Ataque americano no Iémen mata “o príncipe herdeiro” da Al-Qaeda
Nasser al-Wuhayshi, antigo secretário de Bin Laden, era visto como o segundo mais importante líder da rede terrorista global. Foi ele quem apareceu no vídeo de reivindicação do ataque contra o Charlie Hebdo.
Nasser al-Wuhayshi era visto como o “número dois” da Al-Qaeda global (acima dele só está Ayman al-Zawahiri), além de ser o líder da organização do Iémen. Foi a Al-Qaeda no Iémen e Península Arábica quem reivindicou ataques como o contra o semanário satírico francês Charlie Hebdo, no início deste ano em Paris, que deixou 12 mortos, incluindo os principais cartoonistas do jornal e dois polícias. No vídeo de reivindicação aparecia o próprio Wuhayshi.
O grupo é ainda responsável por vários atentados no Iémen contra ministérios e militares, que mataram centenas de pessoas. Segundo os EUA, tem dedicado especial tempo e atenção a aperfeiçoar modos de fazer entrar em aviões explosivos escondidos de modo a que não sejam detectados pelos sistemas de segurança.
O analista de grupos islamistas da BBC Murad Batal al-Shishani comenta que Wuhayshi era uma figura importante entre os jihadistas globais – “respeitado até pelos apoiantes do rival Estado Islâmico”.
Wuhayshi, que foi muito próximo de Bin Laden, é o sexto comandante da Al-Qaeda a morrer num ataque americano este ano. Os EUA não confirmaram nem negaram o envolvimento na morte do homem por quem ofereciam dez milhões de dólares; os media especulam que terá sido um ataque da CIA e não do exército. A Al-Qaeda não deu detalhes sobre onde e quando morreu Wuhayshi.
Alguns habitantes da cidade de Mukalla, no Sul do Iémen, relataram um possível ataque de drone (avião não tripulado), e uma acção pouco habitual — logo após a queda do explosivo que matou três pessoas, homens armados da Al-Qaeda fizeram um cordão à volta do local impedindo que mais pessoas chegassem aos três cadáveres.
Não querendo mostrar fragilidade, a Al-Qaeda deu notícia da morte indicando logo o nome do sucessor, Qasim al-Raymi. Especialistas dizem que os dois líderes eram próximos e trabalhavam bem em conjunto. “Ataques de decapitação da liderança não derrotaram ainda nenhum dos grupos ligados à Al-Qaeda. Não é este que vai derrotar a Al-Qaeda no Iémen”, comentou ao site noticioso americano Daily Beast Bruce Riedel, analista do centro de estudos Brookings Institution e antigo agente da CIA. “Mas se for verdade, esta é uma boa notícia.”
Wuhayshi era um veterano da Al-Qaeda, sublinhou Gregory Johnson, autor do livro The Last Refuge: Yemen, al-Qaeda, and America's War in Arabia, à agência Reuters. Nascido no Sul do Iémen, Wuhayshi foi para o Afeganistão a primeira vez em 1998 para se juntar à Al-Qaeda, onde conheceu Bin Laden e se tornou um dos seus principais ajudantes até 2001, quando a invasão americana após os atentados de 11 de Setembro levou à dispersão do grupo.
No Irão, foi preso e extraditado para o Iémen, onde ficou detido e se tornou um líder religioso. Com um grupo de outros presos, escavaram um túnel disfarçando o barulho a recitar passagens do Corão, conta Gregory Johnson no livro. Em 2006, conseguiram fugir e esse grupo de cerca de 20 pessoas formou o núcleo duro da Al-Qaeda no Iémen.
Wuhayshi terá sido um dos primeiros altos responsáveis da Al-Qaeda a apoiar o actual líder, Ayman al-Zawahiri, após a morte de Bin Laden. Quando Bin Laden morreu, foi Wuhayshi quem lançou o aviso ao Ocidente e aos Estados Unidos: “o que vier a seguir será maior e pior, e o que vos espera será mais intenso e penoso”. Era tido como “o príncipe herdeiro”, aquele que provavelmente sucederia a Zawahiri como número um da organização quando este morresse.
Mensagens interceptadas entre os dois em 2013 terão sido um dos elementos a provocar um alerta que na altura levou ao encerramento de várias embaixadas norte-americanas no Médio Oriente e em África.
Os EUA dizem que Wuhayshi era “responsável pela aprovação de alvos, recrutamento de novos membros, distribuição de recursos para planos de treino e ataque, e de encarregar outros de realizar ataques”. A organização de segurança internacional Stratfor avalia que, como líder, Wahayshi criou “uma organização militante unificada e coesa que conseguiu conquistar e controlar grandes áreas”.
O Iémen tem sido um terreno aproveitado pela Al-Qaeda pela situação caótica do país após os protestos da chamada Primavera Árabe, com um fraco governo central. A ofensiva liderada pela Arábia Saudita contra os rebeldes huthis teve como principal consequência fortalecer a Al-Qaeda, que se tem aliado com líderes tribais. Em várias zonas do país, os seus membros andam armados, livremente, pelas ruas.