Alemanha assinala 80 anos da chegada de Hitler ao poder
Exposições sublinham o percurso do homem que foi eleito com cerca de um terço dos votos, conseguiu ser chanceler e concentrar um enorme poder.
O dia arrancou com um discurso da chanceler alemã, Angela Merkel, que inaugurou uma exposição sobre o percurso de Hitler e do seu partido, de como eleito com cerca de um terço dos votos em 1932 conseguiu ser nomeado chanceler a 30 de Janeiro de 1933 e como depois acabou por concentrar um enorme poder.
"Este deve ser um aviso permanente para nós, alemães", disse Merkel, que falou exactamente à mesma hora que foi feito, há 80 anos, o discurso do frágil e doente Presidente Paul von Hindenburg dando posse ao chanceler Hitler. "Os direitos humanos não se impõem por si só. A liberdade não aparece sozinha e a democracia não se consegue sozinha", disse Merkel, nascida já após a Segunda Guerra Mundial.
Merkel discursou no memorial “topografia do terror”, nas ruínas da sede da polícia política, a Gestapo, da tropa de elite dos nazis, as SS, e do gabinete de segurança do Reich – todos essenciais para o poderio e controlo nazi. É dos poucos memoriais que estão no local exacto das antigas instalações de organismos do poder nazi.
A ideia de assinalar este aniversário, com exposições especiais em vários museus e ao ar livre pela cidade, será reflectir sobre como Hitler chegou ao poder e como os alemães ajudaram à sua ascensão.
Erosão das instituções democráticas
A exposição Berlim 1933 – O Caminho para a Ditadura, no Museu da Topografia do Terror, pretende, disse o director do espaço à agência francesa AFP, Andreas Nachama, mostrar “a erosão quotidiana de instituições democráticas” nos primeiros meses do domínio nazi, acabando na catástrofe do Holocausto e da II Guerra, com entre 40 e 60 milhões de mortos na Europa, entre eles seis milhões de judeus assassinados na Shoah. O Bundestag terá uma sessão especial lembrando as vítimas.
No Museu de História Alemã, com a exposição Diversidade Destruída, Berlim 1933-1938, o foco será na mudança da vida de uma cidade cheia de vitalidade e diversidade, com a perseguição aos judeus e outros grupos sob o domínio nazi, terminando com o ano da Kristallnacht, quando foram destruídas e incendiadas lojas de judeus e sinagogas.
Na Porta de Brandemburgo, uma exposição ao ar livre lembrará a parada de tropas especiais e das SS que saíram dali para desfilar na grande avenida de Unter den Linden na noite da nomeação de Hitler.
Pela cidade, haverá ainda retratos gigantes e histórias de vida de cerca de 200 alemães que foram perseguidos pelos nazis, e haverá um percurso temático para quem queira percorrer a Berlim do III Reich – os utilizadores de smartphones poderão fazê-lo através de uma aplicação no telemóvel.
Berlim tem grandes monumentos à vítimas dos nazis no coração da cidade, como o Memorial do Holocausto, ou pequenos apontamentos, como pedras douradas na calçada com os dados de judeus mortos na Shoah perto das suas antigas casas.
Comercialização de Hitler
A figura de Hitler continua presente na Alemanha. Um blogue recente tem o nome Raras vezes Houve tanto Hitler e documenta as aparições do Führer sobretudo na cultura popular, uma exposição sobre Hitler e os alemães foi um sucesso em 2010/2011, e no top dos best-sellers actuais está um livro chamado Er Ist Wieder Da ("Ele Está de Volta") imaginando de modo satírico que Hitler regressa a Berlim sem fazer ideia do que se passou nos últimos 66 anos. Já se pode filmar Hitler em 2004 (em A Queda), mas ainda não se pode publicar o seu manifesto Mein Kampf (um editor inglês tentou recentemente e desistiu, o livro será publicado dentro de dois anos quando os direitos de autor ficam em domínio público).
Já se pode fazer humor com a figura do ditador e ser popular, como mostra o livro sobre o regresso de Hitler. Mas a questão será sempre polémica, e seja a publicação do Mein Kampf, de livros sobre Hitler (que são best-sellers e não só na Alemanha), ou o uso de Hitler em anúncios, há quem questione os motivos. A revista alemã Stern denunciava que existe “uma máquina de comercialização de Hitler que quebra todos os tabus para fazer dinheiro”. E o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung considerava que é preciso mais investigação séria sobre o nazismo e menos folclore de Hitler.