Praias sem areia - uma explicação
Durante os meses de verão, quando a procura das praias aumenta, é frequente ouvir-se por parte dos utentes comentários em torno do facto das praias do Minho apresentarem cada vez menos areia, ou a terem perdido a favor de grande acumulação de seixos, vulgarmente designados por godos ou jogas.A área para barracas, toldos e bares de praia vai sendo reduzida de ano para ano, donde nascem reclamações, lamúrias e previsões sobre a sua reconstituição natural, nos anos que vêm, pelos que têm negócios dependentes do recurso natural que são as praias, o sol e o "ar do mar".Desiludam-se os que pensam que o mar vai trazer a areia que tem faltado nas praias. O processo natural de emagrecimento das praias (perda de areia), pela sua importância, merece que para ele se procure uma explicação.A metodologia que aplicamos nos nossos trabalhos de investigação sobre a dinâmica das mudanças costeiras inclui o conceito de migração das praias para o interior, que passamos a explicar. A própria expressão para o interior esclarece que o avanço das praias se faz no sentido do continente, acompanhado do recuo das arribas, quando existem, do emagrecimento em areias das praias e galgamentos do mar nas zonas frágeis do sistema dunar frontal, que o processo também vai destruindo. Todo este processo se pode comparar a uma doença que não tem cura.É comum aceitar-se a ideia, para explicar a migração das praias, que as barragens são as culpadas da situação, particularmente do seu emagrecimento. Quem assim pensa, não atende a factos da história costeira muito recente, como o já haver migração das praias no século XVIII, como o atestam as notícias dos jornais daquela época sobre as "invasões do mar" nos segmentos costeiros de Espinho e Furadouro.Muitos dos sedimentos das praias resultam da erosão das rochas que afloram nas próprias praias e nas areias que a delimitam. O reconhecimento de que os enchimentos sedimentares das albufeiras do rio Cávado, principalmente constituídos por sedimentos finos (areias limosas e limos) apontam no sentido de um efeito reduzido ou praticamente nulo das albufeiras sobre a perda de areia das praias. Por outro lado, certas praias apresentam acumulações de cascalhos, cujos elementos não são transportados no caudal sólido dos rios.Para uma explicação do emagrecimento das praias temos de nos reportar aos tempos geológicos, de há centenas de milhares de anos (abrangidos em Geologia pela designação de Quaternário), quando sobre as zonas polares existiram grandes massas de gelo e sobre os cumes das montanhas existiram glaciares que se estenderam às altitudes baixas. Assim aconteceu na serra da Estrela e nas serras da Peneda e Gerês. Esse período foi designado por Würm (nome de uma ribeira dos Aples), embora seja preferível designá-lo por última grande glaciação, visto os indicadores do Würm no terreno serem motivo de polémica e discussões.A última grande glaciação tem limites temporais entre 117 000 anos BP (Before present - antes do presente) e 12 000 anos BP. O volume e extensão da massa de gelo era tal que cobriu durante vários milhares de anos a Inglaterra, o Mar do Norte e a Escandinávia; a massa de gelo chegou à latitude de Berlim e Nova York.Facilmente se compreende que a água que constituiu o gelo de tal extensão e de espessura quilométrica nalguns locais, proveio dos oceanos. Como consequência, o nível do mar baixou vários metros (em ordem de grandeza, até à isóbata dos 100 metros, cerca de 40-50 quilómetros ao largo da zona costeira do Minho).O nível do mar não baixou continuamente, de uma só vez, mas por recuos (regressões) e avanços (transgressões), desenvolvendo-se uma larga plataforma continental, hoje totalmente submersa. Durante as fases de emersão (regressão) acumularam-se extensos depósitos de areia e cascalho, a partir da erosão de afloramentos rochosos que teriam constituído arribas hoje submersas. Quando a plataforma continental esteve emersa sobre ela devem ter-se acumulado outros tipos de depósitos por rios e pelo vento. São estes depósitos acumulados durante as regressões que os avanços do mar seguintes levaram na direcção do continente, em cujo limite se acumularam constituindo praias arenosas.As acumulações detríticas sobre a plataforma continental foram, através de milhares de anos, perdendo as areias e, por selecção dimensional, constituíram depósitos ricos em seixos que hoje estão a chegar às praias (exemplos na costa minhota são as praias entre Amorosa e Cepães). Os mecanismos que levaram a que aquelas praias sejam predominantemente constituídas por seixos nem sempre tem uma explicação, porque se desconhece a dinâmica das águas que cobrem a plataforma continental.Tudo aponta para que a plataforma continental não tenha uma cobertura detrítica em condições de volume e de distância à faixa costeira, onde estão as praias, para dela serem extraídas areias para a realimentação das praias que perderam as suas areias. Actualmente, na zona costeira do Minho, a maior parte das praias são rochosas, a que se podem associar cascalhos. Mesmo as praias que ainda são arenosas vão perdendo as areias, como são exemplos as praias de Moledo e de Vila Praia de Âncora.Porque a dinâmica do processo (perda de areia) faz parte da migração das praias, que é natural, teremos de aceitar que a maior parte das praias do Minho perderá a sua areia, transformando-se em praias rochosas com acumulação, sobretudo, de cascalho. A alimentação artificial das praias, se for possível encontrar fontes para extracção de areias nas proximidades das praias, será sempre de custos elevados e a areia introduzida permanecerá apenas temporariamente.Se é isto que se pretende, será preciso procurar os milhões de euros que serão necessários.A própria expressão para o interior esclarece que o avanço das praias se faz no sentido do continente, acompanhado do recuo das arribas, quando existem, do emagrecimento em areias das praias e galgamentos do mar nas zonas frágeis do sistema dunar frontal, que o processo também vai destruindo. Todo este processo se pode comparar a uma doença que não tem cura.