São Tomé, o país adiado, escolhe o sucessor de Fradique de Menezes

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O país depende quase na totalidade da ajuda financeira internacional Daniel Rocha

Dez candidatos ao Palácio Cor-de-Rosa. Eleitores devem ser chamados a uma segunda volta. Instabilidade do país é o grande problema

Honório tem um desejo: que o dia de hoje marque uma viragem e a instabilidade, imagem de marca e travão ao desenvolvimento do país, fique para trás. "O povo já não pode aguentar. Já chega. São Tomé e Príncipe vai encontrar o seu caminho. Acredito na boa-fé dos dirigentes para que haja harmonia entre Presidente da República, Governo e as diferentes instituições", afirma.

O que hoje está a votos é a escolha do Presidente, a eleger entre dez candidatos à sucessão de Fradique de Menezes, que conclui o segundo mandato no Palácio Cor-de-Rosa e não se pode recandidatar. O mais importante seria, porém, que as eleições trouxessem uma estabilidade que o país nunca conheceu em democracia.

A ausência de um favorito claro torna provável uma segunda volta, dentro de três semanas. Mas isso será o que menos incomoda a maioria dos habitantes: o que mais lhes pesa é a pobreza, que afecta 54 por cento dos 190 mil habitantes, segundo o Banco Africano de Desenvolvimento. A corrupção e a instabilidade crónica são outros traços da realidade são-tomense.

O desfile de primeiros-ministros tem sido vertiginoso. Só na década de Fradique como Presidente sucederam-se nove executivos e duas tentativas de golpe de Estado. Um historial que não cauciona o optimismo de Honório Lavres de Oliveira, de 40 anos, há 14 em Portugal, mas com uma proximidade ao arquipélago que lhe é dada pelas duas viagens anuais ao arquipélago e pelos laços que mantém.

Os cerca de 93 mil eleitores recenseados - 3515 em Portugal, número baixo face aos mais de 27 mil residentes - vão escolher entre quatro candidatos da área do MLSTP-PSD (Movimento para a Libertação de São Tomé e Príncipe-Partido Social Democrata), um do partido do Governo, a ADI (Acção Democrática Independente), e diversos independentes.

Manuel Pinto da Costa, um dos fundadores do MLSTP, Presidente da República entre 1975 e 1991, quando o país seguiu uma orientação pró-soviética, que se apresenta como independente, é um dos nomes fortes da corrida. Aurélio Martins, candidato oficial, a antiga primeira-ministra Maria das Neves e a ex-ministra da Defesa Elsa Pinto, que concorrem ambas como independentes, confirmam a falta de unanimidade no seio do antigo partido único.

Evaristo Carvalho, duas vezes primeiro-ministro e actualmente Presidente da Assembleia Nacional, é o candidato da ADI, que governa com maioria relativa, sob a liderança do primeiro-ministro, Patrice Trovoada, filho de Miguel Trovoada, eterno rival de Pinto da Costa. Uma eleição deste último é vista como uma ameaça por Patrice. Delfim Lima, vice-presidente do Partido da Convergência Democrática (PCD), Filinto Costa Alegre, Hélder Barros, Jorge Coelho e Manuel de Deus Lima são os outros candidatos.

A existência de um tão elevado número de candidatos revela, para Paulo Gorjão, director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança, "a consciência do papel que o Presidente da República vai ter nos próximos anos", num contexto de instabilidade. Honório Oliveira vê na multiplicação de concorrentes um sinal de vitalidade democrática, mas alerta para uma ideia que considera enraizada na população e que deve ser tida em conta pela classe política no seu conjunto: a de que "alguém que integre um Governo é visto como corrupto".

Um dos principais desafios que o futuro chefe de Estado tem pela frente é precisamente normalizar as relações entre instituições - uma equação complexa quando se olha para o passado recente e para o equilíbrio de forças actualmente existente na Assembleia Nacional, onde os opositores são mais do que os partidários do Governo.

Nas legislativas de Agosto do ano passado, a ADI mais do que duplicou a sua representação e elegeu 26 deputados, mas o apoio do único representante do MDFM-PL (Movimento Democrático Força de Mudança-Partido Liberal) não lhe garante a maioria absoluta. Os partidos que se lhe opõem somam 28 lugares: 21 do MLSTP/PSD, sete do PCD.

Petróleo ainda é miragem

"Parece-me que são umas eleições decisivas. A estabilidade é fundamental para o desenvolvimento e para a inversão do ciclo de pobreza. Mas pode continuar a história de instabilidade", considera Paulo Gorjão. "Se for eleito um Presidente da área do MLSTP, vai haver muita pressão para criar obstáculos ao primeiro-ministro, que também não é propriamente um conciliador", disse ao PÚBLICO. "As perspectivas económicas no curto prazo dependem da estabilidade do novo Governo e do sucesso das eleições presidenciais", considerava já o Banco Africano para o Desenvolvimento nas suas projecções para este ano.

Quebras na produção e no preço do cacau acentuaram as dificuldades de São Tomé e Príncipe, que vive em crise financeira quase permanente e cujo orçamento depende em 80 por cento da ajuda financeira internacional. A prospecção de petróleo iniciou-se em 2003, em associação com a Nigéria, mas o processo tem-se arrastado e os frutos tardam. Fontes económicas e diplomáticas citadas pela AFP indicam que os primeiros barris poderão começar a ser produzidos em 2014.

Honório Lavres de Oliveira, que em Portugal trabalha na integração de imigrantes, além de representar a comunidade são-tomense no ACIDI (Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural), julga interpretar o sentimento geral com que os são-tomenses encaram o dia de hoje: que as eleições "sejam um ponto de partida" para algo diferente, que deixe para trás o "adiamento sistemático" do país.

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