Sindicatos forçam debate sobre aumento do salário mínimo
Baixa inflação poderá beneficiar os trabalhadores, mesmo que o aumento se fique pelos 500 euros no próximo ano.
Os patrões aceitam debater, mas não será por sua iniciativa que o tema será abordado. Ainda assim António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (que usa a sigla CIP), reconhece que estando os temas previstos na ordem de trabalhos – a reforma do IRS e as políticas de emprego - “praticamente esgotados”, o protagonismo caberá ao SMN. Do lado do Governo, há “abertura para o diálogo” e o primeiro-ministro já disse várias vezes que quer fazer depender a actualização do SMN de indicadores económicos e da produtividade.
Em cima da mesa estão vários números, mas o valor que serviu de referência ao estudo que o Governo apresentou em Maio aos parceiros sociais são os 500 euros, um aumento de 3,1% e que por via da queda dos preços poderá traduzir-se numa recuperação do poder de compra, depois de três anos de perda constante e da estagnação esperada para 2014.
O Governo espera para este ano uma estagnação dos preços, mas ainda não actualizou as suas previsões de inflação para 2015. Se a tendência de descida dos preços se mantiver, o aumento de 15 euros por mês, para os 500 euros, poderá representar uma recuperação da capacidade aquisitiva de perto de 12% dos trabalhadores por conta de outrem.
CIP aceitaria subida ainda este ano
Se para a CIP e para a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) o ponto de partida são os 500 euros, os sindicatos colocam outros números em cima da mesa. João Vieira Lopes, presidente da CCP, lembra que “sempre aceitámos os 500 euros como aumento no primeiro ano para encerrar o acordo” subscrito em 2006”, mas também deixa claro que os aumentos devem entrar em vigor a 1 de Janeiro do ano seguinte ao acordado. Esta confederação representa grande parte dos sectores onde predomina o SMN, nomeadamente a restauração e alojamento, as actividades imobiliárias ou o comércio.
António Saraiva, da CIP, diz que tudo aponta para que o aumento se efective a 1 de Janeiro, mas destaca que há abertura para flexibilizar a data no contexto de um acordo global e desde que sejam cumpridos critérios como a indexação do aumento da SMN à produtividade e se salvaguardem os sectores mais expostos à concorrência. Uma parte significativa das empresas representadas pela CIP já pratica salários próximos de 500 euros, lembra, pelo que o impacto será reduzido.
Do lado dos sindicatos, estes valores são inaceitáveis. A CGTP exige uma subida para os 515 euros com retroactivos a Junho e 540 euros a partir de 1 de Janeiro de 2015. “Se os patrões bloquearem esta discussão, exigiremos ao Governo que cumpra a lei”, disse na semana passada o secretário-geral, Arménio Carlos . A UGT, que já reclamou 500 euros para entrar em vigor a 1 de Julho, quer agora 505 euros com efeitos a 1 de Setembro e o seu líder, Carlos Silva, exige que o tema seja levado à mesa da concertação “o mais depressa possível”.
Da agenda oficial do encontro desta terça-feira, que além de Mota Soares contará com a presença do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, constam as alterações à política de emprego, que têm vindo a ser discutidas há vários meses, e a reforma o IRS, em consulta pública até 20 de Setembro.
Um a um, os parceiros sociais já apresentaram ao Ministério das Finanças as suas propostas quando, em Julho, foram chamados a pronunciar-se em separado sobre o anteprojecto. Só a CGTP se distanciou das propostas, argumentando que elas não representam uma redução dos impostos. Mas entre os vários parceiros houve um apelo comum no sentido da descida da carga fiscal. A ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, voltou no último fim-de-semana a não se comprometer com uma descida dos impostos em 2015. A posição do CDS voltou a agitar o debate, com o vice-primeiro-ministro a defender uma “moderação fiscal”.
Uma proposta concreta que alguns parceiros querem ver melhorada tem a ver com a introdução de um quociente familiar para determinar a taxa do IRS a pagar. Enquanto actualmente o rendimento de um casal é dividido por dois, na proposta da comissão propõe-se que cada filho também seja considerado, sendo-lhe atribuído um peso de 0,3 pontos. A CIP e a UGT defendem que a partir do terceiro filho deveria ser dada uma ponderação maior aos dependentes.
Papel de privados levanta dúvidas
O papel dos privados nas políticas de emprego, um dos temas que hoje vão à concertação social, continua a levantar dúvidas a alguns parceiros sociais, que exigem uma clarificação das funções que poderão vir a desempenhar na colocação e gestão de desempregados.
A Confederação do Comércio e Serviços (CCP) exige que a redacção do artigo que abre a porta à participação das agências privadas no ajustamento do mercado de emprego deixe claro que nesse conceito cabem também as empresas de trabalho temporário. Face à versão anterior, o artigo 14º do diploma que estabelece as bases da política de emprego é agora mais claro, mas o dirigente da CCP João Vieira Lopes diz que ainda não chega.
Luís Correia, secretário-geral adjunto da UGT, exige outro tipo de clarificação e quer que o diploma diga expressamente qual o papel que está reservado aos privados e obrigue a que a sua actividade seja coordenada pelos serviços públicos de emprego. Além disso quer que os parceiros sociais tenham uma participação activa destas mudanças: “Não está claro que os parceiros continuem a acompanhar este projecto”.
O financiamento é outra das preocupações da UGT que hoje será colocada ao Governo. Em 2012, o Governo anunciou que pretendia entregar a privados algumas actividades desenvolvidas pelos centros de emprego, mediante uma contratualização. Já em Janeiro de 2014, o Governo admitia que essa colaboração se cingiria a desempregados não subsidiados e vários que projectos-piloto seriam lançados nas regiões de Lisboa e do Porto durante o primeiro semestre. Essa intenção acabou por não se concretizar.