Têxtil antecipa objectivo de exportar 5000 milhões com a ajuda da Espanha e dos EUA
O mercado angolano recuou 40%, mas o sector nacional encontrou em Espanha e nos Estados Unidos condições para crescer mais de 4,5% este ano. A indústria acredita que o objectivo de exportar 5000 milhões em 2020 pode ser cumprido já este ano.
Em 1994, Décio Costa e os seus dois sócios decidiram jogar contra a corrente e trocaram o fabrico de teares pela produção de têxteis para o lar. Desde essa data já distante até hoje, o sector teve de enfrentar a liberalização do mercado mundial e a concorrência asiática que levaram ao encerramento de milhares de fábricas e ao desaparecimento de 120 mil empregos. Mas Décio Costa teve de “se virar”, a Piscatêxtil, de Guimarães, resistiu e pode hoje aproveitar os ventos favoráveis que ameaçam transformar a indústria têxtil e do vestuário na próxima estrela das exportações nacionais. Em 2015, as vendas para o exterior vão aproximar-se dos 4800 milhões de euros e o cenário dourado do Plano Estratégico do sector, que apontava para exportações de 5000 milhões de euros em 2020 deverá ser cumprido já este ano. Se a queda de 40% de vendas para Angola é uma dor de cabeça para os industriais, o crescimento de 11% da Espanha e, principalmente, o disparo de 30% nas exportações para os Estados Unidos estão a gerar um clima de optimismo numa indústria que vale 10% do comércio externo português.
Uma passagem pela Heimtextil, a maior feira mundial de têxteis para o lar que decorre em Frankfurt, na Alemanha, é uma bom prova desse clima. Portugal participa com 75 empresas e, entre estas, 33 foram escolhidas por um júri independente para integrar o espaço “premium”, que destaca a qualidade dos produtos e o nível das apresentações dos stands. O ministro Manuel Caldeira Cabral e o secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos andaram por lá, puderam apalpar os produtos expostos e reconhecer que “o sucesso do sector está baseado na sua qualidade e na sua capacidade de fugir aos produtos baratos”, nas palavras do titular da pasta da Economia.
Na MundoTêxtil, a maior produtora europeia de felpos, puderam avaliar a expectativa que o crescimento do mercado norte-americano está a suscitar, na Lasa souberam das razões que levam um gigante como a Tommy Hilfiger a conceder-lhes licenças de comercialização e na Home Flavours deram conta da satisfação de Cristina Machado, administradora e designer, pelo regresso de um importante cliente inglês que tinham perdido “há seis ou sete anos” - “Eles deram conta que o preço não é tudo”, sublinha Cristina Machado. E numa montra promovida pela Associação Selectiva Moda, puderam verificar a antecipação das tendências para 2016 proposta por 25 marcas, tendo por base um conceito (o Dream Garden) criado pela designer Dolores Gouveia.
O segmento dos têxteis para o lar não é o mais importante da indústria (vale 9% do sector, exporta cerca de 700 milhões de euros e emprega pouco menos de 10 mil pessoas). Mas em 2015 o seu crescimento nos mercados externos foi superior ao dos outros segmentos, chegando aos 7,1% entre Janeiro e Novembro de 2015. Para a Associação dos Têxteis e Vestuário de Portugal (ATP), este desempenho torna-se ainda mais valioso porque é capaz de enunciar a capacidade competitiva da indústria. “A concorrência faz-nos correr mais depressa”, explica Décio Costa.
Numa feira onde estão 2866 expositores de todo o mundo e que é visitada por mais de 60 mil profissionais, a participação nacional ocorre lado a lado com marcas como a Vesace, a Desigual ou a Pierre Cardin, o que deixa entender a melhoria da sua capacidade de concorrer. No perfil desta indústria há empresas pequenas, como a Piscotêxtil, mas há também gigantes como a MoreTextile, que resulta da fusão da Coelima, da Tearfil e da JMA que factura 90 milhões de euros e emprega 1250 pessoas. Ou a Lameirinho, que renasceu das cinzas (em 1999 facturava 100 milhões de euros e era um império que empregava 1600 funcionários num perímetro industrial situado no coração de Pevidém, perto de Guimarães, equivalente a 20 campos de futebol) e se tornou uma referência capaz de exportar produtos com um valor acima dos 57 milhões de euros.
Não admira que quase todos os pavilhões façam, por isso, questão de inscrever nas suas paredes o “Made in Portugal” ou coloquem a bandeira nacional em lugares visíveis. “A imagem da nossa indústria é hoje um valor acrescentado para os clientes”, explica Paulo Vaz, director-geral da ATP. A qualidade dos produtos, a originalidade do design e, questão essencial, a capacidade de responder a encomendas no prazo de duas semanas e de as colocar rapidamente nos mercados consumidores do norte da Europa ou dos Estados Unidos são hoje trunfos que, acredita a ATP, fazem a diferença. Manuel Caldeira Cabral ouviu os empresários apresentar os seus trunfos neste domínio e prometeu-lhes fazer tudo para “apoiar as empresas que exportam”.
Com os mercados tradicionais em recuperação depois do choque da liberalização do comércio mundial de 2000, o futuro passa agora e cada vez mais pelos Estados Unidos. O crescimento de 28% no ano passado neste mercado justifica-se pelo câmbio favorável do euro face ao dólar, mas Paulo Vaz suspeita que haja aqui um efeito de antecipação relacionado com as negociações em torno do TTIP, a parceria de comércio e investimento entre a União Europeia e os Estados Unidos que está a ser negociada e que aponta para uma liberalização das trocas entre os dois blocos. “Hoje exportamos 300 milhões de euros para os Estados Unidos, mas se esse acordo for negociado podemos chegar aos mil milhões”, acredita João Costa, presidente da ATP. O optimismo tem por base a realidade do presente. “A Impetus [que fabrica roupa interior com especiais capacidades térmicas] começou há três ou quatro anos a vender 100 mil euros para lá; este ano vai exportar mais de três milhões e meio”, explica.
O PÚBLICO esteve na Heimtextil a convite da ATP