Eles vão tentar provar que é possível reabilitar casas a custo zero

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José Paixão (segundo a contar da esquerda) coordena a equipa internacional de jovens estudantes Adriano Miranda

Dois portugueses, uma norueguesa, um italiano e um sérvio, todos estudantes de Arquitectura. Estão juntos desde segunda-feira no Porto com uma missão: começar a inédita tarefa de reabilitar a custo zero edifícios do centro histórico.

Candidataram-se e foram seleccionados para integrarem a primeira equipa operacional do projecto Arrebita! Porto, que arranca oficialmente hoje com a assinatura de um protocolo que envolve vários parceiros, como a Câmara do Porto, a Fundação Calouste Gulbenkian e a Porto Vivo - Sociedade de Reabilitação Urbana, entre outros. A quantidade de parceiros faz parte do ADN de um projecto que vive da "colaboração" entre instituições para conseguir reabilitar sem verbas, diz ao PÚBLICO José Paixão, o arquitecto que coordena o Arrebita! Porto.

E como se reabilita a custo zero? Criando um esquema em que todas as partes envolvidas ganham. Ganham as entidades públicas interessadas em reabilitar o património das cidades; os estudantes de Arquitectura e Engenharia, que podem pôr as mãos na massa e fazer uma espécie de "Erasmus prático"; as escolas de ensino superior, que podem usar as reabilitações como casos de estudo nos seus cursos; e as empresas, que podem envolver-se num projecto de responsabilidade social e deduzir custos de IRC, ao abrigo do mecenato social.

"As empresas podem pagar impostos com material que têm em stock", algo particularmente interessante "nestes tempos em que a liquidez é limitada", aponta José Paixão.

O primeiro edifício a reabilitar é um prédio da Rua da Reboleira (números 42-46). O edifício, propriedade da Câmara do Porto, está "devoluto há muitos anos", conta o arquitecto. "A cobertura estava danificada severamente", o que fez com que "as madeiras, as vigas e os pavimentos se tenham degradado com alguma gravidade". Os trabalhos de reforço estrutural, e todos os outros, serão feitos por estudantes, com o apoio de uma empresa parceira especializada em patologia de edifícios.

Tudo começou como uma ideia de José Paixão, jovem arquitecto do Porto, de Diogo Coutinho, engenheiro civil, e de Angélica Carvalho, então estudante de Arquitectura. No Verão passado, a ideia, então designada Reabilitação a Custo Zero, venceu o primeiro prémio do concurso FAZ - Ideias de Origem Portuguesa, criado pelas fundações Gulbenkian e Talento para distinguir iniciativas de portugueses no estrangeiro, no valor de 50 mil euros.

Concluíram que na raiz do problema da degradação dos cascos velhos das cidades está a dificuldade de pôr o modelo de mercado a funcionar para a reabilitação: esta não é rentável, a não ser que se destine apenas aos clientes mais abastados, defendem os autores do projecto. A situação é agravada pelo facto de muitos proprietários não terem recursos para fazer obras (o projecto destina-se apenas a prédios de senhorios sem recursos).

Qualquer resposta tinha, então, de criar um modelo em que todos ganhassem com a reabilitação, por oposição à situação actual, em que "ninguém" ganha ou "dificilmente" ganha com ela. Eis, então, o Arrebita! Porto.

Próxima paragem: Lituânia

Licenciado em Arquitectura pela Universidade de Nottingham, em Inglaterra, e com experiência profissional em gabinetes de Londres e Amesterdão, José Paixão estava no estrangeiro há 12 anos. Voltou quando soube que o seu projecto tinha sido premiado no FAZ - Ideias de Origem Portuguesa.

Agora, José só quer desenvolver o projecto na sua cidade de origem, o Porto. "Estou completamente focado, o sucesso do Arrebita! depende de nós. Estou empenhado em fazê-lo crescer. Acredito que o projecto tem o potencial de ser replicado noutras cidades para outros problemas e noutras circunstâncias", vinca.

E os cinco jovens já trabalham nesse sentido. O objectivo é criar uma "rede internacional de 'Arrebitas!'" para que seja "corrente um jovem recém-licenciado em Arquitectura ou Engenharia participar, durante três ou seis meses, num projecto de acção social noutro país".

Depois do Porto, o próximo destino deve ser Vilnius, na Lituânia. O modelo do Arrebita! pode ser adaptado a diferentes problemas. No caso da capital lituana, o que está em causa é a "desactivação de espaços públicos, como praças ou parques. Cria espaços mortos. É um problema social que afecta a vivência da cidade". A equipa do Arrebita! já teve uma reunião na Câmara de Vilnius.

José Paixão sabe que não tem a solução para a tarefa hercúlea que é reabilitar os centros históricos. "Não tenho, nem quero ter, a presunção de ter a solução para o centro do Porto", avisa. Mas, de qualquer forma, não acredita que haja uma única solução. "Não há uma solução para o problema do abandono, há a necessidade de criarmos um ecossistema de soluções".

Conclusão prevista para 2014

Em 2014, depois de reabilitado, o edifício da Rua da Reboleira, o primeiro do Arrebita! Porto, deverá ser arrendado em regime social para habitação nos pisos superiores e para incubação de novas empresas de indústrias criativas. A equipa de cinco estudantes que chegou esta semana ao Porto vai trabalhar nos próximos dois meses e meio na limpeza, no estudo do edifício da Rua da Reboleira (uma artéria estreita do centro histórico portuense) e na concepção da reabilitação deste.

Os jovens vão ficar alojados num apartamento da fundação Porto Social e trabalhar num atelier do Largo Duque da Ribeira, cedido pela Porto Vivo SRU. Ao longo do tempo, haverá workshops e discussões públicas sobre o curso do projecto. "O processo de trabalho será o mais transparente possível", refere José Paixão.

De Junho a Setembro, uma segunda equipa, com arquitectos e engenheiros, vai preparar o caminho para a obra, cujo arranque está agendado ainda para 2012. A reabilitação vai demorar dois anos. A reabilitação do edifício da Rua da Reboleira é um projecto-piloto. Se for bem-sucedido, a equipa do Arrebita! Porto espera que seja o ponto de partida para mais processos de reabilitação a decorrer em simultâneo no centro histórico do Porto.

O PÚBLICO vai acompanhar a evolução do projecto, em vídeo, para mostrar os seus principais desenvolvimentos
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