Seis tiros mataram o líder da extrema-direita holandesa
O líder da extrema-direita holandesa, Pim Fortuyn, foi assassinado a tiro ontem à tarde, quando saía de uma estação de rádio na cidade de Hilversum, onde acabara de dar um entrevista. O nome do assassino ainda não é conhecido. Sabe-se apenas que agiu sozinho e disparou seis balas contra a cabeça e o peito de Fortuyn, deixando a Holanda em estado de choque e a vida política holandesa numa total incerteza, quando falta pouco mais de uma semana para a realização de eleições gerais. A polícia holandesa anunciou, ao princípio da noite, que tinha prendido o presumível autor do atentado, mas limitou-se a dizer que se trata de um cidadão branco de nacionalidade holandesa. Pim Fortuyn - o líder da Liga de Pim Fortuyn (LPF), cujo único rosto conhecido era o seu - foi morto quando faltam nove dias para eleições gerais e quando a maioria das sondagens lhe previam 15 por cento das intenções de voto, fazendo do seu partido, provavelmente, o terceiro mais votado, logo atrás dos sociais-democratas do ainda primeiro-ministro Wim Kok e dos democratas-cristãos, actualmente na oposição.Wim Kok confirmou a morte de Pim Fortuyn, de 54 anos, ao fim da tarde de ontem: "É um momento trágico para todos nós. É uma tragédia para a nossa democracia. As nossas diferenças políticas não se resolvem com balas mas com palavras." Ad Melkert, o seu sucessor à frente do Partido Trabalhista (Kok não se recandidata), limitou-se a dizer : "A Holanda perdeu a inocência." A campanha eleitoral foi imediatamente suspensa.Ontem à noite, em Haia, especulava-se sobre um eventual adiamento das eleições, previstas para o dia 15 de Maio. O Governo estava reunido de emergência para analisar as consequências do primeiro assassínio político da história da democracia holandesa. O país "está cheio" Assumidamente homossexual, defensor dos costumes liberais holandeses e, ao mesmo tempo, do encerramento das fronteiras do país a mais imigrantes, Fortuyn fazia do islamismo o seu maior inimigo e do "choque de civilizações" o seu credo político fundamental. Tinha irrompido na vida política holandesa com enorme fragor há apenas dois meses, quando arrecadou 34 por cento dos votos nas eleições municipais de Roterdão, a segunda cidade holandesa onde quase metade da população é estrangeira. O seu carisma e as suas excentricidades faziam dele uma figura particularmente polémica. Não há qualquer explicação plausível para o seu assassínio, embora amigos tenham dito que Fortuyn havia recebido várias ameaças de morte nos últimos tempos. "A Holanda está cheia" era a sua bandeira política, mas não admitia ser comparado a Le Pen, que considerava um "pequeno-burguês nacionalista." Ontem à noite, em Haia, bem em frente ao gabinete do primeiro-ministro, algumas centenas de pessoas, na maioria jovens, manifestavam-se ruidosamente, responsabilizando o "sistema político" que Kok representa pelo assassínio de Fortuyn. "Kok assassino" foi, segundo a Reuters, o grito mais ouvido entre os manifestantes. Simpatizantes de Fortuyn partiram vidros e destruíram algumas esplanadas no Centro da cidade, provocando alguns confrontos com a polícia, enquanto gritavam "A culpa é dos 'media'".Em Roterdão, uma outra manifestação de pesar, com flores e velas acesas, mantinha-se junto à residência do líder da extrema-direita assassinado. O impacte da sua morte nos resultados das urnas é ainda uma tremenda incógnita. Europa chocadaAinda mal refeita do choque provocado pelas eleições presidenciais em França, a Europa vê-se agora confrontada com outro episódio trágico envolvendo um líder de extrema-direita, que pode ter consequências políticas imprevisíveis num dos países fundadores da União, uma das suas mais pacíficas e tranquilas democracias e uma das suas sociedades mais prósperas. As primeiras reacções à morte de Fortuyn reflectem este estado de espírito. Para o chefe da diplomacia belga, Louis Michel, "a morte de um homem em circunstâncias tão dramáticas é inaceitável. Nada justificará nunca a violência numa democracia". Michel exortou os seus vizinhos holandeses a terem em conta "os riscos que uma reacção inapropriada ou sem o necessário sangue-frio faria correr à sua grande e forte democracia". Ainda em Bruxelas, Filip Dewinter, líder do partido xenófobo belga Vlaams Blok, apressou-se a ligar o atentado contra Fortuyn aos resultados obtidos por Le Pen em França e a responsabilizar os "media" pelo clima de histeria criado à volta da extrema-direita: "Não estou surpreendido. Conheço o clima político na Holanda. Apenas há ano e meio, quase me aconteceu o mesmo a mim."O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, condenou o atentado e cancelou a sua participação num comício do Partido Trabalhista holandês, prevista para hoje. "Sejam quais forem os sentimentos suscitados por certas figuras políticas, as urnas de voto são o único lugar onde devem ser expressos", disse. O porta-voz do Partido Conservador austríaco (OeVP), que lidera a coligação governamental de Viena e tem como parceiro o partido de extrema-direita (FPOe), de Joerg Haider, comentou: "Se as pessoas começam a matar todos aqueles de que não gostam no plano político, então vamos direitos a uma espiral de violência."