E se a cor dos sapatos o impedisse de aceder a uma parte de Lisboa?
Numa conferência em que responsáveis de várias cidades europeias discutiram a acessibilidade, representantes de Lisboa defenderam que está em causa um direito universal.
“Vocês não vêem. Nós vemos. Por isso é que temos pressa”, afirmou o arquitecto, paraplégico há mais de três décadas. Com esta intervenção, feita esta sexta-feira num debate sobre acessibilidades e mercado de trabalho, Jorge Falcato procurou fazer ver aos presentes que mais importante do que dizer que a mobilidade inclusiva é um investimento e não um custo é ganhar a consciência de que ela “é um direito”.
“É um direito humano. Toda a gente tem direito à cidade”, afirmou também o vereador dos Direitos Sociais da Câmara de Lisboa, entidade que juntamente com a cidade alemã de Berlim e a rede Eurocities organizou esta conferência de dois dias. Para João Afonso, esta é uma ideia que é preciso “dizer em voz alta e de forma clara”.
Para o autarca dos Cidadãos por Lisboa, é igualmente importante que se assuma o “compromisso político” de promover a acessibilidade e que se seja capaz de “dizer como” é que se vai fazê-lo, até atendendo a que “é impossível fazer tudo ao mesmo tempo”. No caso concreto de Lisboa, João Afonso garantiu aos conferencistas e membros da assistência que o executivo camarário está “totalmente empenhado” nesta causa.
A assistir a esta conferência estava a Provedora dos Cidadãos com Deficiência da Câmara do Porto, que foi a primeira do país a criar este cargo, já lá vão mais de dez anos. Lia Ferreira defendeu a importância de pelo menos as médias e grandes cidades de toda a União Europeia terem figuras como esta.
Em declarações ao PÚBLICO, a secretária-geral da Eurocities, que reúne mais de 130 cidades europeias, confessou que considera “inspirador” o trabalho que Lisboa está a fazer ao nível da mobilidade inclusiva, nomeadamente com o Plano de Acessibilidade Pedonal. Ainda sobre a cidade, Anna Lisa Boni deu conta da sua estranheza com o facto de o município não ter competências na gestão dos transportes públicos. “É como dizer quero mudar a minha casa, mas não sou dono dela. Assim não se faz investimento”, comentou a responsável italiana.
A secretária-geral da Eurocities considera que, de uma forma geral, as cidades estão a fazer o que é preciso para se tornarem mais inclusivas, mas há ainda “muito para fazer” em todas elas. “Mesmo nas mais avançadas. O caminho é longo”, sublinhou Anna Lisa Boni, lembrando que são muitos os domínios em que é preciso intervir.
Na sua opinião, o mais difícil nesta causa não é conseguir-se dinheiro para os investimentos que é necessário realizar, em áreas tão diversas como a habitação, os transportes públicos e o turismo. O factor crucial, defende Anna Lisa Boni, é “mudar as mentalidades”.