Jogos de vídeo voltam ao banco dos réus após o massacre na Escola Primária de Sandy Hook

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O responsável pelo massacre de Sandy Hook seria um jogador compulsivo de Call of Duty DR

Senador norte-americano apresenta proposta de lei para estudar a relação entre os jogos violentos e os tiroteios indiscriminados

Em 1999 chamava-se Doom; em 2012 chama-se Call of Duty. Os nomes mudam, mas o debate mantém-se: que influência têm os jogos nos tiroteios indiscriminados como os de Columbine e Sandy Hook?

Para o senador norte-americano Jay Rockefeller, do Partido Democrata, continua a ter muita. Pelo menos a suficiente para ter apresentado uma proposta de lei ao Congresso com o objectivo de investigar a possível relação entre os jogos de vídeo violentos e a morte de 20 crianças e sete adultos na sexta-feira passada, na localidade de Newtown.

Pouco depois do massacre na Escola Secundária de Columbine, que resultou na morte de 13 alunos, descobriu-se que os dois atiradores, Eric Harris e Dylan Klebold, passavam horas a jogar Doom e Quake, dois jogos muito populares na década de 1990; agora, dias depois do massacre em Sandy Hook, a informação de que o atirador, Adam Lanza, seria um jogador compulsivo de Call of Duty voltou a fazer soar os alarmes.

"Decisões recentes dos tribunais demonstram que algumas pessoas ainda não perceberam o que está em causa. Elas acreditam que os jogos de vídeo não são mais perigosos para as mentes jovens do que a literatura clássica ou os desenhos animados das manhãs de sábado. Pais, pediatras e psicólogos sabem que isso não é verdade", lê-se no site do senador Jay Rockefeller.

Embora não o escreva claramente, o senador - o único político no activo da família Rockefeller eleito pelo Partido Democrata, uma família tradicionalmente ligada ao Partido Republicano - refere-se à decisão de Junho de 2011 do Supremo Tribunal norte-americano, que elevou os jogos de vídeo ao estatuto de arte, num processo judicial que começou com a intenção do estado da Califórnia de proibir a venda de jogos de vídeo considerados violentos.

Na histórica decisão, o juiz Antonin Scalia argumentou que estes produtos "comunicam ideias", tal como "os livros, as peças de teatro e os filmes que os precederam". Para o Supremo Tribunal, a função dos jogos de vídeo na sociedade "garante-lhes a protecção da Primeira Emenda" da Constituição norte-americana, sobre a liberdade de expressão.

Em suma, os jogos de vídeo chegaram à idade adulta em 2011, com dores de crescimento partilhadas por outros meios que também foram, em tempos, culpados por muitos dos males da sociedade. Como recordou na altura o crítico Seth Schiesel, do The New York Times, "em 1915, o Supremo Tribunal decidiu que os estados podiam censurar os filmes porque o cinema podia ser "usado para o mal". Foi preciso chegar a 1952 para o tribunal conceder aos filmes um reconhecimento constitucional".

Um dos documentos que ajudaram a suportar a decisão do Supremo dos EUA foi um estudo académico publicado em 2008 por investigadores das universidades do Texas A&M International e do Wisconsin-Whitewater.

Para os autores do estudo, intitulado Jogos de Vídeo Violentos e Agressividade: Relação Causal ou Suproduto da Violência Familiar e da Motivação Intrínseca para a Violência?, os resultados indicam que "os traços de agressividade, a violência familiar e o género são indicadores de criminalidade violenta, mas a exposição a jogos violentos não é". Os investigadores concluem o resumo do estudo com a convicção de que os resultados "questionam a crença comum de que a exposição a jogos de vídeo violentos é causadora de actos violentos".

Ouvido pela Reuters no início do julgamento de Anders Breivik - também ele confesso admirador de jogos de vídeo -, um dos jovens que conseguiram escapar ao massacre na ilha de Utoya, Tore Sinding Bekkedal, considerou "desconcertante" a ideia de que os jogos de vídeo podem ter contribuído para os actos do norueguês: "Eu joguei exactamente os mesmos jogos violentos e não ando por aí a matar crianças. Metade da população de Utoya já jogou os mesmos jogos. É uma parte estabelecida da nossa cultura."

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