Coreia do Norte reconhece utilização de campos de trabalho
Responsáveis norte-coreanos recusam as críticas que apontam para a prática de crimes sobre os prisioneiros.
Choe Myong Nam, representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros junto da ONU, falava com alguns jornalistas nesta terça-feira sobre as conclusões de um relatório publicado em Fevereiro em que são descritos crimes contra a humanidade perpetrados pelo Estado norte-coreano.
“Tanto na lei como na prática temos reeducação através de campos de trabalho, não são centros de detenção”, disse o diplomata, esclarecendo que nestes campos “as pessoas são melhoradas através da sua mentalidade e reflectem sobre os seus erros”.
Ao reconhecimento da existência de campos de “reeducação” junta-se a confirmação de uma reunião recente em Bruxelas entre o representante especial para os Direitos Humanos da União Europeia, Stavros Lambrinidis, e um dirigente do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte.
A abertura, pelo menos, quanto à necessidade de haver um diálogo sobre o estado dos direitos humanos na Coreia do Norte é vista como um passo importante pelo director executivo do Comité para os Direitos Humanos na Coreia do Norte, Greg Scarlatoiu. “Apesar de o registo norte-coreano em termos de direitos humanos ser terrível, é muito importante que dirigentes de topo norte-coreanos estejam agora a falar sobre direitos humanos e expressem pelo menos um interesse no diálogo”, disse à AP o chefe desta ONG sediada em Washington.
No relatório publicado em Fevereiro, que tem por base entrevistas a antigos prisioneiros, o Conselho de Direitos Humanos da ONU faz referência a crimes de tortura, escravatura, maus tratos e execuções sobre os prisioneiros nos campos de trabalho. A conclusão é que “centenas de milhares de prisioneiros políticos morreram nestes campos nas últimas cinco décadas”.
Não se sabe ao certo o número actual de prisioneiros, mas a maioria das estimativas aponta para entre 120 mil e 200 mil.
Os autores do relatório recomendam que os responsáveis pelos crimes sejam levados perante o Tribunal Penal Internacional. Em Setembro, Pyongyang publicou uma resposta à ONU em que criticava “as forças hostis que insistem persistentemente na ‘questão dos direitos humanos’ na RDCN [República Democrática Popular da Coreia] numa tentativa de danificar a sua imagem e de derrubar o sistema social e a ideologia escolhidos pelo povo coreano”.
Michael Kirby, um dos autores do relatório da ONU, considerou que a disponibilidade da Coreia do Norte para discutir os direitos humanos e a reabertura do diálogo com Seul se trata de uma “ofensiva de charme”. “Sendo realista, não me parece que tenha havido uma conversão súbita, mas o que quer que traga respeito pelos direitos humanos será algo bom”, disse Kirby à BBC.
Aos jornalistas, Choe Myong Nam descreveu a Coreia do Norte como uma “sociedade de transição”, pelo que “pode haver alguns problemas, por exemplo na economia e noutras áreas”, cuja culpa reside na acção de “forças exteriores”. Com o desenvolvimento do país, “a alegria do povo será aumentada”, concluiu Choe.
Outra das questões colocadas ao dirigente foi a ausência recente do líder norte-coreano, Kim Jong-un, que não é visto publicamente desde 3 de Setembro, mas não houve qualquer resposta. O afastamento de Kim – que não esteve presente, por exemplo, na recepção aos atletas que participaram nos Jogos Asiáticos – tem levado a especulações de que o líder esteja com problemas de saúde.