E à segunda edição, o Art on Chairs criou uma marca em Paredes

Vinte empresas do concelho de Paredes juntam-se para competir nos maiores e mais exigentes mercados mundiais.

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Fernando Veludo/nfactos
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Com o prémio europeu Regiostars, da Comissão Europeia, na lapela, O Art on Chairs está de volta. Sentou-se em Lisboa, numa exposição de mobiliário urbano, a “Desfrutar o Tejo”, em pleno Cais do Sodré; associou-se ao Museu do Design e da Moda, que inaugurou por estes dias a mostra Como se Pronuncia Design em Português, comissariada por Bárbara Coutinho, e invadiu vários espaços de Paredes, onde abriu, na sexta-feira a Aldeia Agrícola – incubadora para o Design de Mobiliário.

Projecto da Cooperativa agrícola, a aldeia é um conjunto de quatro edifícios na cidade de Paredes pensados para servir os agricultores locais – que vão ter ali um mercado de venda directa e os serviços da própria cooperativa – mas abertos ao principal sector de actividade do concelho. Num dos módulos há dez apartamentos, mobilados com peças de cinco jovens designers produzidas localmente, que servirão para residências de criadores, em contacto com a indústria local.

Outro dos módulos funcionará como incubadora do sector do mobiliário, e acolherá meia dúzia de novas empresas, que trabalharão ao lado da nova marca que resulta da edição deste ano do Art on Chairs. Ali há ainda espaço para um showroom dos produtos desta spin off que, agregando uma vintena de fábricas e 1500 trabalhadores, com uma forte incorporação de design, será a primeira, no país, com capacidade para dar resposta a mercados tão grandes, e exigentes, como o norte-americano, por exemplo.

No futuro, é possível que os clientes desta nova marca que visitem Paredes queiram almoçar ali ao lado, no restaurante que ocupará o quarto módulo. A cooperativa vai concessionar o espaço, e pretende que ele se torne numa casa de referência, que faça uso dos melhores produtos da agricultura portuguesa, explicou o presidente do organismo, José Barbosa Leão. Que quer impor, no fundo, o mesmo padrão de exigência que nos últimos anos tem sido absorvido por uma parte da indústria de mobiliário. E que tem como ponto mais visível o Art on Chairs.

Este ano, o Art on Chairs cresceu com estes novos espaços. A exposição do MUDE tem uma extensão em Paredes, onde 40 peças do que de melhor se fez nas últimas décadas em mobiliário “made in Portugal” convivem com a mostra Experiência de Ser, o resultado do projecto More Design, More Industry, curado por Francisco Providência e Vasco Branco, e que pôs vários designers conhecidos a trabalhar com a indústria local, com o apoio, nas fábricas, de jovens criadores.  Estagiários que, nalguns casos, prolongaram o seu vínculo às empresas.

A 200 metros da Aldeia Agrícola, na Casa da Cultura de Paredes, é possível ver o resultado de mais uma edição da Cadeira Parade, que, inpirado na famosa Cow Parade, pôs alunos das escolas a reinventar este objecto básico, inspirados em conhecidos criadores. Com resultados, nalguns casos, espantosos. E, no rés-do-chão está a nova leva das famosas cadeiras do Duets, iniciativa que pôs designers a desenhar “com, e para” personalidades tão famosas como Lula da Silva, Durão Barroso, os escritores Paulo Coelho e Ah Cheng, o piloto Jensen Button, Chico Buarque, ou Diego Armando Maradona.  

Coube a Pedro Sottomayor conceber a cadeira para El Pibe. O objecto é baixinho, com pernas grossas - seis - a fazer lembrar o argentino mais famoso do mundo. Num tributo à capacidade de “inventar soluções em campo” de Maradona, ela pode ser também colocada em várias posições, para se tornar, se quisermos, num cadeirão ou uma chaise longue. E não lhe falta uma referência visual ao famoso braço esticado que esteve na origem do golo feito com a "mão de Deus", no Campeonato do Mundo de 1986.

Mas o que mais chama a atenção nesta cadeira é o assento que mais parece uma bola de couro antiga, esvaziada para se conformar àquele corpo, com losângulos todos diferentes e cozidos manualmente na fábrica da Fenabel. O designer elogia a persistência com que a empresa trabalhou até se chegar ao resultado final, que implicou um trabalho quase artesanal, de manufactura. “Muito do que aprendi com esta peça pode ser replicado, em termos de processos, noutras concepções”, admite o criador.

“Quando as cadeiras do Duets são apresentadas, algumas pessoas pensam que o grande desafio na sua execução é tecnológico, o que nem sempre é verdade. Porque as empresas aqui têm uma capacitação tecnológica muito grande. Aqui os desafios são dois: produzir uma série limitada, que obriga a encontrar tempo numa linha de produção optimizada para grandes séries; e regressar às origens, à manufactura, como aconteceu em vários modelos”, acrescenta o curador deste projecto, José Bártolo.

A directora do MUDE argumenta que o  design português nunca dependeu muito de materiais já transformados."A excelência deste saber fazer, a que chamo uma inteligência prática, contribuiu muito para a excelência de alguns dos ícones do design português e das artes decorativas”, explica, lembrando que Raul Lino, por exemplo, dizia que não conseguia trabalhar com artesão que não contribuísse para o resultado final da peça.

Bárbara Coutinho alerta que o país não pode perder, desperdiçar, esta mais-valia presente em vários sectores. E espera que o design deixe de depender apenas dos concursos de ideias, exposições ou outro tipo de eventos, que geram protótipos e peças únicas, e que entre definitivamente na produção, com uma visão ética, deontológica, que respeite a autoria e integre, como defende também Francisco Providência, todas as fases do processo industrial, do conceito, ao produto, e à sua comunicação. 

O presidente da Câmara de Paredes acredita que esta forma de estar vai ser bem visível, no mobiliário, dentro de uma década, tal como hoje acontece no sector do calçado, que começou a sua revolução há 25 anos. “Nós estamos a trabalhar há quinze anos, desde os primeiros estudos que diagnosticaram a questão da criatividade, e da gestão da inovação como factores críticos”, explica Celso Ferreira, impulsionador, enquanto autarca, do Art on Chairs.  

Em 2009, o concelho tinha 1268 fábricas. Hoje tem 800 e uma vintena delas vai experimentar uma via que, para Celso Ferreira, tem tudo para resultar e contaminar o restante tecido produtivo. Ao trabalharem juntas sob uma mesma marca, cujo catálogo será promovido em Singapura, Miami, Milão e Paris, elas vão tentar chegar onde, sozinhas, nunca conseguiriam, apesar da sua experiência de exportação para o mercado Europeu.

“Em Portugal não há – e na Europa há poucas – empresas capazes de dar resposta ao maior distribuidor de mobiliário dos Estados Unidos”, nota o autarca.  “Falta escala. Uma das parceiras, a Jocilma, tem 230 trabalhadores e é a maior empresa de móveis de Paredes, a segunda maior de Portugal a seguir à unidade da IKEA. E tem quatro fábricas”, acrescenta Celso Ferreira, que promete, em cada nova edição do Art on Chairs, lançar um spin off que, ano após ano, contribua para a revolução do sector e para a criação de emprego no seu concelho.

 

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