Bombardeamento mata pelo menos 45 civis em campo de deslocados no Iémen

A segunda maior cidade do país, Áden, está isolada pelos combates entre as forças huthis e os aliados do Presidente Hadi, apoiados pelos ataques aéreos da coligação liderada pela Arábia Saudita.

Foto
Habitantes de Áden preparam-se para fugir da cidade, no Sul do Iémen Saleh al-Obeidi/AFP

O ministro dos Negócios Estrangeiros iemenita, Riyadh Yaseen, acusou os huthis do ataque – segundo esta versão, terão sido disparos de artilharia e não da Força Aérea. Os sauditas não fizeram quaisquer comentários sobre este raide. Yaseen, como o Presidente Abd Mansour Hadi, está em Riad, a capital da Arábia Saudita que recebeu parte do Governo em fuga do seu último bastião, Áden, segunda maior cidade do Iémen e mais importante porto do país, onde os huthis tentam entrar desde a semana passada.

Contrariando as acusações do ministro iemenita, membros de diferentes ONG disseram que os raides atingiram não só civis refugiados em Mazraq mas também um camião cheio de combatentes huthis que se encontrava à entrada do campo, situado a menos de dez quilómetros de uma base militar. A tribo huthi, que o ano passado começou os seus avanços para Sul (tomaram a capital, Sanaa, em Setembro) e Leste, concentra-se no Norte, junto à longa fronteira entre o Iémen e a Arábia Saudita.

No dia em que Riad fez saber que admite negociações com todas as partes em conflito promovidas pelo Conselho de Cooperação do Golfo (dos membros do clube dos países petrolíferos da região só Omã recusou juntar-se à campanha militar iemenita), Yaseen disse ainda que desde quinta-feira, quando começaram os bombardeamentos, não houve contactos entre o Governo e os huthis – uma comunidade de confissão zaidita (ramo do islão xiita) que os países árabes sunitas acusam o Irão xiita de instrumentalizar para fortalecer a sua posição regional, a juntar à influência que tem no Iraque, Líbano e Síria, onde apoia o regime de Bashar al-Assad.

Para além dos mortos em Mazraq, houve vítimas civis e militares em bombardeamentos nos arredores de Sanaa, em Taiz (terceira cidade, situada na estrada que liga Sanaa a Áden) e nos subúrbios de Áden. Houve ainda raides contra radares e defesas antiaéreas perto de Marib, 140 quilómetros a leste da capital, em Hudeidha, no Mar Vermelho, e várias posições militares em Mokha, como Hudeidha na costa ocidental mas mais a Sul.

Os habitantes de Áden queixam-se dos cortes de electricidade, que duram pelo menos seis horas por dia, e dos medicamentos e alimentos que começam a faltar na cidade. O porto está fechado, assim como a estrada até Taiz, de onde chegam a maioria dos bens básicos. Os hospitais também estão a transbordar, incluindo um de 45 camas gerido pelos Médicos Sem Fronteira que já recebe 150 pessoas.

Tropas terrestres?

Os sauditas – que esta segunda-feira viram o Paquistão confirmar o envio de forças e o Egipto atacar pela primeira vez a partir dos navios de guerra que enviou para o Golfo de Áden – insistem que o objectivo é obrigar os huthis a renderem-se e devolver o poder a Hadi. Para já, Riad diz que não está a considerar uma invasão terrestre do país na ponta Sul da Península Arábica, mas tem 150 mil soldados na fronteira e não põe de lado o envio de enviar terrestres.

Muitos analistas defendem que os bombardeamentos não vão chegar para mudar de forma significativa o equilíbrio de poderes e obrigar os huthis a negociar. Mas outros lembram que ninguém (sauditas e egípcios já o fizeram) guarda boas memórias de combates no Iémen, um país de tribos, deserto e desfiladeiros. Para além disso, uma invasão poderia conduzir a uma escalada por parte do Irão, que desmente apoiar a milícia xiita. Isto num país com uma posição estratégica fundamental para o comércio marítimo, nomeadamente o do petróleo.

Do que ninguém duvida é que dificilmente este conflito será positivo para os iemenitas. O mais pobre dos países árabes nunca foi estável, com uma força separatista a Sul (que agora apoia Hadi contra o inimigo comum que vem do Norte) e a revolta dos huthis (actualmente apoiados pelo ex-ditador, Abdullah Saleh, obrigado a deixar o poder em 2012, num acordo negociado por Riad), que sempre se queixaram de marginalização económica e social. Quem tem mais probabilidades de beneficiar com o aumento da instabilidade é a Al-Qaeda na Península Arábica, que controla várias zonas no Leste.

Para além do Paquistão, outro Estado não árabe de maioria muçulmana sunita já tinha dito apoiar a acção saudita, a Turquia. O Presidente, Recep Tayyip Erdogan, ainda tenciona fazer a viagem que tem marcada para dia 7 de Abril a Teerão, mesmo depois de ter acusado os iranianos de interferirem no Iémen “para dominar a região”. Ancara e Teerão têm posições opostas na Síria, onde os turcos defendem desde 2011 a queda de Assad, mas continuaram a dialogar. A diplomacia iraniana exige agora “clarificações” de Erdogan.
 

   

Sugerir correcção
Ler 23 comentários