste que são legítimas e necessárias para conter os que, na sombra, atentam contra o Estado – no mesmo dia em que as gravações começaram a ser divulgadas no YouTube, jornais próximos do Governo acusavam os magistrados de escutas ilegais.

A guerra entre os antigos aliados só pode aumentar com a aproximação das eleições locais, o primeiro teste a Erdogan desde que o escândalo rebentou, que servirá também como barómetro à ambição de ser eleito Presidente, na votação prevista para o Verão. Erdogan já avisou que poderá abandonar a política se o AKP não vencer as eleições e, na entrevista à ATV, não excluiu a hipótese de pedir à Interpol que emita um alerta para a detenção de Gülen, a fim de enfrentar a justiça na Turquia: “Não vejo por que não”.

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