David Cameron descarta boicote aos Jogos Olímpicos de Inverno na Rússia
Primeiro-ministro britânico condena "preconceito" e "abusos" por causa de lei antigay, mas diz que a melhor resposta é participar.
Em resposta a uma carta aberta publicada na quinta-feira pelo actor e comediante britânico Stephen Fry, David Cameron assinou neste sábado duas mensagens no Twitter – uma em que agradece o envolvimento de Fry no assunto e outra em que revela a sua posição oficial sobre a participação de atletas britânicos nos Jogos de Sochi 2014.
"Obrigado pela sua mensagem, Stephen Fry. Partilho da sua profunda preocupação pelos abusos cometidos contra gays na Rússia", escreveu o primeiro-ministro britânico. "No entanto, acredito que podemos desafiar mais o preconceito se aparecermos do que se boicotarmos os Jogos Olímpicos de Inverno", concluiu.
A reacção de David Cameron surge poucas horas depois de o Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ter afastado a hipótese de apelar a um boicote aos Jogos de Inverno, marcados para Fevereiro de 2014.
"Quero deixar isto bem claro. Não acho que seja apropriado boicotar os Jogos Olímpicos", afirmou Obama, numa conferência de imprensa dominada pelos programas de espionagem e pelas relações com a Rússia.
"Ainda esta semana critiquei isso [a aprovação de leis antigay], não apenas em relação à Rússia, mas a muitos outros países com quem continuamos a trabalhar, mas com quem mantemos um forte desacordo sobre este tema", disse o Presidente dos Estados Unidos, referindo-se à sua participação no programa The Tonight Show, do apresentador Jay Leno.
Para concluir, Obama formulou um desejo: "Ninguém se ofende mais do que eu com as leis antigay. Só espero que atletas gay e lésbicas tragam para casa medalhas de ouro e de prata", disse o Presidente dos Estados Unidos.
Na quinta-feira, o actor britânico Stephen Fry apelou ao primeiro-ministro britânico que boicote os Jogos de Inverno na Rússia e ao Comité Olímpico Internacional (COI) que retire a organização à cidade de Sochi, comparando a Rússia de Putin à Alemanha de Hitler.
"Escrevo com a sincera esperança de que todos os que amam o desporto e o espírito olímpico reflictam sobre a mancha que caiu sobre os cinco anéis nos Jogos de Berlim de 1936, que se realizaram sob a égide de um tirano que tinha aprovado uma lei, dois anos antes, que levou à perseguição de uma minoria cujo único crime foi o acaso do seu nascimento", começa a carta escrita por Stephen Fry, publicada no Tumblr.
Depois da perseguição e extermínio de judeus na Alemanha nazi, nas décadas de 1930 e 1940, o actor considera que a Rússia de Vladimir Putin ameaça tornar-se num caso semelhante, desta vez em relação aos homossexuais. "Putin está assustadoramente a repetir este crime demente com russos LGBT [sigla para lésbica, gay, bissexual e trangénero]. Espancamentos, assassinatos e humilhações são ignorados pela polícia. Qualquer defesa ou discussão sensata sobre homossexualidade é contrária à lei", denuncia o actor e comediante.
Na sexta-feira, o COI anunciou que pediu esclarecimentos adicionais ao Governo russo sobre a lei. Mas as dúvidas do comité, manifestadas pelo seu presidente, Jacques Rogge, não se tratam de "um assunto fundamental", mas de "uma questão de tradução". "Há dois parágrafos que queremos garantir que estão bem traduzidos antes de podermos fazer um comentário geral", disse o responsável no final de uma reunião entre o comité executivo do COI e a Federação Internacional de Atletismo, em Moscovo.
Segundo uma lei aprovada em Junho, qualquer manifestação pública – sessões de esclarecimento, marchas, protestos, passear de mãos dadas, beijos – entre pessoas do mesmo sexo, quando na presença de menores de 18 anos, é considerada "propaganda da sexualidade não tradicional". As multas variam entre 5000 rublos (114 euros) e um milhão de rublos (23 mil euros), conforme se trate de indivíduos ou colectividades. Os cidadãos estrangeiros serão multados, ou detidos durante 15 dias, e deportados.
Em 1980, o então Presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, decretou um boicote aos Jogos Olímpicos de Moscovo, em protesto contra a invasão do Afeganistão pelas tropas soviéticas. Quatro anos depois, o Governo de Konstantin Chernenko decidiu boicotar os Jogos Olímpicos de Los Angeles, alegando receios pela segurança dos seus atletas.<_o3a_p>