Alemanha mobiliza-se contra manifestações anti-islão: “Bem-vindos refugiados”
Catedral de Colónia, Porta de Brandeburgo e fábrica da Volkswagen apagaram as luzes em sinal de protesto contra movimento anti-islão, que continua a crescer em Dresden.
O cenário vai-se repetindo por várias cidades alemãs – muita mobilização contra o movimento Pegida (acrónimo de Europeus Patriotas contra a Islamização do Ocidente) impedindo mais pequenas manifestações dos islamófobos. No Twitter, alemães orgulhosos põem imagens das contra-manifestações dizendo: “Aqui, o Pegida não passou.”
O diário de grande circulação Bild juntou-se às vozes críticas do movimento, publicando um apelo “Não ao Pegida”, com testemunhos de 50 políticos e celebridades, com cobertura a movimentos contra (“O povo está a parar o Pegida” era um dos títulos), um editorial elogioso (“Estão a dizer não à xenofobia e sim à diversidade e tolerância. Não devíamos entregar as nossas ruas a gritos vazios”) e um link para assinar uma petição contra o Pegida na edição online.
Enquanto isso, em Dresden, a cidade-berço do Pegida, as manifestações anti-islão continuam a crescer – nesta segunda-feira com um número recorde de 18 mil participantes.
O movimento Pegida nasceu em Outubro na capital do estado da Saxónia, que pertenceu à antiga RDA, com manifestações semanais à segunda-feira (como tinham sido à segunda-feira as manifestações pela democracia na Alemanha de Leste).
“A Alemanha para os alemães”
Os líderes do Pegida denunciam o que dizem ser uma “islamização” da sociedade, com falta de direitos para as mulheres ou a existência de sistemas alternativos de justiça como a sharia. Dizem ainda defender a manutenção da “cultura judaico-cristã”. Nas manifestações vêem-se cartazes dizendo “A Alemanha para os alemães”.
A cidade de Dresden tem apenas cerca de 2% de imigrantes, e o número de muçulmanos residentes é de apenas 0,1% da população. Os apoiantes do Pegida contestam estes números, dizendo que os media e os políticos mentem em relação à verdadeira extensão da imigração e presença de muçulmanos.
Em Dresden, marcando a diferença, a contra-manifestação foi diminuta, mas a fábrica da Volkswagen apagou as luzes para mostrar que a empresa “apoia uma sociedade aberta, livre e democrática”.
Também em Berlim, as luzes da Porta de Brandeburgo e da torre de televisão foram apagadas para os populistas não tirarem fotos emblemáticas nos locais, e, como em Colónia, a disparidade de números de manifestantes do Pegida e contra-manifestantes foi suficiente para parar a acção anti-islão: os 300 activistas do Pegida desmobilizaram antes dos cinco mil da contra-manifestação de Berlim.
Hamburgo, Estugarda, Munique e Münster foram outras cidades com grandes marchas anti-Pegida, com um total de cerca de 22 mil pessoas, segundo a agência de notícias alemã DPA. No antigo Leste, em Rostock, os opositores ao Pegida, com o slogan “Bem-vindos ao Ocidente! Rostock para todos”, foram também mais numerosos.
Associação a neonazis
Na sua mensagem de Ano Novo, a chanceler Angela Merkel disse que os apointes do Pegida têm “ódio nos seus corações”. Outros políticos têm associado os activistas anti-islão a neonazis.
Durante o fim-de-semana surgiram provas ligando um grupo de participantes na manifestação do Pegida a um ataque imediatamente a seguir ao fim do protesto de 22 de Dezembro em Dresden no centro comercial da cidade em que um grupo de cerca de 30 jovens migrantes foram atacados por umas 50 pessoas armadas e com máscaras.
Os organizadores do movimento, fundado por Lutz Bachman, dono de uma agência de fotografia e relações públicas que raras vezes deu entrevistas, negam esta associação a neonazis e não permitem símbolos destes nas suas manifestações. Estas têm tido a presença de extremistas identificados pelos serviços de segurança da Alemanha, diz a imprensa, mas também de reformados e jovens, tornando-o um movimento que não é só de franjas extremistas, alertam comentadores.
O movimento tem-se centrado ultimamente no ataque à política de asilo liberal da Alemanha, que é o país europeu que mais pedidos de asilo recebe – em 2014 estima-se que tenham sido 200 mil, muito mais do que os 127 mil de 2013 –, embora surja em oitavo lugar quando se tem em conta o número de pedidos em relação à população (aí é a Suécia o destacado número um). Os apoiantes do Pegida dizem apoiar quem pede asilo, mas defendem que quem seja recusado seja imediatamente deportado, assim como quem tenha registo criminal.
Consequências políticas
Os partidos políticos têm reagido condenando o Pegida. Apenas a Alternativa para a Alemanha (AfD), partido populista que defende o fim das políticas de resgate, parece estar a considerar mostrar-se como a voz política das preocupações do Pegida. Mas o partido está dividido.
Mais preocupante para alguns é a posição da CSU, União Social-Cristã, partido gémeo da CDU de Angela Merkel, que num encontro nesta semana planeia debater “uma política de asilo justa e equilibrada”.
Há quem diga que o Pegida surge de uma falta de discussão sobre algumas questões. Gerd Landsberg, da Aasociação de cidades e municípios, disse à emissora alemã Deutsche Welle que as autoridades não explicam porque é que estão a chegar os refugiados, e que os presidentes de câmara muitas vezes são notificados da chegada dos refugiados demasiado perto da data e não conseguem explicar aos seus eleitores a razão da chegada. “Se for claro que estes refugiados escaparam por pouco à morte, ninguém terá objecções.”